RYDERO rancho parece maior desde que Savannah se foi. Os dias arrastam-se, iguais, mas faltando qualquer coisa que não consigo nomear. Tento ocupar-me com o trabalho, mas a verdade é que não sei por onde ela anda. Desconfio que esteja com a Harper em Creekville, mas ninguém me confirma nada. Rose limita-se a dizer que ela precisava de espairecer, e eu fico a remoer o vazio que ela deixou.É já noite quando me sento na varanda da casa principal, o Bear deitado aos meus pés, a cabeça pesada no meu colo. Passo-lhe a mão pelo pêlo, sentindo a respiração lenta do cão, o único som além do coaxar distante das rãs. O cheiro da terra húmida, misturado com o aroma das flores do jardim da minha mãe, traz-me memórias de outras noites, mais leves, em que Savannah se ria ao meu lado, enrolada numa manta.Ouço passos atrás de mim. Hunter surge na penumbra, duas cervejas na mão. Atira-me uma, que apanho no ar, e senta-se ao meu lado, sem dizer nada durante uns segundos. O Bear levanta a cabeça, curi
SAVANNAHCarrego os sacos das compras nos braços como se carregasse o peso do mundo. O corredor do prédio de Harper parece mais longo hoje, cada passo ecoa na minha cabeça cansada. O cheiro a pão fresco mistura-se com o perfume barato de algum vizinho, mas nada me distrai deste vazio que me acompanha desde que saí do rancho. A cada dia aqui, sinto-me mais longe de tudo o que me fazia sentido. Sinto falta do cheiro da terra, dos risos no estábulo, do Bear a correr atrás das galinhas. Sinto falta dele, embora me recuse a admitir sequer para mim própria.Chego à porta do apartamento, tento equilibrar os sacos e procurar as chaves na mala, mas é impossível. Respiro fundo, frustrada, e acabo por tocar à campainha com o cotovelo, rezando para que Harper não demore.Demora quase um minuto até ouvir o trinco rodar. Não vejo nada à minha frente, os sacos tapam-me completamente a vista. Entro, a falar alto, na esperança de que Harper me venha ajudar.— Harper, nem imaginas o caos que estava no s
RYDERSaio do apartamento de Harper furioso, a cabeça a latejar e o coração aos saltos no peito. Mal vejo por onde vou, só quero afastar-me dali, fugir daquele olhar de Savannah que me queimou mais do que qualquer palavra. Nem dou conta do que está à minha volta quando, de repente, choco com alguém no corredor. O impacto é seco, ombro contra ombro, e só quando ouço a voz do meu irmão percebo o que aconteceu.— Eh pá, Ryder! — Hunter quase deixa cair o copo take away de café. — Que raio se passa contigo?Não respondo, nem olho para trás. Sigo em frente, determinado, até ao jipe que trouxe com o meu irmão. Ouço-o a comentar com Harper, lá atrás:— Vou resolver isto.Já estou a destrancar a porta do jipe quando o oiço chamar-me:— Ryder! Espera aí.Paro, mas não me viro logo. Sinto o Hunter aproximar-se, o olhar dele cravado nas minhas costas.— O que aconteceu lá em cima? — pergunta, a voz baixa mas firme.Respiro fundo, a raiva ainda a borbulhar-me nas veias.— Savannah está irredutível
SAVANNAHAssim que a porta do apartamento se fecha atrás de Ryder, sinto o vazio a invadir-me de uma maneira quase física. Fico ali, parada no centro da sala, a olhar para o nada, como se esperasse que ele voltasse a entrar, que dissesse que tudo não passou de um mal-entendido. Mas a única coisa que ouço é o som abafado do trânsito lá fora e o eco da minha própria respiração. O apartamento de Harper parece encolher à minha volta, as paredes a apertarem-se, e eu, perdida neste silêncio, deixo-me cair no pequeno sofá da sala.Abraço as pernas ao peito, tentando encontrar consolo em mim mesma. O tecido áspero do sofá roça-me a pele, mas não me aquece. Sinto uma tristeza funda, como se tivesse perdido algo que nunca foi realmente meu. Não sei quanto tempo fico ali, imóvel, a olhar para o vazio. Só quando sinto o rosto húmido percebo que estou a chorar. As lágrimas escorrem devagar, tímidas, quase envergonhadas, como se não quisessem dar parte de fracas.Ouço a porta do apartamento a abrir
RYDERGuio o jipe pela estrada deserta, o céu já a ganhar tons dourados do fim do dia. São quase duas horas de viagem desde Creekville até à localização que a Andie me mandou. O silêncio dentro do carro só é interrompido pela rádio, que toca baixinho. De repente, começa a soar “What Am I Gonna Do” do Chris Stapleton. A voz rouca dele enche o habitáculo, e não consigo evitar sentir um nó no estômago.O refrão ecoa, batendo fundo:What am I gonna doWhen I get over you?What am I gonna beWhen you’re just a memory?What am I gonna drinkWhen I don’t have to thinkAbout what I’m gonna doWithout you?É irónico. Sinto-me exatamente assim. Não sei o que sou sem a Savannah. Não sei o que fazer com este vazio, com esta saudade que me consome. A música parece ter sido escrita para mim, para nós. Penso em tudo o que deixei por dizer, nas discussões, nos ciúmes, nas palavras que ficaram presas na garganta. E, apesar de tudo, só queria voltar atrás, só queria que ela estivesse aqui ao meu lado.
