2. Ruptura e Fuga: O Fim do Inferno

Longe Dali

Houston

Clarice Madison

Hoje seria o dia mais importante da minha vida. Descobri que estou grávida há oito semanas. Enfim, estava prestes a realizar o meu maior desejo: ser mãe. Mas, por causa de um ato monstruoso causado por alguém que, diante de Deus, jurou me amar, esse sonho não acontecerá nunca mais.

Richard e eu nos conhecemos no ginásio. Namoramos por algum tempo, mas nos afastamos durante o período universitário. Ele foi estudar Medicina em Harvard, e eu, Veterinária, em Oxford. Nossos horários nunca coincidiam, e por isso nos afastamos por longos quatro anos. Mas, assim que nos formamos, para minha desgraça, nossos destinos se cruzaram novamente. E, por culpa dele, hoje me encontro nesta cama de hospital, após sofrer um aborto causado por um espancamento feito justamente pelo homem que me jurou amor eterno no altar, diante de Deus e dos nossos familiares.

Eu não sabia que estava grávida; só descobri ao chegar ao hospital, após um dos meus vizinhos chamar a polícia ao ouvir meus gritos de socorro. Se não fosse por isso, hoje eu estaria em um necrotério e não aqui, contando um pouco da minha história.

Sim!

Eu o amei demais. Acredito que esse sempre foi o meu grande problema: amar demais, me doar demais e sempre oferecer o melhor para alguém que nunca mereceu. Nasci e fui criada em uma família religiosa. Meus avós são protestantes, meus pais também, e, consequentemente, eu. Durante toda a minha infância e adolescência, cresci ouvindo que o matrimônio é algo sagrado, que é "melhor viver com ele do que viver pior sem ele". E tudo isso saía justamente da boca daqueles que não tinham moral alguma e que jamais serviram de exemplo para ninguém. Resumindo, sempre fui rodeada por pessoas que pregavam aquilo que nunca faziam. Ou seja, tenho como base uma família de hipócritas.

Mas hoje isso terminou. Enfim, vou desaparecer de Houston e ir para o lugar mais distante que eu conseguir. Todo esse inferno que vivi nesses longos três anos ao lado de Richard ficará para trás, e por fim poderei recomeçar.

Fujo de minhas lembranças ao perceber a porta da enfermaria do hospital público Baylor ser aberta, e, por ela, entrar a doutora que me socorreu.

— Como se sente, Clarice?

— Um pouco melhor. Quando terei alta? — questiono de imediato.

— Amanhã, às 9h. — Sorrio com a notícia, mas imediatamente meu semblante se fecha quando percebo um certo alguém com um sorriso sádico bem atrás da doutora. — Tem alguém querendo te ver — adverte a doutora.

— Não quero ver ninguém, doutora. Apenas quero sair daqui — respondo friamente.

Naquele momento, nenhuma visita me interessaria, nem mesmo a dos meus pais, que nunca me apoiaram e, por medo da falência, praticamente me jogaram nos braços desse demônio.

— Nem mesmo o teu amado marido, Clarice? — Richard fala com sua voz aveludada, que enganava facilmente até o mais perspicaz dos seres humanos.

Ele também me enganou. Deixei-me levar pelas suas palavras bonitas, mas bastou esse maldito anel ser colocado no meu dedo anelar esquerdo para sua máscara cair e toda a sua fachada de bom homem ruir diante de mim.

— Vou deixá-los a sós. Com licença! — A doutora se retira, fechando a porta, e meu olhar de ódio se volta para o monstro bem diante de mim.

— O que faz aqui? Veio confirmar o meu óbito? — pergunto, com a voz carregada de ódio.

— Que barbaridade. — Richard fingiu-se de ofendido, cinicamente estalando a boca. Com os olhos semicerrados, continua com suas ironias: — O que as pessoas diriam se ouvissem algo tão absurdo?

— Você é um covarde e assassino. Saia daqui, ou eu te denuncio! — grito, com a pouca força que ainda me resta.

— Se acalme, meu amor. — Richard tenta tocar meu rosto, mas viro para o lado oposto. — Aconselho que mantenha a calma, querida, senão sua família sofrerá as consequências. Não esqueça que tenho todos em minhas mãos.

Sorrindo, Richard me faz relembrar da maldita promissória da casa dos meus pais, que está em seu poder, e da grande quantia que financiou para evitar que o único bem material da minha família fosse leiloado. Por essa razão, estive presa às mãos desse verme por tanto tempo. Mas tudo isso terá um fim. Hoje será o último dia que ficarei nesta maldita cidade. Irei para bem longe, o mais distante que puder, para enfim ter um pouco de paz e poder recomeçar.

— Nojento. Asqueroso. Como pude me enganar tanto com você? — falo, áspera e profundamente enojada com aquele desconhecido perverso à minha frente.

— Sempre fui um excelente marido, mas você nunca facilitou as coisas, querida. E veja só no que deu: acabou se acidentando e vindo parar nesse hospital público. Uma verdadeira lástima. — A voz carregada de ironia era a marca registrada de Richard, e isso me deixava ainda mais fora de mim.

Por sorte, havia um botão vermelho ao lado esquerdo da cama, e ele foi a minha salvação. Após apertá-lo seguidamente por três vezes, a médica, juntamente com alguns enfermeiros, chegou e colocou aquele demônio que usava Armani para longe de mim.

Com o olhar, supliquei à médica que deixasse aquele monstro bem longe de mim. Assim foi feito. Agora a sós, conto toda a verdade para a doutora e explico que, por culpa daquele homem que acabara de sair daqui, vim parar neste hospital. A doutora se compadece da minha situação e diz que manterá a enfermaria sob constante vigilância até o momento da minha alta. Agradeço, mas, no fundo do meu coração, sabia que, se ficasse mais tempo neste hospital, a chance de voltar para a prisão de luxo em que vivia seria grande. Isso eu não permitiria jamais.

Então, aguardei pacientemente a chegada da madrugada e, com ela, a troca de plantão. Eu tinha apenas trinta minutos para desaparecer por completo. E assim foi. Encontrei uma maneira de fugir, usando um jaleco branco e uma máscara cirúrgica. Consegui chegar até a saída do hospital, mas percebi que estava cheia de seguranças. Entre eles, o motorista que trabalhava para Richard. Por ali, seria impossível sair sem ser reconhecida. Foi então que vi diante de mim a minha salvação: um servente levando as roupas para a lavanderia. Sem pensar, entrei no cesto, cobrindo meu corpo com lençóis.

Pouco tempo depois, senti o carrinho se mover e, enfim, estava livre. Saí daquele cesto e caminhei o mais rápido que pude pela estrada deserta. Não sei por quanto tempo caminhei, mas sabia que estava muito distante do hospital. Minhas vistas estavam turvas, minha cabeça dava voltas, sentia-me tonta e percebia minhas forças se esvaindo. Continuei caminhando por mais um longo tempo, mas o mal-estar só aumentava. Então, pouco tempo depois, vi um reflexo e, ali, naquela estrada deserta, desfaleço, sem saber qual seria o meu destino.

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