Mirella
É um desafio diário morar em outro país, longe de toda a minha família. Um país totalmente diferente, com outra cultura, outro ritmo ,até o sono aqui é diferente! E, principalmente... a comida. Sempre fui muito regrada, mas morando nos Estados Unidos não dá pra manter esse ritmo. A maioria dos lugares só serve lanche. Café da manhã com hambúrguer e batata frita... essas coisas. Comida brasileira mesmo, a gente só encontra em poucos lugares e, quando encontra, não tem aquele sabor gostoso de comida de mãe. Nossa, estou sentindo tanta falta da comida da minha mãe! O que tem me salvado são umas marmitinhas que encontro prontas no supermercado saladas, carne, peixe, frutas... tudo embalado, só pegar e comer. Vida de estudante não está nada fácil. Quando não estou estudando, estou dormindo. Quando não estou dormindo, estou estudando [risos]. A correria tá grande, a rotina mais louca da minha vida. Nem quando eu fazia curso e trabalhava era desse jeito. Aqui, eu tenho que me desdobrar para prestar atenção nas aulas e não dormir, porque, vou te contar, ainda não me acostumei com o fuso horário. Em meio ao caos da minha vida de estudante, conheci Lilian Durlan uma querida! Por incrível que pareça, ela é prima do mala do Williams Durlan. Ele é um veterano insuportável que, por algum motivo, encasquetou comigo. Cara chato! Nem parece estar na faculdade, parece aluno do fundamental. Tá difícil pra mim... tenho sofrido com esse idiota que decidiu pegar no meu pé só porque sou novata e, provavelmente, também por eu ser mulher em meio a tantos homens. Uns setenta por cento da turma são homens. E pior: a maioria são imigrantes, justamente os que ele mais persegue. A exceção é um cara que senta lá no fundo. Está sempre de preto, não fala com ninguém. De vez em quando, flagro ele me olhando. Seus olhos são negros, intensos, intimidadores... me deram medo logo de cara. Enfim, estou em um flat. Mudança de planos a ideia inicial era procurar um internato quando chegasse aqui, mas descartei totalmente essa hipótese. Primeiro, porque os idiotas vivem fazendo festinhas e não deixam ninguém em paz. Segundo, porque aqui eu vivo tranquila, tenho minha privacidade e não preciso dividir quarto com ninguém. Lilian tem sido uma amiga de verdade. Ela sempre me ajuda a me livrar do primo idiota. Infelizmente, na maioria das vezes, ela não está por perto quando ele resolve me encher o saco. Muitos novatos ficam à mercê desse cafajeste. Ele resolveu me pegar pra Cristo. É insuportável e mimado. Lilian e ele não se dão bem. Ela me contou que os pais dele têm boa influência na faculdade e isso me preocupa. Tenho medo de ele tentar me prejudicar. Ainda mais porque sou imigrante... e isso complica tudo. O pessoal aqui não é caloroso, nem amoroso. As pessoas são frias umas com as outras. E tem o tal cara da minha turma... o dos olhos intensos. Muitas vezes, quando estou distraída, olho e ele está me encarando como um lobo feroz, pronto pra atacar. Ele é bem misterioso, sempre vestido de preto, coturno estilo gótico. Seu olhar intimida. Ele parece esconder algo. Provavelmente é uma pessoa muito importante, porque só anda com seguranças. Ou talvez venha de uma família muito rica. Enfim... o tanto que ele tem de bonito, ele tem de assustador. Sinceramente? Acho que guarda um segredo dos mais cabulosos. Na minha cabeça, já criei mil teorias. Mais um dia de aula finalizado, graças a Deus. Caminho devagar, de cabeça baixa, rumo à saída. Só quero chegar em casa, tomar um banho quentinho e me enfiar debaixo das cobertas. Hoje, aqui em Massachusetts, está um frio intenso. E minha companhia não veio. Antes que eu cruze a saída, o idiota do Williams me puxa pelo braço. — Me larga, idiota! falo em inglês. — Tá com pressa, gata? Tava pensando... a gente podia ir até o meu quarto... você sabe, né... — Claro que não, escroto! Ele segura meu braço com força e tenta me puxar. Me b**e um desespero. Então ouço uma voz estrondosa, que arrepia a minha alma. Quando olho... vejo o homem de preto caminhando em nossa direção. Seu olhar é sombrio. Ele se aproxima como se fosse esquartejar o Williams em várias partes. — Solta ela, maldito! — a voz grave e rouca faz arrepiar até o último fio de cabelo do meu corpo. Em um piscar de olhos, Williams é arremessado para longe de mim com um