SAVANNAHOs meus dias a viver com a Harper são um verdadeiro misto de emoções. Quando ela está por perto, a casa enche-se de risos, conversas e distrações. Arranjamos sempre algo para fazer: desde maratonas de séries, a experiências culinárias falhadas, a passeios espontâneos pelo bairro. Mas, quando ela sai para o consultório, para cuidar dos animais, ou quando a noite cai e me deito na cama, o silêncio pesa. É nesses momentos que o coração aperta, que a saudade do rancho me assalta sem piedade.Sinto falta de tudo: do resmungo da Beth logo pela manhã, do carinho e cuidado da Rose, do Bear sempre atrás de mim a pedir carinhos, das discussões e tontices dos irmãos Sawyer… especialmente de um deles. Mas quem mais pesa agora no meu coração, quem me faz sentir aquela culpa miudinha, é a Rose. Agora que a distância e o ciúme já não me toldam a cabeça, percebo o quanto fui injusta com ela. Sempre me tratou como uma filha, sempre me acolheu com um abraço e um sorriso, e eu… eu só consegui f
SAVANNAHO Ryder está sentado à minha frente, mas parece distante, com um receio que raramente lhe vejo. O meu coração bate tão forte que quase o sinto na garganta. Tento preparar-me para o pior — será que ele decidiu que já não quer estar comigo? Não o culparia, tenho agido como uma criança ultimamente, deixei o orgulho e o ciúme tomarem conta de mim.Ele inspira fundo, olha-me nos olhos.— Savannah, se é para sermos sinceros, eu vou fazer de tudo para que confies em mim.Assinto, tentando mostrar-lhe que estou pronta para ouvir, mesmo que não esteja.Ele começa devagar, como se pesasse cada palavra.— Ontem, depois de sair daqui, a Andie ligou-me. O carro dela avariou no meio da estrada e pediu-me ajuda. Fui buscá-la. Depois ela convidou-me para jantar em casa dela, como forma de agradecimento, e eu aceitei.Fico imóvel, a tentar controlar a expressão. Ele continua, sem me dar tempo para reagir.— Entretanto, a mãe dela ligou. Disse que o pai da Andie tinha tido um enfarte. — Sinto
SAVANNAH O caminho até ao rancho faz-se mais rápido do que esperava. No carro, o ambiente é surpreendentemente leve. A música animada do rádio serve de pano de fundo para as histórias que Ryder me conta sobre os dias em que estive ausente. Rio-me das peripécias dos irmãos Sawyer, das tentativas falhadas de Hunter de cozinhar, das discussões entre Landon e Isaiah sobre quem trabalha mais. Sinto o peito a aliviar-se, como se cada gargalhada me devolvesse um bocadinho daquilo que deixei para trás.Quando dou por mim, já estamos a entrar na estrada de terra batida que leva à casa principal. O tempo passou a voar aqui dentro do carro, mas agora que vejo o rancho à minha frente, um nervoso miudinho instala-se na minha barriga. Aperto a caixa da torta de cereja com mais força do que devia. Sei que tenho de falar com Rose e, apesar de saber que é o certo, o medo de não ser perdoada pesa-me.Ryder estaciona o carro mesmo em frente à varanda. Fico sentada, a olhar para a casa, a tentar ganhar