Ponto de vista de Serena
O ar parecia mais pesado quando desci do carro. Meu peito apertava e meu coração batia tão forte que eu podia jurar que qualquer um ao meu redor escutaria. Anos. Anos ouvindo falar sobre Máximo Giuseppe Ferraro Bianchi. Sobre como ele seria meu marido. Sobre como, um dia, nosso destino se cruzaria… Mas nada, absolutamente nada, me preparou para o impacto de vê-lo novamente. Ele estava ali. Alto, imponente, com aquele terno alinhado que parecia ter sido desenhado para seu corpo. O cabelo perfeitamente penteado no corte italiano, os olhos de um azul tão profundo que pareciam capazes de despir minha alma. Bonito não era suficiente para descrevê-lo. Ele era um pecado vestido de homem. Um perigo irresistível. E, ainda assim, sua frieza cortava mais que qualquer lâmina. Quando nossos olhares se cruzaram, algo acendeu dentro de mim. Um fogo que queimava em lugares que eu nem sabia que existiam. Meus dedos tremeram, meu corpo inteiro respondeu à presença dele, como se minha própria pele clamasse pela dele. Como se, de alguma forma cruel, meu corpo soubesse que aquele homem seria meu… mesmo que ele não quisesse. Mas ele não quis. Cada segundo daquele jantar parecia um castigo. Eu, sentada ao lado dele, querendo encontrar uma brecha, um olhar, qualquer resquício de humanidade… Mas tudo o que recebi foi ignorância, indiferença e um silêncio ensurdecedor. Nem um sorriso. Nem uma pergunta. Nem sequer um “como você está”. E, se isso não fosse suficiente para me despedaçar, Isabella Moretti fez questão de esmagar qualquer esperança que eu ousasse nutrir. As palavras dela ainda ecoavam na minha cabeça, como marteladas constantes: “Ele me ama, Serena. Eu sou dona de todas as primeiras vezes dele. Aproveite o meu resto.” Por alguns minutos, eu me senti pequena. Insignificante. Um acessório na vida de um homem que jamais me olharia como mulher, como parceira, como algo além de um contrato. A garganta fechava. Eu me recusei a chorar ali, mas a vontade estava ali, apertando, sufocando. Em meio às conversas e cumprimentos, senti uma mão suave pousar sobre meu ombro. Ao me virar, encontrei aqueles olhos verdes tão gentis quanto firmes. Rafaella Ferraro Bianchi, mãe de Máximo. Linda, elegante, dona de uma presença que se impunha mesmo sem esforço. — “Posso falar com você, Serena?” — perguntou, com um sorriso sereno, porém cheio de intenções ocultas que toda mulher da máfia sabia ler. Assenti de imediato, a seguindo até um canto mais reservado do salão. Ela segurou minhas mãos, com um olhar que misturava ternura e força. — “Quero que você não se assuste com a frieza de Máximo, querida.” — começou, passando os polegares sobre minhas mãos. — “Eu sei… eu vejo como está sendo difícil pra você essa noite. E, acredite, também está sendo para ele.” Engoli seco, sentindo os olhos marejarem, mas me mantive firme. — “Ele... Ele me olha como se eu fosse um peso. Como se não me quisesse nem por perto.” — minha voz saiu baixa, quase um sussurro, cheia daquela dor que eu tentei esconder o tempo inteiro. Rafaella apertou levemente minhas mãos, oferecendo um sorriso maternal. — “Máximo... meu filho... ele é intenso. Ama com tudo que tem, odeia com a mesma força... Mas ele é um rapaz amoroso, Serena. Tem um coração enorme, mesmo que agora esteja sufocado pela mágoa e pelo medo de abrir espaço para o novo.” Ela respirou fundo e, olhando nos meus olhos, disse com a firmeza de uma mulher que viveu todas as dores e amores que a vida na máfia poderia proporcionar: — “Não desista dele. Seja paciente. Seja forte. E, principalmente, seja persistente. Máximo cresceu rodeado de amor. O amor é um pilar na nossa família, Serena. Mas, às vezes, quem ama muito também se fecha com medo de sofrer.” Uma lágrima teimosa escorreu, e ela a enxugou antes que eu mesma pudesse. — “Ele não vai te facilitar, eu sei disso. Mas, se você conseguir alcançar o coração dele... Serena, meu amor, não há homem no mundo que ame mais profundamente do que meu filho. E eu te prometo… vale a pena.” Aquelas palavras me apertaram o peito, mas ao mesmo tempo reacenderam algo dentro de mim. Talvez esperança, talvez desafio. Sorri fraco, meio trêmula. — “Eu... eu vou tentar, senhora...” Ela apertou minhas mãos uma última vez, com aquele olhar de quem sabia exatamente o que dizia. — “Chame-me de Rafaella, querida. E saiba que você não está sozinha nisso.” Enquanto ela se afastava, me deixando ali, percebi que aquela mulher não era só mãe de Máximo. Ela era uma verdadeira rainha. E talvez, só talvez... eu também pudesse aprender a ser. Como um sopro de alívio no meio daquela tempestade, ela apareceu. Giullia. A irmã de Máximo me abraçou como se já fossemos amigas de longa data. Seus olhos eram gentis, e seu sorriso, honesto, acolhedor. — “Não liga pra Isabella, Serena...” — ela disse apertando minhas mãos. — “Ela foi um capítulo longo na história do meu irmão, sim. Mas foi isso, um capítulo. Ela não suporta ter ficado por baixo. Por isso te afrontou daquela maneira. Porque, aqui entre nós...” — seu sorriso se abriu cúmplice — “ela sabe que você pode se tornar algo que ela nunca foi: a mulher da vida dele.” Aquelas palavras aqueceram meu peito de uma forma que nem eu sabia explicar. Pela primeira vez naquela noite, me senti vista. Me senti, talvez, acolhida. Giullia segurou minhas mãos, apertando de leve. — “E se depender de mim, você não vai estar sozinha aqui. Nós vamos ser melhores amigas.” Sorri. Pela primeira vez naquela noite, sorri de verdade. O jantar seguiu frio, desconfortável. Máximo sequer tentou fingir gentileza, e aquilo ainda me machucava. Mas dentro de mim, algo começava a mudar. Eu não era frágil. Não seria só uma peça descartável nesse jogo. Se esse era meu destino, eu faria dele meu reino. A troca de alianças era algo que eu idealizava na minha mente romântica e sonhadora como um momento inigualável, como o Marco do início do resto das nossas vidas e foi totalmente insignificante. Ele apenas colocou a aliança de compromisso em meu dedo, fez o juramento em nome da máfia devido ao acordo e saiu como se eu não existisse, como se fosse invisível. E, no fundo, enquanto encarava aquele homem que queimava dentro de mim mesmo me rejeitando, eu só conseguia pensar numa única coisa: Você vai me odiar, Máximo. Mas, um dia, vai me desejar mais do que deseja respirar e quando esse dia chegar, vai implorar pela minha atenção.