impacto surpreendente. Meu corpo cambaleia, mas sinto uma das mãos dele me segurar firme pela cintura. Nossos olhos se cruzam. Estamos tão próximos que consigo sentir seu ar quente se misturar ao meu, e uma tensão toma conta de mim. Os olhos dele estão negros e indecifráveis. — Você está bem? ele pergunta, ajeitando delicadamente a nossa postura. — Sim! Obrigada... Vejo Williams sendo arrastado para a lateral pelos seguranças do homem misterioso. — Prazer, me chamo Mirella. estendo a mão em cumprimento, mas sou surpreendida por um beijo suave no dorso. — Vincent. Aposto que estou completamente vermelha... sinto meu rosto em chamas. — Fica mais linda corada. ele comenta, sorrindo .Desvio o olhar, sem saber onde enfiar a cara. Me despeço, ansiosa para chegar logo em casa. Seu olhar intimidador me desestabiliza. — Muito obrigada por me ajudar. Eu preciso ir. — Eu te levo. ele diz prontamente. — Não se incomode. Eu moro aqui perto e rapidinho chego em casa.Seu sotaque italiano o denuncia, mas a conversa flui naturalmente em inglês. — Incomodo nenhum. Será um prazer acompanhá-la até sua residência. sua voz firme não deixa espaço para negação. Concordo com um aceno e explico onde moro. Como é bem perto da faculdade, vamos caminhando a passos lentos. Ele anda com as mãos nos bolsos, puxando conversa sobre a faculdade e tentando saber mais sobre mim. Parece um investigador. Dou poucas informações, tento mudar de assunto, mas ele sempre volta a perguntar mais. — Agora me fale mais de você. Só eu falei praticamente tudo! — Já chegamos. ele diz e reconheço a fachada do prédio de quatro andares onde estou hospedada. — Sim! Nossa, nem percebi. ele ri.— Tenho a impressão de que está fugindo da conversa. — Eu não sou de fugir de nada. As pessoas é que fogem de mim. diz com frieza. — Janta comigo hoje. Te pego às oito. Antes que eu possa responder, ele se vira e sai. Um dos seguranças o acompanha, enquanto outro já está com a porta do carro aberta, parado bem em frente ao meu prédio. E eu nem tinha percebido. Meu Deus... o que foi isso? Na minha cabeça, mil pontos de interrogação. Será que devo aceitar? Ele nem me deu opção de sim ou não. Nem número, nada. Mas agora sabe onde moro... e foi tão decisivo ao me convidar para jantar. Estou tão insegura. O que devo fazer? Estou em uma luta entre a curiosidade e o medo. Preciso me decidir. Passei a tarde debaixo das cobertas. Liguei para minha mãe e para Liz. Contei para Liz sobre Vincent e ela disse: "Se você não aceitar, nunca vai descobrir quem ele é." Tentei pesquisar sobre ele na internet e nada. Absolutamente nada. Decido tomar outro banho quente, faço minha rotina de cuidados e, trinta minutos depois, estou enrolada na toalha procurando uma roupa que combine com a ocasião e, claro, me mantenha aquecida. Opto por um vestido preto tubinho, um palmo acima do joelho, com manga princesa longa. Conjunto de lingerie na mesma cor, meia-calça e uma bota de salto com cano longo. Finalizo com um sobretudo vermelho longo para quebrar o preto do look. Hidrato meu corpo, me visto em frente ao espelho e gosto do resultado. Faço uma maquiagem básica, porque sinceramente... é o que sei fazer. Com tempo de sobra, decido fazer ondas leves nas pontas do cabelo e finalizo com meu perfume Coco Chanel. Olho para o relógio do micro-ondas: faltam vinte minutos para as oito. E, nesse exato momento, o telefone toca. Um número desconhecido. Atendo com certo receio. — Alô? — Estou à sua espera. reconheço a voz imediatamente. — Como conseguiu meu número? — Consigo tudo o que quiser. sua voz soa misteriosa. Corro até a janela e o vejo, encostado no carro, celular no ouvido, olhando para cima direto pra mim. Como sempre, está todo de preto, o que o deixa ainda mais charmoso.Meu coração quase sai pela boca. Ouço sua respiração do outro lado da linha. — Não tenha medo de mim, baby. Só estava ansioso para jantar com você. Por isso cheguei mais cedo. — Ok... só um minuto. Já estou descendo. Baby? Ansioso? Suas palavras ainda estão se processando na minha mente. Pego minha bolsinha e pertences, tranco a porta e desço devagar pelas escadas, tentando não tropeçar nas minhas próprias pernas de tanto nervosismo. Ao chegar no último degrau, lá está ele, parado, me olhando dos pés à cabeça. — Maravilhosa...Sorrio, tímida. — Obrigada. é a