A HORA H

O caminho inteiro foi sobre Camila comentar suas fantasias com Lucas e Rafael juntos, e insistindo na ideia estúpida de que eu poderia mesmo ter um relacionamento com o melhor amigo do meu irmão, desde que não me envolvesse sentimentalmente e tornasse tudo físico. Eu preferi ignorar a argumentar o quanto tudo era estúpido demais, até a hora de me despedir e seguir em meu encontro com Igor.

Eu não estava certa sobre o que eu queria nesse encontro. Na verdade, eu sabia o que eu queria e sabia do que precisava para ter, mas não sabia se ia intimidar Igor a aceitar meus termos de confidencialidade e confiar nele ou simplesmente iria dizer para ele “estou pronta, venha e pegue”, ou se só tiraria a roupa e deixaria que ele tirasse as próprias conclusões. Tinha que trabalhar na minha jogada de sedução.

À medida que o tempo ia passando eu estava mais convencida de que se eu fizesse sexo com ele seria um erro e que era melhor levar esse encontro como qualquer outro que nós tínhamos. Uns beijos aqui, outros ali, uma passada de mão boba por cima do meu short e só. Ficar na zona de conforto mesmo. Mesmo que eu me sentisse presa e controlada dessa forma, era seguro.

Igor foi o meu primeiro namorado. Desses de apresentar para a família, de ir ao cinema, fazer planos de um futuro, viajar. Ele me apresentou um mundo novo e me fez ver as coisas de outro jeito. E, aliás, estávamos no último ano da escola. Mais quatro meses e iríamos para a faculdade e então poderíamos fazer tudo pela primeira vez e quantas vezes fossem necessárias. Não tinha pressa.

Toquei a campainha de sua casa e o vi chegando ao portão com o vento batendo no seu cabelo loiro e o deixando mais bonito a cada passo que dava. Cheguei até esquecer o que eu estava pensando durante o caminho para cá.

            — E aí, amor — ele falou do outro lado do portão sorrindo com seus dentes perfeitos de propaganda de creme dental.

            — Como você está? — perguntei em um tom de voz derretido e melancólico que eu não queria fazer, mas acontecia naturalmente quando estava com ele.

            — Melhor agora. — Igor se aproximou para me dar um beijo suave e me puxou um pouco pela cintura. — Não tem ninguém em casa, você vai ficar muito tempo? — ele perguntou me olhando nos olhos, não muito sutil.

            — Talvez — eu disse sorrindo tentando evitar a minha imaginação sobre como esse seria o momento perfeito para dizer adeus à minha virgindade.

Igor entrelaçou sua mão na minha e foi me guiando pela sua casa. Em nove meses de namoro, eu nunca tive a oportunidade de ficar com ele sozinha. Sua mãe sempre estava em casa, a empregada sempre estava cozinhando, o cachorro sempre estava chorando do outro lado da porta para ter a atenção dele. Talvez isso fosse um sinal para ignorar tudo o que eu estava pensando.

            — A gente pode ir para o Buddy Town Club depois daqui. Os meninos queriam jogar um futebol… Chama a Camila — ele sugeriu enquanto caminhamos para o seu quarto.

            — Que horas exatamente? Ela acabou de sair da minha casa. — eu disse assim que entrei no seu quarto azul-escuro.

            — Ela não precisa vir então… — ele falou mais uma vez nada sutil.

            — Até parece — eu disse sorrindo e logo após sentei na sua cama.

            — Não é como se você precisasse ficar com ela todo o segundo da sua vida. Vocês não nasceram grudadas, Gisele, deixa ela de lado um pouco — Igor falou do outro lado do quarto enquanto tirava a sua camisa e jogava na cadeira da cabeceira em uma pilha cheia de roupas.

Observei o abdômen do meu namorado e sim, poderia ser melhor, mas com certeza serviria para o que estava passando pela minha cabeça agora.

