O coração de pedra

Capítulo 4

O Coração de Pedra

Rocco Mancini

O silêncio finalmente retornou ao meu escritório, mas a tensão que ele continha era mais alta do que qualquer ruído. Eu estava de pé, observando o lugar onde Scarlett, a babá, tinha estado. Eu a tinha forçado a ficar, e o motivo era simples e humilhante: o bastardo, Luigi, que eu me neguei a conhecer.

Eu não podia amar aquela criança, ela seria usada contra mim se eu me permitisse ter essa fraqueza.

A cena anterior ainda queimava na minha mente: a minha própria incapacidade de olhar uma criança que tinha meu sangue. Eu, Rocco Mancini, futuro Dom, controlado por um bebê de poucos meses. Era uma ironia cruel que não podia ser tolerada.

O Dom não tem coração. O Dom tem controle.

Eu repeti o mantra em minha mente, tentando sufocar o impulso estranho que havia surgido em ver a criança, e em calar aquela mulher. A babá. Scarlett.

Ela não era como as mulheres que circulavam em meu mundo. Não era polida e plastificada como as outras. Ela era pequena, mas irradiava uma força silenciosa. Seus olhos castanhos eram desafiadores, mas havia uma tristeza submersa neles que me intrigou. Quando ela me encarou, perguntando se eu não iria conhecer o bebê, havia fogo. Um fogo que eu queria apagar e acender ao mesmo tempo

E então, houve a atração. Brutal e inegável.

A atração por uma mulher que se recusava a se submeter, que tinha peito para me enfrentar. Ela vestia roupas simples e amassadas de viagem, mas havia uma beleza crua e incomum em seu rosto, na forma como ela segurava o bebê com uma naturalidade que me era completamente estranha. Um erro. Ela era um erro que se somava à complicação de Luigi. Um problema duplo que eu tinha que neutralizar.

Proibida. A palavra ecoou na mesma frequência que Scarlett.

Eu não podia me dar ao luxo de fraquezas, muito menos de luxúrias. Finalmente teria o meu legado; a passagem de poder estava iminente. Ela era apenas uma ferramenta para ocultar da minha vida o bebê. Nada mais.

O pior era que somente ao senti a presença dele, algo que nunca senti floresceu. Um tremor no meu peito, um despertar de algo antigo e adormecido. Um reconhecimento visceral. Ele era pequeno, perfeito, com um tufo de cabelo escuro, foi o que eu consegui ver de longe. Ele era a prova do meu descuido, mas também a extensão do meu sangue.

Por um breve momento, a frieza do Dom vacilou. Pensei no que teria sido se a mãe dele tivesse vindo até mim, se o mundo fosse diferente, se eu fosse um homem diferente.

Cazzo!

Eu afastei o pensamento com a mesma força que afastava a dor. Não há ‘se’. Há o que é. E o que é, é que ele é um risco. Uma bomba-relógio que Marco, meu primo, mataria para desarmar.

Eu apertei a borda da mesa. O Dom não tem coração. O Dom tem apenas responsabilidade e poder. Eu faria o que fosse necessário. Luigi existia, e isso significava que ele era agora minha responsabilidade. Eu o protegeria, mas o manteria nas sombras. Ele nunca saberia quem eu sou, e eu nunca saberia quem ele poderia ter sido.

- Matteo. - Eu chamei minha voz voltando ao tom de comando frio. - Certifique-se de que a babá e o bebê estejam em uma ala isolada. Longe de qualquer tráfego da família. Especialmente... longe de Marco.

- Considere feito chefe. – Matteo se vai e eu fico com as minhas responsabilidades que não podem me esperar fraquejar.

Os próximos dias foram estranhos e tensos. Por mais que eu não pudesse, não quisesse ou devesse. Estava sempre me esgueirando para conferir pessoalmente meus dois problemas.

Dois seres que não pertenciam ao meu mundo. Pelo menos um deles não, o outro, esse seria arrancado da minha vida para ter alguma chance. Somente não sabia ainda como.

Eu os ignorava, mas sabia que estavam lá, eu os escutava, mas tentava ignorar.

Quando tudo estava quieto demais, somente caminhava até o outro lado da mansão para ouvir a babá cantando músicas de ninar para o meu filho, ou ver ela pegar vários cobertores. Colocar em frente a janela, e colocar o pequeno para tomar banho de sol da manhã.

Luigi colocava a mão na boca, enquanto ela o admirava somente por ser um bebê.

A rotina de ambos era previsível. Eu não precisava estar lá, mas nos últimos dias. Eu me via esgueirando para lá e ficava nas sombras.

Poderia ter colocado câmeras, mas ver de certa distância ainda passava a mensagem que eu estava ali, não por amor, por dever.

Em uma certa manhã Scarlett tentou algo, ela sempre soube que eu estava observando. Não era segredo, mas nunca tentou falar nada.

- Posso levar o Luigi para passear lá fora? - Olho para ela tentando entender o que ela quer de fato. - Ele precisa pegar sol, precisa respirar ar puro... - Ela se cala ao olhar dentro dos meus olhos.

- Aqui tem sol, porque ir lá fora? - Ela engole seco.

