Assim que fechei a porta do meu quarto, senti o líquido quente e amargo das lágrimas escaparem dos meus olhos e correrem por meu rosto. Se existe algo difícil na vida, com certeza é ser forte quando está se sentindo fraca.
Fui até a penteadeira e enquanto arrumava meu cabelo, minha maquiagem era desfeita pelas lágrimas. Quando consegui estanca-las, terminei de limpar a maquiagem e troquei o vestido preto por um um pijama de cetim. Fui até a varanda observar novamente o céu noturno antes de me deitar, de alguma forma sentia certa paz ao olhar para a imensidão do céu e imaginar que talvez, em algum lugar no universo, existe outra Amélie vivendo a felicidade que eu desejava sentir. Me deitei e quando estava perto de cair no sono, escutei um barulho vindo da janela. Olhei assustada para o local e não vi nada, mas o som estridente de algo se chocando no vidro voltou e com certo medo me levantei e fui até a janela abrindo-a. Rapidamente avistei Marcos, ele acenou para mim com um enorme sorriso no rosto. Que cara louco! Peguei um robe de mangas longas antes de sair do quarto. Desci as escadas com cuidado e abri a porta que levava ao jardim. — Marcos! O que está fazendo aqui? — perguntei sussurrando. Ele colocou uma mão na nuca envergonhado. — Eu vim te ver. — Como me encontrou? Nunca te disse onde eu estava hospedada. — cruzei os braços e franzi o cenho. — Sinceramente, não foi nada difícil, você disse que seu pai estava doente e as notícias por aqui correm rápido. — suspirei. — E você pretendia jogar pedras a noite toda se eu não estivesse acordada? — arqueei as sobrancelhas. — Não princesa... jogaria só até você me atender ou alguém me expulsar. — eu ri. — Ok, vamos sair daqui, as pessoas podem acordar e nos ver. — falei o guiando até o caminho que leva a vila. Só então pude reparar nele, usava uma camisa simples de mangas compridas e uma bermuda. Tinha o mesmo sorriso alegre de mais cedo e estava num ótimo humor, diferente de mim. — Então... o que está acontecendo para você estar com essa cara? — Eu estou normal. — Vai ter que fazer melhor do que isso para me convencer. — É que... — eu não queria contar a ele sobre o noivado. — com a doença do meu pai muita coisa mudou e vai mudar, as vezes sinto que não vou dar conta. — Tenho certeza que vai, você é uma mulher incrível. Sorri. — Marcos, sabe que nos conhecemos há algumas horas, não é? — Sei, mas não preciso te conhecer há anos para saber que você é incrível. — ele olhou para o mar a nossa frente pensativo. — As vezes precisamos parar e analisar o que temos de bom e mesmo sendo pouco, tentar ser feliz com aquilo. Nem sempre basta, mas é bom ter algo a que se agarrar quando as tempestades da vida balançam nosso barco. Entende? — Sim... Tem razão. — de repente me veio a mente uma preocupação. — Marcos, por que, realmente, você veio até aqui? — Pensei que você precisava de companhia. — seu rosto estava sereno e ele sorria. — Você estava triste mais cedo e eu sabia que não passaria logo, queria te alegrar, sei que você terá mudanças pela frente e quero ser uma parte feliz da sua vida, uma lembrança boa. — Só uma lembrança boa? — uma leve brisa bagunçou o cabelo dele e senti uma coceira no pé da barriga ao vê-lo daquele jeito. — Você vai embora, Amélie. Vai seguir a sua vida na cidade e eu vou continuar aqui. — não podia discordar, minha vida e todas as minhas obrigações estavam em São Paulo e eu teria que voltar para lá, assim como teria que me casar com Ettore. Não sabia o que dizer a Marcos e o silêncio se instaurou, apenas o som das ondas e do vento eram audíveis naquele momento. — Então... aceita criar boas memórias comigo, aqui em Noronha? — Eu já estou criando. — sorri. — Obrigada. Conversamos por mais alguns minutos e fomos vencidos pelo sono e frio que fazia naquela noite. Marcos me esperou entrar e me despedir dele pela varanda do meu quarto, antes de sumir na escuridão da noite. Sorri ao recapitular os momentos recentes com Marcos, fiquei impressionada com sua capacidade de me fazer esquecer todos os problemas. Talvez eu pudesse tratar o noivado apenas como negócios e me divertir um pouco. Pensei também em Ettore e em como me senti perto dele. Era um homem poderoso e sua presença mesmo que apoiado em uma bengala causava arrepios em quem quer que estivesse perto. Aquele era meu futuro marido e tinha certeza que seria totalmente diferente de um casamento comum, não o amava, sequer o conhecia e ele também não fazia questão de ter sentimentos por mim. Se não fosse pelo acordo feito pelo meu pai, talvez eu e Ettore nunca nos escontraríamos.