            — Até parece — falei pela segunda vez enfatizando a ironia. — Aposto que Camila falaria a mesma coisa sobre você, nas mesmas palavras… Inacreditável. — Fiz um não com a cabeça discreto enquanto me ajeitava em sua cama.

            — Isso porque ela fica ressentida que você tem um namorado como eu, enquanto ela é ignorada pelos caras que vive dando em cima, como uma desesperada — Igor concluiu e sentou ao meu lado.

            — Sabe, Igor… Camila é minha melhor amiga desde que eu me entendo por gente. Ela sempre esteve comigo quando eu mais precisava e não é como se ela não tivesse motivos para não gostar de você. — Ele tomou fôlego para responder, mas eu não dou oportunidade. — Não fica falando mal dela. Não para mim. Na verdade, para ninguém — afirmei, brava.

            — Você me defende desse jeito também? — ele perguntou com um sorriso de lado passando as mãos pelo meu cabelo preto. — Eu também tenho meus motivos para não gostar dela.

            — Ah, claro. Você mentiu pra mim no primeiro mês de namoro dizendo que ia viajar com a sua mãe e foi para uma farra no interior com seus amigos, onde ela descobriu e me contou. E agora você a odeia porque ela é a melhor amiga do mundo. — Usei meu melhor tom de ironia.

            — Eu não a odeio — ele disse com desdém. — Eu não gosto dela por ser uma fofoqueira que conta as coisas de um jeito que elas não são.

            — Ela não gosta de você pelo mesmo motivo — concluí olhando para ele sem paciência. — Mas isso são águas passadas né? — perguntei querendo encerrar o assunto.

            — Claro — ele falou me dando um beijo suave. — Se a galera passar aqui e você não quiser ir, eu não vou, tá?

Sorri para ele como quem ouviu o melhor dos elogios. Eu gostava desse tipo de sacrifício que Igor fazia por mim. Não acho que seja necessário, mas não é como se eu tivesse falado “não vamos sair com seus amigos pervertidos, vamos ficar aqui” e ele foi obrigado porque pedi.

Ele se aproximou e sentiu o aroma do meu perfume com cuidado. Sem eu nem perceber estava beijando meu pescoço e me deixando um pouco arrepiada. Não demorou muito para que eu estivesse o beijando com vontade de arrancar suas roupas e deixar que ele arrancasse as minhas. Sim, eu ignorei completamente tudo que fora pensado no caminho para cá e em menos de cinco minutos estava deitada na sua cama, sem camisa e com Igor por cima de mim.

Que se dane. Vou transar com ele aqui e agora e só a ideia de perder a virgindade me deixava com vontade de sorrir.

Conduzi a sua mão até o zíper do meu short deixando claro o que eu queria fazer com ele agora e então ele seguiu o ritmo do momento. Eu fiquei só de calcinha e sutiã na sua frente.

            — Você é maravilhosa — ele comentou depois de um longo beijei e uma longa olhada no meu corpo.

O beijei de volta. Não sabia o que falar para ele em um momento como esse. Talvez eu até ousasse em dizer alguma coisa safada, mas não acho que eu tenha coragem ainda. Igor seguiu beijando meu pescoço, eu passei a minha mão pelos seus cabelos pretos e comecei a sorrir para mim mesma sem que ele notasse.

Chegou meu momento. O momento em que eu tenho mais curiosidade para viver.

            — Você tem camisinha aqui? — perguntei para ele assim que me encarou de novo.

            — Tenho na gaveta. Calma — ele falou tranquilo e saiu da cama para alcançar a escrivaninha.

Fiquei o observando e senti que meu estômago inteiro estava dançando por dentro. É a hora, Gisele, é a hora H.

Sorri comigo mesma mais uma vez, então Igor me olhou e retribuiu o sorriso na mesma intensidade que o meu. Ele voltou com a camisinha na mão, me deu um beijo longo e demorado. Nossas respirações ficaram ofegantes juntas.

