CRESCE O INTERESSE

Segunda-feira não foi exatamente um dia empolgante. Não só porque era segunda-feira, mas sim porque eu estava passando por toda essa bagunça de término de namoro, frustração sexual e um interesse improvável surgindo.  

Eu queria só ser capaz de ficar um dia de folga e por mais que eu desejasse inventar alguma desculpa para meu pai, não ia conseguir ficar em paz de manhã já que a porcaria do Rafael só saía para a faculdade depois das dez horas e estava fazendo barulho como um descontrolado.  

— Droga, Rafael, você pode parar de ficar saltando que nem um canguru pelo corredor? — gritei com ele quando me levantei, irritada.  

Só ouvi as risadas dele e de Lucas, que por sinal, tinha sido extremamente legal comigo de madrugada, e ficado na minha cabeça mais do que deveria.  

 

Depois que eu fui para a cozinha, já arrumada com o meu uniforme escolar — calça jeans, a camisa branca com o nome da escola e um tênis —, decidi que ia agir de acordo com o que estava sentindo: com completa indiferença. Por um lado, era um alívio não ser aquela garota que sofre horrores por um namoro de colegial e passam a noite chorando e sofrendo, mas por outro lado, eu me arrependia profundamente de ter gastado a energia nessa relação.  

— E aí, maninha, faça um favor e coloca minha roupa suja pra lavar. — Rafael jogou um grande saco em minha direção, do qual me desvio.  

— Coloca você a sua roupa imunda pra lavar — falei em um tom que misturava sarcasmo, irritação e nojo.  

— Por que acordou de mau humor? Seu namoradinho não está dando conta de mimar você? — ele questionou com um tom de ironia.  Na mesma hora eu, sem pensar em discrição. Lancei um olhar incriminador para Lucas, o culpando por ficar falando da minha vida com meu irmão. Mas a ideia desapareceu da minha mente no

momento em que ele me respondeu com um olhar bem sugestivo, de que não disse nada.  

E provavelmente era verdade. Rafael nunca falaria comigo em tom de ironia sobre meu namorado não dar conta do meu desejo sexual.   

— Pelo menos eu tenho um namorado — respondi baixo o alfinetando de forma sutil.  

Rafael deu risada. De um jeito bem descontrolado. Arrisquei dizer que foi forçado e que soou um pouco desesperado.  

— Eu tenho exatamente a garota que eu quiser na minha mão. — Eu e Lucas começamos a rir juntos. — Do que estão rindo?  

— Da pancada que você levou na cabeça quando era pequeno. Deve ser por isso que você não sabe diferenciar realidade de sonho — falei enquanto servia o meu café da manhã.  

— Eu posso falar o nome de mil meninas que adorariam sair comigo. — Virei meus olhos enquanto ele se gabava. 

— Você nem sabe contar até mil, Rafa — desdenhei.  

– Ok. Posso falar o nome de uma. Está vindo para cá agora. 

— Quem é? — perguntei intrigada, deixando o tom de brincadeira e sarcasmo de lado. Rafa nunca levava meninas para casa. 

— Sua amiga, Camila — ele disse com certo desprezo na voz.  

— Camila gosta de qualquer idiota que vê pela frente, então não vale — eu disse indo na dispensa pegar alguma bolacha para acompanhar com a vitamina.  

— Então você gosta de uma colegial? — Lucas perguntou brincando com Rafael.  

— Elas de uniforme me excitam. — Ouvi Rafael da dispensa e virei meus olhos para o seu tom pervertido que me deu um pouco de repulsa.  

— Sua irmã está de uniforme — ele observou, o que me deixa bem intrigada.  

— Cuidado — Rafael respondeu prontamente de forma protetora.  

Sorri sem pensar no lado ruim de Rafa ser assim.   

Quando entrei na cozinha Lucas estava rindo de uma forma defensiva e sussurrou algo como “brincadeira, cara.” 

Não demorou muito e Camila entrou pela porta com um sorriso estonteante e eu me empolguei em finalmente poder contar sobre o desastre da minha vida sexual para alguém que eu confiava de verdade.  

 

— Bom dia para os meninos mais bonitos da cidade. — Olhei para ela com reprovação. — Só gosto de dizer a verdade — concluiu em resposta para o meu olhar. 

— Seu dia de sorte. Rafael aparentemente gosta de colegiais. — Os dois engasgaram na mesma hora por perceberem que eu estava ouvindo. Sorri para ambos e depois para Camila.  