- Porque o sol é bom... Fora que lá fora, ele pode ver as flores, ar puro.

- Não! - Digo seco.

- Porque? - Ela me olha quando percebe que falou demais.

Eu entro no quarto devagar, medindo cada centímetro que nos separar como se fosse uma luta que eu não deveria estar lutando, e sim, aniquilando.

- Porque essa criança não pode ser vista por ninguém, Scarlett. Ninguém da minha família pode saber que eu tenho um bastardo como filho.

Vejo a decepção em seus olhos, estou sendo duro, mas não sei ser diferente. - Se ele ainda está vivo, é porque ninguém faz ideia que ele existe. - Ela me olha com os olhos marejados.

- Sua família é tão cruel assim ao ponto de matar um inocente? - Não respondi, olhei dentro dos seus olhos.

- Na máfia não tem espaço para bastardos, Scarlett. Se descobrirem sobre Luigi, a vida dessa criança vai ser um inferno. - Digo por fim. - Então é melhor ele viver em um quarto de luxo, do que correndo perigo lá fora no sol brilhante. - Ela me olha séria, e enxuga uma pequena lágrima que escorreu.

- Entendido. - Me levanto e saio do quarto sabendo que a deixei com uma impressão horrível sobre minha família.

No entanto, eu preciso que ela tenha medo, que ela entenda quais são os riscos que estamos correndo aqui.

Foco nos meus compromissos, a vida não para porque eu tenho um filho fora do casamento. Agora mais do que nunca eu preciso manter as aparências.

(...)

Eu estava prestes a sair para um jantar importante com meu pai, o último grande evento antes da coroação. Vestindo meu smoking sob medida, senti o peso do meu destino. Eu estava pronto.

O elevador subiu até o hall principal, estava na minha sala de armazenamento que ficava embaixo da casa. Foi então que tudo deu errado.

A porta do elevador se abriu, e lá estava Marco, meu primo, em todo o seu esplendor traiçoeiro. Ele estava sempre sorrindo, um tubarão que exibia os dentes.

- Rocco! Quase a hora. Você está impecável, como sempre. Mal posso esperar pelo seu grande dia. - Ele disse, mas seus olhos brilhavam com inveja e malícia.

- Não se esforce, Marco. - Eu respondi, passando por ele. - Eu sei que a única coisa que você espera é minha queda.

Ele riu, um som seco e desagradável.

- Ah, você me conhece. Sempre um cavalheiro brutal.

- O que veio fazer aqui, primo? Que eu saiba a reunião não será na minha casa. - Digo irritado por não ter sido avisado da sua intromissão.

- Ora primo, tenho que marcar visita para vir te ver? Sabe Rocco...

E então ele parou. E eu soube, antes de me virar, que ele tinha visto algo.

O hall principal era um lugar proibido para a Babá, mas Matteo tinha me avisado sobre um problema com o encanamento na ala isolada. Ele deveria ter levado Scarlett para o andar de serviço, mas o destino tinha outros planos.

Lá estava ela, na ponta da escadaria de mármore, envolta em uma luz suave. A babá estava usando um vestido simples que havia sido entregue a ela. Nada do seu guarda-roupa extravagante. No entanto, o tecido fino revelava a silhueta do seu corpo. Ela não segurava Luigi, pelo menos isso. O cabelo dela estava solto, caindo em ondas escuras sobre os ombros, e ela parecia menos uma funcionária e mais uma Vênus surpreendida.

Ela estava tentando se esgueirar de volta para cima, mas o olhar de Marco a prendeu.

O sorriso do meu primo se alargou, transformando-se em algo lascivo e predador.

- Bem, bem, bem. - Marco murmurou, seus olhos percorrendo Scarlett de cima a baixo com uma lentidão insultante.

- Que visão gloriosa! Rocco, meu caro, você não me disse que havia importado um novo talento para a casa.

Eu senti meu sangue ferver. A fúria era tão intensa que quase me sufocou. Era possessividade pura, instintiva e selvagem. Não por amor, mas por domínio. Ela era minha, minha prisioneira, meu segredo, e Marco não tinha o direito de olhar.

Scarlett se encolheu, estava procurando uma forma de fugir.

- Ela é uma funcionária, Marco. E não é da sua conta. - Eu disse, minha voz baixa e perigosa.

Marco ignorou-me e começou a subir os degraus em direção a ela, como um lobo caçando.

- Funcionária? Não, não, Rocco. Ela tem potencial. Posso apresentá-la à... hospitalidade da família Mancini. Venha cá, linda. Deixe-me ver esse rosto mais de perto.

Ele estendeu a mão para o braço dela.

- Você é uma delícia... – Diz pegando o braço dela. - Você tem a pureza que o nosso futuro dom adora... - Marco tinha um sorriso zombeteiro no rosto. - Primo, onde acha essas virgens inocentes para foder? - Scarlett estremece ao seu toque.

- Queria ser o primeiro... - Diz pegando naqueles fios de cabelos que tanto me chamam a atenção.

Naquele momento, algo estourou dentro de mim. O Dom, o Herói, o Homem, o Animal — tudo se fundiu em uma única explosão de violência.

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