Naquela noite, Isabela dormia profundamente nos braços de Lorenzo, como se o encontro com Rafael tivesse sido apenas um pesadelo passageiro. Mas Lorenzo… ele não dormia. Os olhos fixos no teto, o maxilar travado, o coração ainda batendo como um tambor de guerra.
A imagem do rosto cínico de Rafael, da forma como ele falou com Isabela, da audácia de reaparecer na vida dela como se ainda tivesse algum direito… tudo isso o corroía por dentro.
Ele deslizou devagar para fora da cama, vestiu-se em silêncio e saiu do apartamento sem fazer barulho.
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Lorenzo sabia onde encontrar Rafael. Ele havia vasculhado os dados do hotel onde o grupo da feira estava hospedado no centro de Londres. Bastaram duas mensagens para contatos antigos — pessoas que deviam favores a ele dos tempos em que seu nome ainda causava medo nas ruas de Milão.
Às duas da manhã, ele estava parado do outro lado da rua, em frente ao hotel. O capuz do casaco escondia seu rosto, mas os olhos, sombrios, observavam cada movimento.
Quando Rafael saiu sozinho para fumar do lado de fora, Lorenzo atravessou a rua como uma sombra.
— Rafael.
O ex se virou devagar, franzindo o cenho ao reconhecê-lo.
— Você de novo? Cara, vai me seguir agora?
Lorenzo se aproximou lentamente, como um predador. Parou a poucos centímetros.
— Você teve a ousadia de falar com ela. De encostar nela. De humilhar a mulher que eu amo. E acha que vai sair de Londres como se nada tivesse acontecido?
Rafael bufou.
— Tá brincando comigo? Isso é ameaça?
— É aviso.
— Você não é polícia. Não é marido. Nem parente. Não tem direito nenhum…
O soco veio rápido, preciso. Rafael não teve tempo de se defender. Caiu no chão, cuspindo sangue.
— Eu não preciso ter “direito”. Eu tenho poder. E agora você vai escutar.
Lorenzo se abaixou, segurando a camisa do ex com força, os olhos em chamas.
— No meu mundo, homens que desrespeitam mulheres pagam caro. Homens que voltam do passado pra causar dor, desaparecem. Você teve sorte hoje.
— Você… você é louco!
— Louco por ela. E perigoso pra quem tentar tocar nela de novo.
Rafael tentou se soltar, mas Lorenzo o empurrou contra a parede do beco atrás do hotel. O cheiro de lixo e fumaça misturava-se à tensão do momento.
— Se você voltar a aparecer perto dela, eu vou fazer questão de quebrar mais do que seu orgulho. Entendeu?
— Tá bom! Tá bom! Nunca mais! — Rafael gritava, agora apavorado.
Lorenzo se afastou devagar, limpando a mão com um lenço do bolso. Não havia pressa. Sua mensagem estava clara.
— Volte pro Brasil. E esqueça que ela existe.
Sem dizer mais uma palavra, ele virou de costas e sumiu na escuridão da madrugada, como se nunca tivesse estado ali.
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Quando voltou para casa, já passava das quatro da manhã. Isabela ainda dormia, os cabelos espalhados sobre o travesseiro, o rosto sereno. Lorenzo ficou olhando para ela por longos minutos, sentindo o peso do que havia feito… e a certeza de que faria tudo outra vez, se necessário.
Ela merecia paz. E ele faria qualquer coisa para protegê-la, mesmo que isso significasse encarar seus próprios fantasmas e recorrer ao lado que ele tanto tentava enterrar.
Deitou-se ao lado dela com cuidado, puxando-a para mais perto. Isabela murmurou algo sonolenta, se aninhando em seu peito.
— Você demorou pra deitar… — disse, com a voz rouca de sono.
— Fui caminhar um pouco. Precisava pensar — ele respondeu, acariciando seus cabelos.
— Tudo bem?
— Agora está.
Ela fechou os olhos novamente, e Lorenzo ficou ali, em silêncio, ouvindo o som da respiração dela, sentindo o coração mais calmo. Rafael tinha ido embora. E com ele, uma parte do passado que tentava ameaçar o presente deles.