Deixar a casa do meu pai para ir viver com a minha mãe, nunca, jamais havia passado pela minha cabeça nesses 8 anos dos quais não vi ela. Até porque quem decidiu acabar com a família foi ela, quando traiu meu pai sabe se lá quantas vezes. Mas enfim, aqui estou eu, na porta da casa dela ao seu lado para uma nova etapa da vida, depois de não aguentar mais o maltrato da nova mulher do meu pai.
Ainda é esquisito ver ela, a que se diz minha mãe. Continua bonita, mas diferente. Sempre tivemos o cabelo tão preto quanto à noite, porém agora seus cabelos tem um tom de loiro que faz destacar ainda mais suas sobrancelhas escuras. - Você vai gostar dele, ele é bem tranquilo, acho que vocês vão se dar bem! - ela dizia empolgada sobre algo que não escutei bem enquanto abria a porta. Assim que ela abriu a porta eu dei uma olhada curiosa para ver em que tipo de lugar ela vive, já que nos deixou por um homem rico e realmente a casa é incrível. Tudo nesse lugar grita: valho muito, e isso só me fazia sentir mais inferior ainda. - Onde será que estão eles? - perguntou ela abrindo a casa e olhando ao redor. - Eles quem? - pergunto também olhando ao redor. - Meu marido e seu novo irmão! Eu estava te contando sobre ele, não prestou atenção? - ela se vira para mim me encarando de verdade pela primeira vez desde que nos vimos. “Novo irmão”. Aquele que eu nunca pedi para ter. Tenho que fingir empolgação? - Me sinto cansada, não posso ir para meu quarto e dormir? Já está tarde. - falei empurrando para dentro da casa minha única mala de roupas. Ela faz um olhar de como vê um animal ferido. - Coitadinha! Deve estar cansada mesmo, vem que eu te mostro seu quarto. Ao subir as escadas seguindo seus passos, noto vários quadros um seguido do outro mostrando uma família perfeita, a deles. Minha mãe abraçada ou com seu marido, um homem alto, forte, loiro dos olhos verdes e de tamanha elegância que quase entendo o motivo de partir de casa; ou com seu “filho”, um garoto de mais ou menos 10 anos, com um sorriso angelical e um rosto fofo, em todas as fotos, sorrisos tão felizes que parecia mentira. “Será assim tão verdade essa felicidade toda deles?”, me pergunto com inveja. - Aqui está, arrumei ele todinho só para você, querida! O que você acha? - ela se move para dentro do quarto me dando espaço para entrar. Ok, o quarto é realmente perfeito. Perfeito demais eu diria até. Tudo branco com detalhes de madeira, ela sabe que odeio rosa, mas ainda assim alguns ursos de pelúcia na cama que gostei. Uma cama de casal, apesar de eu não ver necessidade nisso. Uma escrivaninha para estudar e uma enorme porta que dá acesso a uma sacada. Na verdade, esse foi o fato que mais amei, sinto que daria para ver bons tons de entardecer daqui. Sorri sem pensar. - Você gostou, né? Da para ver na sua cara que gostou. - ela me olha esperançosa pela minha resposta. - Gostei! - lhe respondo. Ainda que eu sinta uma distância enorme entre nós duas, antes de tudo, ela era uma boa mãe e talvez ainda seja. Escutamos uma porta se abrir e uns ruídos de algum jogo saindo do quarto ao lado. Rapidamente minha mãe grita um nome: - Pedro!! - diz ela me assustando pelo grito tão repentino. - Pedro, vem conhecer sua nova irmã. Não é como se eu tivesse muito interessada em saber quem é ele, mas de certa forma me virei para a porta curiosa. “Será que ela vai querer me tratar como a babá dele?” Me surpreendendo mais que tudo, aparece no quarto um jovem da minha idade, talvez, mas não o garoto que vi nos quadros. Quer dizer, sim é o mesmo garoto, entretanto, com alguns anos a mais. Nossos olhos se encontram e ele parece me analizar inteira, abaixo a cabeça com vergonha. “Espera aí, por que fiquei com vergonha?!” Pergunto a mim mesma sem entender e volto a olhar para ele, que sorri com o canto da boca. - Então essa é a famosa Sophie? - pergunta ele entrando cada vez mais no quarto, me olhando sem desviar uma vez sequer. - Sophia. - corrijo ele. Ele ri. Minha mãe parece ficar aliviada, imaginando que nós dois vamos nos dar bem. Ela segura a mão dele e com sua outra mão segura a minha. - Eu espero do fundo do meu coração que vocês se deem bem. Vocês dois são os bens mais preciosos que possuo. - e então