Eu o vi no instante em que entramos na sala de aula. Giovanni Romano — meu marido, o pai do meu filho — sentado perto da janela, como se pertencesse àquele lugar. Ao lado dele, um garotinho que eu não reconhecia. Por um segundo, fiquei ofegante. A turma de Leo havia sido aberta há apenas meio ano. Giovanni nem sabia em que série ele estava. Antes que eu pudesse impedi-lo, o rosto de Leo se iluminou. Ele correu, a pequena mochila balançando a cada passo.
— Pai! — Ele dizia.
Os olhos de Giovanni se voltaram para ele. Frios. Cautelosos.
— O que foi que você acabou de me chamar?
A cor sumiu do rosto de Leo. Ele hesitou, depois sussurrou a palavra que me partia um pouco mais todas as vezes.
— Tio. Desculpa, tio Gio. Acho que você está sentado no meu lugar.
Giovanni desviou o olhar.
— Não. É aqui que eu devo estar.
Antes que Leo pudesse perguntar o que ele queria dizer, outra voz cortou o burburinho.
— Sai! Esse é o meu pai.
Um garotinho passou entre eles, agarrando a mão de Giovanni como se já tivesse feito isso mil vezes. Meu instinto falou mais alto. Dei um passo à frente, protegendo Leo atrás de mim. Giovanni também se levantou, mas, quando Elena Duval apareceu na porta com dois copos nas mãos, ele congelou. Puxou a mão de volta.
— Ela tem razão. — Disse, com a voz tensa. — O menino não quis fazer mal.
Leo o olhou, confusão nublando seus olhos castanhos. O mesmo olhar que ele tinha sempre que tentava entender por que o amor funcionava de forma diferente pra ele. Elena sorriu ao me ver.
— Jo? Você também está aqui? — O tom era leve, educado. — Eu não sabia que seu filho estudava nesta escola.
Então, com um leve inclinar de cabeça:
— Onde está o pai dele? Viajando de novo?
Algo dentro do meu peito se retorceu.
Giovanni não olhou pra mim.
— Filho de amigos. — Murmurou, rápido demais, baixo demais.
Certo. A "amiga" da foto com a legenda "futuro melhor pai". Algo dentro de mim ficou completamente imóvel. Leo deve ter sentido. Deu um passo à frente com a voz trêmula.
— Meu pai não está aqui. Ele está muito ocupado. Eu não quero incomodar.
As palavras doeram mais do que qualquer tapa.
A expressão de Giovanni vacilou — choque, talvez culpa — mas sumiu antes que eu pudesse entender. O filho de Elena ainda segurava firme na manga dele. Leo sorriu mesmo assim. O mesmo sorriso corajoso de sempre, aquele que ele usava pra esconder a dor.
— Tio Gio, eu vou com a mamãe agora.
Eu não consegui falar.
Minha garganta estava crua de tanto conter tudo o que eu queria dizer e nunca podia. Quando me virei pra ir embora, Giovanni estendeu a mão num reflexo, como se o corpo se movesse antes da mente. Seus dedos roçaram meu pulso. Por um instante, ficamos imóveis. Então eu sorri um sorriso pequeno, cansado.
— Deixe-o ir, senhor Romano. — Sussurrei. — Ele não é sua responsabilidade.
E saí, segurando a mão de Leo, sem olhar pra trás. Essa foi a terceira chance. A última.
Eu nem me virei. Ele já tinha nos perdido muito antes daquela noite.