POV HENRY BLACKWOOD
O zumbido dos servidores ficou para trás mas o silêncio do meu escritório era ensurdecedor. Eu estava sozinho olhando para as luzes de Eversfield que de repente pareciam mais distantes. O punho da minha mão estava cerrado e eu me forcei a respirar fundo controlando a fúria que não era pelo erro no código mas pela minha própria falha de controle. Eu havia passado a semana inteira construindo um muro de gelo ao redor de Zoey Sinclair. Desde que a vi naquela sala de conferências na segunda-feira eu soube que era a única maneira. O impulso de ir até a mesa dela de perguntar sobre seu progresso de olhar para ela e desvendar o que havia por trás daqueles olhos focados era uma distração que eu não podia permitir. A dificuldade não estava em ser frio; estava em ser ignorante. Na Segunda-feira, minha tática foi estritamente defensiva. Na reunião matinal eu mal me movi, evitando direcionar o queixo na direção dela. Usei o sarcasmo ("A Blackwood Tech não investe em prosa") para marcá-la como inferior e forçar o distanciamento. Eu passei a maior parte do dia analisando o mapa de produtividade na tela da parede, mas meus olhos sempre buscavam o pequeno ponto de luz onde a mesa dela se localizava no 35º andar. Eu precisava garantir que ela estava lá, trabalhando, e que eu estava, de fato, a ignorando. A tensão me deu uma enxaqueca no meio da tarde, algo raro para mim. A Terça-feira foi pior. Recebi o primeiro relatório semanal de Patrick sobre o progresso dos novatos. O de Sinclair era impecável, detalhando os primeiros manuais de compliance de forma mais rápida do que qualquer outro analista em anos. A admiração profissional colidia diretamente com a minha necessidade de distância. Eu me forcei a ligar para Patrick apenas para criticá-lo por não ter feito uma revisão mais rigorosa no trabalho dela, quando, na verdade, eu estava furioso porque ela era boa demais para ser ignorada. Eu passei o dia escondido em reuniões de acionistas, uma fuga deliberada da ala de Projetos. Na Quarta-feira, eu pensei que tinha ganhado controle. Fui ao meu clube para almoçar, longe da torre. Mas quando voltei, Sophie me avisou que Sinclair havia solicitado acesso ao arquivo de códigos-fonte do Sigma-7 — o projeto mais complexo da empresa. Era um movimento ousado e totalmente desnecessário para um júnior. Meu primeiro instinto foi negar, mas a curiosidade venceu a cautela. Eu aprovei o acesso com a condição de que Patrick estivesse em cópia em todos os logs de entrada. Eu queria monitorá-la sem que ela soubesse que eu estava vigiando cada passo dela. A Quinta-feira foi a luta mais difícil. Eu me forcei a não olhar para os logs do Sigma-7. Passei a manhã simulando cenários financeiros futuros, tentando focar na estratégia e não na analista que estava mergulhada em códigos que nem mesmo Patrick conseguia dominar completamente. Eu sabia que ela estava trabalhando tarde, mais do que qualquer outro júnior. Eu sabia que ela estava consumindo todos os manuais técnicos. Cada relatório de feedback positivo de Patrick sobre "Sinclair" era uma punhalada na minha determinação. A cada manhã, eu me preparava para a reunião, memorizando minha lista de perguntas para o resto da equipe, mas mantendo um vazio deliberado na seção dela. Eu precisava que ela pensasse que a minha atenção se esvaíra, mas na realidade, minha atenção estava totalmente consumida pela tarefa de não olhá-la. E então ela irrompeu pela porta na Sexta-feira à noite. Não com um pedido trivial mas com uma ameaça de US$ 2.3 milhões diários. Quando Zoey Sinclair entrou na sala de servidores o jogo de distância desmoronou em um segundo. Ela não era mais a candidata inexperiente; era uma bombeira que tinha acabado de me salvar de uma explosão financeira. Naquele espaço apertado eu tentei manter minha