Enquanto buscava a minha bolsa, repassei na minha cabeça o discurso que eu vou fazer para Camila sobre como o Igor era irrelevante na minha vida. E depois desabafar sobre como estou com um pouco de medo de ele sair espalhando o pouco que fizemos.  

Quando desci, Rafa estava constrangido em manter o papo com a Camila e Lucas estava segurando a risada.  

— Vamos, Ca, depois te passo o número dele — falei brincando.  

— Muito engraçada — Rafael disse desanimado.  

Dei as costas e quando pegamos o elevador Camila perguntou:  

— E aí? Como foi seu encontro com seu namorado?  

— Que namorado? — perguntei em tom drástico.  

Camila mudou sua expressão na hora, ela entendeu parte do que aconteceu apenas com essa frase.  

 

*** 

 

Camila me encarava sem expressão nenhuma em seu rosto. Eu não sabia exatamente o que significava ela me encarar tanto tempo, mas sabia que estava me incomodando. Contei para ela todos os detalhes do momento que eu cheguei à casa de Igor até eu virar as

costas, e até esse ponto da história, ela estava sendo bem participativa, mas aí eu decidi revelar meus sentimentos e dizer que não fazia diferença nenhuma, porque no fundo eu só queria transar, como ela sempre afirmava e então, ela só começou a me encarar.  

— Eu te avisei, não te avisei? — ela perguntou em tom de reprovação depois de ficar quieta por vários minutos.  

— Se fosse pra falar isso, era melhor se continuasse quieta. — Dei de ombros.  

— Bom, não é como se ninguém tivesse avisado que você estava perdendo seu tempo com ele — falou em um tom de reprovação pior que o primeiro. — Você tem ideia de quanto estresse esse seu namoro me fez passar enquanto nós duas poderíamos estar juntas, curtindo? — Ela me olhou como se realmente tivesse magoada comigo por ter namorado Igor. E não podia negar que eu estava um pouco magoada comigo também.  

— Sabe, antes de toda essa história, a gente chegou a discutir um pouco sobre você — comentei sem compromisso.  

— Por que sobre mim? — perguntou curiosa.  

— Porque ele não gostava muito de você… Você não gostava muito dele… — eu disse fazendo gestos para desenhar o óbvio.  

— Aquele cretino egoísta e pervertido não tem nenhum motivo para não gostar de mim, já eu, Camila Montenegro, tenho até uma lista…  

— Eu sei… — Tentei interromper seus argumentos.  

— Não, sério, Gisele. Eu tenho uma lista em ordem alfabética — ela comentou com precisão e eu a encarei levemente assustada.  

— Não precisa falar pra mim, Ca. Ele não é nada meu — comentei sem apego nenhum ao meu ex-namorado. — Só espero que ele não comente nada com ninguém…  

— Bom, se ele comentar… — Ela começou tranquila. — Nós capamos o filho da puta.  

Soltei uma risada muito alta.  

Deus, eu amo a Camila.  

 

Ao ouvir o sinal de entrada da escola, nós levantamos da calçada do outro lado da rua e entramos preparadas para encarar o dia juntas.  

 

*** 

 

Eu pude notar algumas pessoas olhando e cochichando enquanto eu passava algumas vezes, mas eu não me importava, porque se fosse um escândalo eu não iria ouvir cochichos e sim a história completa do que estão falando pelas minhas costas, porque ninguém ia fazer questão de ser discreto. Então por enquanto, Igor tinha mantido a boca fechada.  

— Em minha opinião você só se livrou. Não é por nada, mas Igor tinha uma carinha de ser fraquinho na cama — Juninho comentou no meio da aula de História e eu segurei a risada.  

— Será? Ele tem cara de quem sabe fazer algumas coisas… — Dei continuidade ao debate, olhando para Igor discretamente sentado na frente da sala de aula.  

— Talvez agora, porque você é inexperiente… Mas vamos aos fatos, Gisele, você pega fogo. A mangueira dele não conseguiria apagar tudo isso — ele comentou com desdém, olhando para Igor sem ser discreto.  

Abaixei a minha cabeça e comecei a rir baixinho, torcendo para ninguém perceber.  