ela coloca minha mão sobre a dele. - Agora vou ir fazer a janta para vocês. Que tal vocês se conhecerem melhor? E falando isso ela começa a sair do quarto. Olho de volta para ele que agora sorria ainda mais, parecendo se divertir com a situação. - Como deveríamos nos conhecer melhor, querida irmãzinha? - pergunta ele ainda segurando minha mão. Tento soltar, mas ele segura mais forte. - Não é como se eu fosse deixar você viver aqui de graça. Algo vou ter que receber em troca, não acha?Eu nunca tive realmente medo de algo, mas comecei a ficar meio ansiosa por ver Pedro em todo lugar da casa, nos corredores, na sala, na cozinha, onde eu estivesse, parecia que ele estava lá. O jeito que ele me olhava fazia todos os meus pelos do braço se arrepiarem, como se algo dentro de mim me avisasse que eu deveria me proteger, que algo ruim aconteceria. Seus olhos pareciam querer desnudar até a minha alma, ele analisa sempre tudo que faço, tudo que falo e até como me movo. O que significa isso? Que ele me ache uma intrusa tão insuportável assim? Ou algo a mais? As vezes ele me faz pensar até que ele me deseja, já que me olha tanto, mas por outro lado, como me olha parece que sou simplesmente um nada, um inseto insignificante andando perto dele e o incomodando com minha presença. Os dois casos, me causa náusea. Sua presença também é um incômodo para mim. “Espero que o fim de semana passe rápido” pensei comigo suspirando pela milionésima vez ao ver ele pela casa. Fui para o ú
Finalmente chegou o dia de conhecer minha nova escola e eu parecia um caco de tão cansada. Não consegui dormir, mesmo trancando a porta o medo se apoderou de mim e cada segundo naquela casa pareciam horas. Mas enfim, aqui estou eu prestes a conhecer o lugar onde vou estudar e minha mãe estar ao meu lado me deixa um pouco menos ansiosa. - Ah Sophy, essa escola é a melhor, você sempre foi inteligente, vai amar esse lugar. - Não sabia ou não me lembrava que minha mãe é uma pessoa assim, tão positiva. Depois de longas conversas com o diretor sobre como funciona a escola e sobre como eu teria que me esforçar para me encaixar nos padrões elevados daqui, finalmente pude ir a minha sala e me apresentar. A professora sorriu como quem queria me encorajar, mas ter que ficar enfrente a umas 25 pessoas, não é tão encorajador assim. - Bom dia! Me chamo Sophia, tenho 16 anos e… - olhei para ela como quem se pergunta o que devo dizer, ela apenas sorriu um pouco mais. Voltei a olhar para a turma
Sinto meu rosto queimar de tanta vergonha, mas se tem uma coisa em que eu sou boa, isso é improvisar. - Você está sujo de caneta aqui. - menti, apontando para perto da minha boca, o fazendo automaticamente passar sua mão no lugar que eu indiquei, porém em seu rosto, tentando se limpar. Vejo suas bochechas se corarem levemente contra sua pele parda, o que o faz parecer até meio fofo. Solto um riso baixo sem querer. Ele me olha atônito. - O que te causa tanta graça? - ele perguntou se recompondo. - Você! - falei sem hesitar e sorri ainda mais. Rafael fica sem palavras, surpreso pela minha resposta inimaginável. E eu gosto disso. Ele continua me olhando fixamente nos olhos. “ O que será que ele está pensando?” Esse tipo de pensamento brota em minha cabeça, porém ele é um livro difícil de ler. Ao contrário dele, imagino que eu seja um livro aberto que ele consegue entender perfeitamente. Nunca fui do tipo misteriosa. - Posso te dar uma foto minha se você quiser! - digo a ele o fa
Ela me fuzila com o olhar. - Por um acaso você está falando de mim?! - seu tom fica mais alto e estridente. - Ué! Se a carapuça serviu…. Pedro ri alto, fazendo tanto eu quanto ela se virar em sua direção. - Agora entendo a preocupação da sua mãe, irmãzinha. - diz ele sem desviar o olhar da estrada. - Você parece ser horrível fazendo amizade. Reviro os olhos e me acalmo um pouco, mas logo respondo: - É que eu escolho bem minhas amizades. - Cruzei os braços e evitei olhar para ela. “É melhor ter qualidade do que quantidade, mas acho que essas pessoas populares não entendem muito isso.” Pensei. A garota bufou ao meu lado. - Não é como se eu fosse ser sua amiga mesmo. - ela passou a mão em seus ombros, deslizando suas mechas loiras para trás. - E eu nem quero. - respondi, espelhando seus movimentos. Me viro para a janela do carro e sinto um olhar sobre mim. É Rafael me olhando pelo retrovisor externo do carro. Nossos olhos se encontraram, mas logo ele desvio