única palavra que consigo dizer.Mais uma vez, ele beija minha mão, segura-a com firmeza e me guia para fora do prédio. Há dois carros estacionados: uma Lamborghini preta e outro que não reconheço a marca. Ele abre a porta para mim e entro com cuidado, sentindo seu olhar sobre mim o tempo todo. Em seguida, dá a volta e entra pelo lado do motorista. Coloca o cinto, assim como eu, e dá partida. O silêncio é quebrado pela sua pergunta: — Tem preferência por algum restaurante? — Eu não conheço muito aqui, então... — Certo, baby. Vou te levar em um dos meus favorito espero que goste. Acelera suavemente. Pelo retrovisor, vejo o outro carro nos seguindo. Provavelmente seus seguranças.VincentSou Vincent Mangano, tenho 34 anos e faço parte da família Gambino. Somos uma das cinco famílias que formam a organização da máfia italiana. Sou o próximo na linha de sucessão. Meu avô, Carlo Gambino, comandou a organização entre 1957 e 1976, até ser assassinado por inimigos. Depois, o comando passou para meu tio mais velho, que anos depois morreu de câncer. Desde então, quem está à frente é meu pai, Paul Gambino. Em breve, serei eu — assim que me casar.Dominamos a maior parte do território de Nova Iorque: Brooklyn, Staten Island, Manhattan, entre outras regiões.Atualmente, curso Medicina em Harvard. Não apenas por gosto pessoal, mas também como uma forma estratégica de despistar investigações. Além disso, ser cirurgião pode ser útil em tempos de guerra entre famílias. Quando os conflitos se estendem por meses, sempre temos feridos do nosso lado. E eu posso ajudar.Agradeço aos céus por, ao menos, poder escolher com quem vou me casar. E, pelo visto, já encontrei. Uma adoráve
Mirella Minha cabeça está a mil. Assim que fechei a porta atrás de mim, encostei as costas nela, tentando recuperar o fôlego. O que acabou de acontecer? Eu fui jantar com um completo estranho , um homem sedutor, misterioso, que me salvou de um idiota metido a galã e voltei com um pedido de casamento. Um pedido vindo de um mafioso.Sim, mafioso. Ele disse com todas as letras. Sem rodeios. Apenas jogou a verdade no meio do restaurante como se estivesse me contando que é alérgico a frutos do mar. E pior disse que me observava há semanas, que sabia tudo sobre mim... até que mandou investigarem minha vida.Minhas mãos ainda tremem. Sinto o gosto do vinho nos lábios misturado com o sabor do beijo dele. E que beijo. Intenso, dominador, confuso assim como ele. Meu corpo reagiu de uma forma que minha mente ainda não entendeu. E talvez seja isso que mais me assuste.Vincent Mangano. Ele é bonito de um jeito que chega a ser pecado. Olhos que parecem atravessar a alma, voz firme, postura de que
Mirella continuação....Fiquei parada na porta por alguns segundos, com o coração disparado e as pernas trêmulas. O cheiro dele ainda pairava no ar , uma mistura de perfume amadeirado com algo que eu não conseguia definir, mas que fazia meu corpo reagir de um jeito que me deixava ainda mais confusa. Fechei a porta devagar, encostei as costas nela e respirei fundo.Dia 1Será que eu estou ficando louca?Deitei na cama, abracei meu travesseiro e olhei pro teto, tentando organizar os pensamentos. Ele estava me conquistando, disso eu não podia mais fugir. A forma como me olha, a firmeza nas palavras, o jeito como parece saber exatamente o que dizer , tudo nele parece calculado, mas ao mesmo tempo, tão intenso. Ele me assusta. Mas também me atrai. E isso me assusta ainda mais.Na manhã seguinte, acordei com o barulho da campainha, uma caixa minha eu sabia que era coisa dele , Um vestido preto de cetim, justo na medida certa, e um par de saltos que pareciam saídos de uma passarela. Um bilh
Vincent Dia 4 Acordei pensando nela. Mirella. Com aquele jeitinho desconfiado, as palavras sempre na ponta da língua, mas os olhos… os olhos entregam tudo. Ela sente, ela tenta negar, mas sente. Hoje eu queria surpreendê-la de um jeito diferente. Nada de luxo, nada de flores ou presentes caros. Queria mostrar pra ela que, por trás da imagem que carrego, ainda existe algo humano. Algo real. Passei o dia inteiro resolvendo assuntos da família, assuntos que ela jamais entenderia e que nem quero que ela entenda. Não agora. Mas mesmo com o caos me cercando, era nela que eu pensava. Às 19h mandei uma mensagem: “Vista algo leve. Te pego em 20 minutos.” Ela demorou a responder, mas veio. Quando entrou no carro, seu olhar curioso e cauteloso estava ali como sempre, mas havia também uma certa... entrega. Como se ela tivesse decidido parar de lutar com os próprios sentimentos, nem que fosse só por hoje. — Hoje é especial . falei, guiando o carro para fora da cidade. — Por quê? ela