Juninho era daqueles amigos que contagiavam com a sua alegria e sempre mostrava o lado bom da vida, mesmo quando tudo andava uma droga. Durante o ano inteiro, Juninho tinha sido perseguido por ser gay, e isso só piorou quando ele ficou com Kaio, que parece que nunca vai assumir sua homossexualidade. Para disfarçar quem ele era de verdade, Kaio era o que mais o perseguia e o submetia a várias humilhações em público, mas nem por isso, ele deixava de sorrir, contar uma piada ou enxergar a luz no fim do túnel. E isso era a coisa que eu mais amava nele. Depois que eu e Camila o conhecemos, nos apaixonamos por esse jeito.  Desde então, Kaio e os

meninos pararam de perturbá-lo de maneira tão descarada e todos conseguiram ver mais sobre o lado fantástico do meu amigo.  

— Agora você só tem que perder sua virgindade – Camila observa com calma. 

— Verdade, Camila. Eu andei pesquisando e acho que você pode pagar um garoto de programa pra me deflorar. Eu ia considerar meu presente de aniversário — sugerir séria.  

Camila e Juninho me encararam por alguns segundos.  

— Sério? Que site você viu?  — os dois me questionam ao mesmo tempo, em uma sincronia pervertida muito estranha.  

— Nenhum, bando de tarados. — Repreendi ambos. — Acho que vou ter que ser a Srta. Virgem por um tempo…  

— Isso porque quer… — Camila disse.  

— Não vou contratar um garoto de programa, Camila… — insisti em repreender e Juninho deu risada.  

— Tá, não contrate um. Mas eu já te dei uma solução para isso e você não quer enxergar — Camila comentou.  

No início eu não entendi sobre o que ela estava falando, mas depois de alguns olhares onde ela praticamente dizia que eu era estupidamente burra, eu me lembrei da sua teoria sobre Lucas e foi inevitável não virar os olhos.  

— O quê? — Juninho perguntou confuso. 

— Nada… — Dei de ombros.  

— Você acha que se a Gisele trepar com o Lucas, ele vai sair contanto por aí? — Camila perguntou em tom baixo e rápido. 

Juninho demorou a entender.  

— Lucas Belardino? O melhor amigo do seu irmão? — ele perguntou se virando pra mim.  

— Exatamente — eu disse para ele como se fosse uma discussão já vencida, mesmo que eu mesma tenha pensado sobre isso.  

— Óbvio que não! Ele conhece seu irmão mais do que você. Acha mesmo que ele vai contar “ei, estou comendo sua irmã”? Nunca! Oh, meu Deus, você vai transar com Lucas Belardino? Porque se for, Gisele, me dê um autógrafo — Juninho falou tão rápido, empolgado e sorridente que eu não tive certeza de como responder.  

— Eu não vou transar com o Lucas! — respondi o mais rápido que podia.  

— Sério? Porque parece que você estava pensando sobre a ideia… — Camila comentou sorrindo e apontando seu dedo indicador para meu rosto.  

— Não estava nada. — Dei um tapa no seu dedo e ela o abaixou rindo. — Talvez faça sentido… Talvez se um dia acontecesse, em uma dimensão paralela, ele não contaria nada… Mas como diabos vocês acham que isso ia acontecer nesse plano terrestre? As pessoas iam ver e iam comentar até cair no ouvido de Rafael e BUM. — Dei um tapa na carteira para causar um susto nos dois. — Todo o desastre que eu tenho medo ia acontecer de fato. Só que dessa vez ia ser pior, né, porque ele ia surtar comigo e com o melhor amigo.  

Parei de falar e encarei os dois que reprovaram a maneira como eu fiz cair por terra a teoria de que Lucas era o cara perfeito para mim. E eu não queria confessar, mas até eu fiquei decepcionada com o meu realismo.  

— Bom… Se você não vai tentar transar com ele, posso tentar transar com seu irmão? — Camila perguntou depois de um silêncio entre nós três.  

Olho para ela com repulsa e Juninho riu mais um pouco às nossas custas.  

— Tente o quanto quiser, duvido que ele vá dar uma chance sequer, Camilinha — Juninho disse sorrindo e passando a mão no ombro dela.  

— Obrigada — eu digo para ele em forma de agradecimento por não ser a única que enxergava o quanto Camila era patética quando se referia ao meu irmão.  

— Tudo bem para você não sonhar… — Ela me encarou e depois olhou para Juninho. — Mas eu sonho e eu geralmente luto pelo que quero…  

Virei meu olho e abaixei a cabeça na carteira de novo.  

— Deus… — Comecei a me lamentar.  

— Qual é, Gisele, ele é delicioso — Camila comentou.  