fachada. Minha voz era urgente focada na falha. Mas estar ombro a ombro com ela sentir o cheiro sutilmente doce do seu cabelo misturado ao cheiro metálico dos servidores era uma tortura. Ela estava totalmente absorta no código movendo-se com a precisão de um cirurgião. Quando ela explicou o erro— "uma falha de arredondamento minúscula que se torna catastrófica em bilhões de transações" — o ar me faltou. Patrick um homem com vinte anos de experiência deixou passar. Liz e Diana minhas melhores analistas não viram. Mas ela a caloura a contratação arriscada a percebeu. Eu a observei digitando e um sentimento avassalador de admiração me atingiu. Não era apenas por ela ter salvado a empresa. Era pela sua inteligência pura e implacável. A mente dela era um algoritmo eficiente que não se distraía com a pressão ou com a minha tentativa patética de afastá-la. Como eu ousei pensar que ela era apenas uma distração? Ela é o melhor investimento que fiz em anos. Meu dedo roçou o dela na tela enquanto eu analisava a sub-rotina de Patrick. Aquele toque breve e acidental enviou uma corrente elétrica que me fez sentir um homem e não apenas o CEO. Eu me forcei a focar no código: — Esta sub-rotina... ela foi aprovada pelo Patrick na revisão final — eu disse. A fúria era real dirigida a Patrick mas o alívio era por Zoey. — Como ele deixou passar algo dessa magnitude? Ela se manteve focada profissional. Me explicou o "ponto cego" do erro e eu me inclinei sentindo a respiração dela tão próxima. Eu podia sentir o calor dela contrastando com o frio da sala e naquele instante o poder de Zoey não estava na sua beleza ou no seu olhar desafiador mas na sua competência inegável. — Você entende a gravidade disso, Sinclair? Se você não tivesse entrado agora... A frase morreu na minha garganta. Eu não podia dar a ela a recompensa de um agradecimento pessoal. Não aqui. Eu me endireitei e naquele breve momento deixei que o olhar faminto da entrevista retornasse. Eu vi o reconhecimento em seus olhos e soube que ela havia entendido o quanto a sua presença me afetava. Eu queria dizer a ela que o trabalho dela era brilhante que eu estava errado por tentar diminuir o seu valor. Mas o controle de anos venceu. Eu precisava fechar aquela cena reassumir o comando mesmo que o muro estivesse rachado. — Corrija. Imediatamente, Zoey. O nome. A falha final do meu sistema de defesa. Eu saí da sala de servidores sem esperar por uma resposta sem dar a mim mesmo a chance de olhar para ela mais uma vez. Voltei ao meu escritório e antes mesmo de soltar o ar peguei o telefone. Não para falar de negócios. Liguei para Simon meu antigo mentor e presidente do conselho. — Está na linha de código Simon. Na Sigma-7. Zoey Sinclair encontrou. — Minha voz estava áspera. — Sinclair? A novata. O que Patrick e Diana estavam fazendo? — Ele questionou. — Estavam cegos. Ela não. Ela é um ativo Simon. Raro. Eu a contratei para provar que a minha hesitação era infundada mas ela provou que a minha tentativa de ignorá-la é que foi o verdadeiro erro. — O que você fará? Ela é uma distração ou é a solução? — A pergunta dele me atingiu em cheio. Eu olhei para o dossiê que mantinha sobre a mesa onde estava o histórico de Zoey a ficha de Santa Aurora a garra. — Não posso mais ignorá-la. Preciso testar a resiliência dela sob pressão e ver se essa genialidade sobrevive a ambientes menos controlados. — Eu precisava de uma desculpa profissional para forçar a interação. — Ligue para Sophie. Mande incluir a Analista Sinclair na comitiva para a conferência de tecnologia em Munique. Eu preciso dela lá para monitorar a correção do Sigma-7 em tempo real. E não a avise até segunda de manhã. Eu desliguei. A questão não era mais se Zoey Sinclair seria uma distração. Eu estava prestes a descobrir quando ela se tornaria o único foco.