Vincentcontinuação... Dia 6 O dia amanheceu estranho. Acordei com uma ligação que gelou minha espinha. Um dos meus homens de confiança, Pietro, havia sido atacado. Não por rivais, mas por traidores... de dentro. Alguém que eu alimentei. Que cresceu sob minha proteção. A máfia não perdoa traição. E muito menos eu. Passei a manhã resolvendo esse tipo de sujeira. Sangue. Gritos. Punições. Esse é o lado da vida que eu escondo da Mirella. O lado que mancha minhas mãos, minha alma, meu nome. Mas é também o que me fez quem eu sou. O que me deu o poder de escolher com quem vou dividir o meu império.Escolher ela. Mas hoje… tudo sair do controle. Mirella apareceu na faculdade bem no momento em que recebi uma ligação urgente. Eu estava no estacionamento. Ela me viu entrar no carro com dois homens armados e a expressão no rosto dela foi de puro pânico. -Droga. Tentei disfarçar, mas ela já tinha visto o suficiente.Horas depois, voltei pra encontrá-la. Ela me esperava em frente ao prédio del
Mirella Dia 9 Estou completamente perdida dentro de mim.Ele me tirou de todo eixo. Ontem, quando ele segurou minha mão e beijou com tanta suavidade, eu senti meu corpo inteiro arrepiar. Não foi só o gesto... foi a forma como ele me olhou depois. Como se estivesse me enxergando por dentro. Passei a noite sem dormir direito, pensando naquela frase: "Um dia, Mirella... você vai me beijar primeiro." Talvez ele nem imagine o quanto essa frase grudou na minha mente como tatuagem invisível.Estou tentando ser racional, juro que estou. Mas como manter a razão quando esse homem, tão perigoso e intenso, me trata com uma delicadeza que nenhum outro tratou? Quando ele me olha como se eu fosse a única mulher do mundo? Hoje, na faculdade, ele nem precisou se aproximar. Só o olhar dele já foi suficiente pra me fazer tremer. Seus olhos me encontraram no corredor, e eu quase perdi o equilíbrio. Ele me estuda... cada movimento meu. E eu sinto que ele já me conhece melhor do que eu mesma. — Você t
Mirella continuação...Dia 11Acordei com o coração acelerado. Não foi pesadelo , foi realidade. Hoje é o dia em que vou conhecer o pai de Vincent. O homem. O chefão da máfia italiana. Só isso já seria o bastante pra me fazer tremer... mas tem mais. É o pai do homem que está tentando me conquistar. O mesmo homem que ontem beijou minha alma com os lábios e disse que eu era a escolhida dele.Tentei manter a compostura. Me arrumei com calma, nada muito chamativo. Vestido preto, elegante, discreto. Cabelo preso num coque baixo. Um pouco de perfume atrás da orelha. E, claro, coragem nos bolsos.Vincent chegou pontualmente. Me olhou como se eu fosse a única mulher no mundo e me disse:— Vai dar tudo certo. Eu prometo.No carro, o silêncio era tenso, mas confortável. Vincent segurava minha mão com firmeza. Como se dissesse, sem palavras, que não importava o que viesse, ele estava ali.Chegamos em uma mansão afastada, de arquitetura clássica, imponente, e cercada de seguranças que pareciam s
Vicentdia 12 Naquela manhã, algo no ar já me incomodava. A sensação de que estava sendo observado voltou. Era como se o passado estivesse se aproximando a passos largos, pronto pra cobrar cada escolha que fiz. E eu odeio ser surpreendido. Julian me entrega um envelope. — A mulher que você pediu pra investigar... reapareceu. — diz ele com cautela. — Qual mulher? Ele hesita. — Giulietta. Engulo em seco. Aquela mulher... a que quase destruiu tudo uma vez. Giulietta foi uma amante, uma aliada, uma bomba-relógio. Ela sabia demais e nunca aceitou o fim.Abro o envelope. Fotos dela andando perto da universidade. Coincidência? Não. Isso é um recado.Antes que eu possa processar, outro problema entra pela porta do meu escritório. — Primo. diz ele, com um sorriso cínico. Marco Mangano. Filho do irmão do meu pai. Crescemos juntos, mas enquanto eu lutava pra manter o império com honra, ele sempre quis o atalho. Invejoso. Imprevisível. Ardiloso. — Soube que você anda distraído... por causa