— Isso eu tenho que concordar. A melhor parte de ir para sua casa, é ver Rafael. — Os dois bateram suas mãos em um toque de quem concorda um com o outro.  

— Eca — comentei assim que levantei a minha cabeça.  

— Sério, Gisele, minha fantasia sexual é ter seu irmão e Lucas na minha cama. E já que aparentemente você não quer o Lucas, eu posso tentar — ela comentou como se fosse algo sério.  

— Apesar de que eu acho que você teria uma grande chance com Lucas — disse Juninho.  

— Por quê? — perguntei curiosa.  

— O cara tem um histórico nessa escola. Só saía com as meninas mais bonitas, e convenhamos, Gisele, você é um mulherão.  

— Verdade — concordei. — Mas não vou tentar nada.  

— O que você tem a perder? Seja discreta, você vê o cara todo dia! — Camila argumentou.  

Eu não sei como isso acabou em um tipo de reunião em como seria bom se eu transasse com o melhor amigo do meu irmão, mas estava começando a me incomodar um pouco.  

— O que eu tenho a perder? Tantas coisas que eu nem sei por onde começar. E outra… Ele é igual ao meu irmão!  

— O que significa que ele também é delicioso — Camila disse como se fosse óbvio.  

Fiz uma careta para ela.  

— É, a não ser que a Gi, curta um incesto. — Juninho começou a rir e Camila o acompanha.  

— Arghhhh — gemi demonstrando meu nojo eterno por esse pensamento.  

Olhei indignada para os dois, que não estavam se importando em rir às minhas custas. Desisti de conversar com eles e comecei a copiar um texto do quadro negro sobre Guerra Fria.  

 

*** 

 

Quando cheguei em casa, eu só fiquei feliz que consegui passar por essa segunda-feira sem que minha vida estivesse exposta

para todo mundo ver, ouvir, dar palpite, e claro, espalhasse para todos até parar em quem nunca deve ouvir nada sobre mim.  

Respirei aliviada. O primeiro dia sempre é pior. Se Igor não contou nada agora, não vai contar depois.  

— E aí! — Lucas chegou em casa pela porta da frente sem Rafael. — Tudo bem? — ele perguntou de uma forma atenciosa.  

— Honestamente… Tudo ótimo. — Sorri calma.  

Ele retribuiu o sorriso.  

Pensei por alguns segundos em tudo que eu ouvi hoje e tenho que admitir que ficar com Lucas, era realmente algo que eu faria. Eu nunca consegui enxergar muito além do fato de ele ser o melhor amigo de Rafa, mas ele era lindo de um jeito único. E agora que eu via isso com clareza, ficava difícil não perceber que ele tinha um sorriso perfeito. Perfeito demais para me deixar pensando em tudo que Camila e Juninho disseram hoje.  

— Rafael já está vindo. Ele passou no mercado para comprar algumas besteiras para a gente comer.  

— Você está cansado?  

— Morto.  

“Você quer uma massagem?”, se eu perguntasse isso o assustaria e daria uma bandeira enorme. Claro que daria. Mas pela primeira vez na face da Terra, desde quando era criança, eu o via do jeito que todas as meninas viam. Então agora ficou muito óbvio, o porquê sempre parecia que tinha uma fila de garotas disponíveis para ele.  

Me senti constrangida por pensar nele desse jeito. Muito constrangida. 

— Será que ele vai demorar muito? — ele perguntou. 

Típica conversa de quem nunca vai ver nada demais em você. Apenas a irmãzinha do amigo.  

— Acho que sim. 

Respirei.  

O que eu estou pensando? 

— Obrigada, Lucas, por me ouvir ontem. E por não contar — eu disse sendo sincera.  

Ele pegou na minha mão devagar. Fiquei surpresa com o gesto, mas tentei disfarçar.  

— Sempre que puder, Gi.  

O encarei por mais alguns segundos. De repente, dei um abraço nele. Eu nem sabia o motivo. Não sabia se era pelo fato de eu ter finalmente enxergado ele como um cara possível para mim, ou se era um agradecimento sincero, sem segundas intenções. Sendo um ou outro, ele correspondeu o abraço na mesma intensidade.  

E quando eu me soltei dos seus braços e olhei para ele, eu podia sentir que esse interesse só estava crescendo e que isso era a coisa mais burra em que eu tinha resolvido me meter, porque ele me olhava como se tivéssemos uma ligação de… irmandade. 

 

 

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