Virou certo costume Pedro me levar juntos com seus amigos a escola. O que me fazia ficar irritada logo cedo e quem não ficaria ao ver uma garota com cara de emburrada para mim sempre que nós vemos e Pedro com as provocações dele sempre que está sozinho comigo. Aliás, descobri que ela se chama Anna. Um nome tão bonito, para uma pessoa tão bonita, mas tão megera como ela. Acho que não combina. Rafael trocava algumas palavras comigo durante a aula apenas, mas não quando estávamos com eles. A sala está tão silenciosa que o único ruído que se escuta é o ranger do giz de cera no quadro negro. Com pouco tempo aqui, percebi que o professor de história adora escrever e ele escreve e escreve e não para mais. A mão chega a doer. Em um momento impulsivo bato minha cabeça no livro em cima da minha mesa como forma de tentar me acordar. “Mas um minuto dessa tortura e eu durmo!” Pensei, ainda com a cabeça sobre os livros. Escuto uma risada baixa ao meu lado e me viro em sua direção. É
“Me sinto culpado em querer saber” essa frase deu voltas e voltas o dia todo pela minha cabeça, me deixando confusa. Só o vi por 5 dias e já sinto coisas que nunca senti antes, nem sei explicar o que é, mas de certa forma me sinto culpada também. - Por que ele tem que ter namorada? - me pergunto atirando um urso de pelúcia no teto e ao cair, o uso para tapar minha boca e solto um grito que estava entalado em minha garganta. Sempre odiei pessoas que traem ou que sabendo que o outro namora, o faz trair. Para mim, ambos são igualmente culpados, sujos e desprezíveis. Então não consigo entender porque Rafael me chama tanta atenção assim. Eu nem mesmo aceitava ser amiga de homens que namoram, então por que sinto tanta vontade de estar perto dele? Deslizo meus braços pela cama de casal do meu quarto, enquanto encaro fixamente o teto imaginando o rosto do meu vizinho de mesa. - Como posso descrever o que sinto? - me pergunto a mim mesma ainda olhando para o teto. De alguma for
Me desperto novamente me sentindo mais descansada e ainda sem abrir os olhos, deslizo minhas mãos pela minha cama. Me lembro de Pedro dormindo ao meu lado e abro meus olhos rapidamente o procurando, mas ele já não está mais aqui. Respiro aliviada, apesar de um pouco surpresa. Olho ao meu redor procurando algo que ele possa ter deixado, mas não há nada. Nenhuma carta. Nenhuma mensagem. Nada. Me estiro na cama e faço o que sei fazer de melhor. Olhar para o nada e pensar em tudo. Observo meu teto enquanto pensamentos sobre meus antigos amigos surgem em minha cabeça. “O que será que eles estão fazendo agora?” Penso e logo desvio o olhar para a porta que dá a sacada, observando o dia lindo que parece estar lá fora. Quase todo sábado meus amigos e eu costumávamos ir de bicicleta até a cachoeira da cidade. As vezes ela estava cheia de pessoas e as vezes era só nós e mais algum outro grupo. “Será que eles estão lá? O dia está perfeito para algo assim!” Assim que o pensamento desapar
Pedro aproveitou que mais uma vez os adultos da casa estarão fora e chamou seus amigos para uma resenha. Os três estão na piscina aproveitando o calor da água durante a noite. Rindo, se divertindo, como parecem fazer sempre. Os observo da sacada sem ser vista. A dinâmica entre eles é de certa forma interessante. “Como pode Pedro ter tanta química com a namorada do seu melhor amigo? Eu consigo notar daqui, será que Rafael não vê isso?” penso analisando eles. Rafael está sentado na beira da piscina com uma lata de cerveja na mão, enquanto Anna e Pedro brincam um com o outro no meio dela. Ela tem um corpo de dar inveja. Barriga sequinha, muito peito e muita bunda, apesar do tamanho diminuto. - Por acaso seria eu a vilã da história? - pergunto a mim mesma ao imaginar como o mundo é injusto. Apesar de ser alta, eu não sou corpuda. Ao que parece eu cresci para cima, mas meus peitos e minha bunda esqueceram que também deveriam crescer. - Pelo menos eu tenho uma bela cintura! - elogio