Coloquei a minha mão na sua bermuda para tirá-la e a gente consumar logo o ato. Nós dois sorrimos juntos, com os lábios a um centímetro de distância. E então o momento foi interrompido por uma droga de campainha.

            — Mas que merda… — Igor falou parando de me beijar e prestando atenção se ouviria de novo.

E ela tocou. Quatro vezes seguidas.

            — IGOOOOOOOOR! — Ouvi uma voz masculina familiar.

Virei meus olhos na hora.

            — Não acredito nisso — reclamei e me afastei de Igor na hora que percebi que “a galera” tinha chegado.

            — Não, Gi. Se a gente ignorar eles vão embora — ele argumentou me olhando como quem pede clemência.

Antes de responder, a campainha tocou mais quatro vezes. Virei meus olhos mais uma vez.

            — Só vai atender logo — falei desanimada.

            — Que merda de hora pra aparecer… — Igor reclamou baixinho e colocou a camisa logo em seguida. — Eu já volto —

Ele avisou antes de sair do quarto e logo em seguida fechou a porta.

Deitei na cama já desanimada. Acho que ele vai ter que se esforçar um pouco para me deixar no clima que estava cinco minutos atrás. Mas que diabos de amigos idiotas que apareceram justo agora. Abracei meus joelhos por alguns instantes e encostei na cabeceira da cama, depois passei a mão pelos meus cabelos agora bem bagunçados

Esperei por mais alguns minutos e depois me vesti para descer e ver se eles decidiram ter uma reunião de comitê ou algo do tipo.

Já no corredor eu consegui ouvir Igor e seu amigo repulsivo, Kaio, conversando. Pensei em voltar para o quarto porque realmente não queria dar de cara com esse sujeito.

Kaio se envolveu com meu melhor amigo Juninho nas férias de julho, depois fez o másculo heterossexual pegador e começou a esnobar Juninho para que ninguém descobrisse. Já estava preparada para enviar o meu olhar mais repulsivo assim que o visse.

            — Cara, eu vou marcar alguns pontos hoje, não vou poder ir. — Ouvi Igor falando e fiquei na escada ouvindo.

            — Vai marcar ainda? Você está lento, cara — Kaio, o falso heterossexual, comentou com ironia.

            — Vai valer a pena! — Igor disse entusiasmado. — Você não imagina como ela está na minha cama agora!

Meu queixo simplesmente foi no chão. Como se eu tivesse levado um golpe no estômago.

            — Posso ir ver? — Kaio perguntou com um tom de voz que me causa repulsa.

            — Vai sonhando…

Ignorei o rumo dessa conversa e segui para o quarto de Igor para voltar aos meus sentidos. Eu estava certa sobre o cretino, ele ia sair contando tudo e a minha virgindade ia parar no Jornal Gazeta cinco minutos depois de eu ter a perdido, Rafael ia ficar sabendo e ia fazer da minha vida um inferno até eu achar ela de volta. Ou seja, pelo resto da vida.

Filho de uma mãe desnaturada!

Eu me odeio tanto por nem sequer ser capaz de falar mal da mãe de Igor nesse momento. Calcei minha sandália com mais raiva do que poderia estar e me arrumei em frente ao espelho para saber se estaria bonita quando mandá-lo para o inferno.

            — O que está fazendo? — Igor perguntou assim que entrou no quarto e me viu em pé, ajeitando a roupa amassada.

            — Você é idiota por acaso? — Soei completamente irritada.

            — O quê? — ele perguntou parecendo confuso, de verdade.

            — Não me vem com essa cara de imbecil! — eu disse ainda mais irritada. — Você realmente ia contar para seu amigo escroto que a gente ia transar? — perguntei com um tom de indignação que fez com que ele percebesse o quanto era idiota.

Deu para notar quando a sua expressão mudou.

            — Qual o problema, Gi? Nós namoramos — argumentou.

            — Ah, fala sério. Você conheceu meu irmão. Você o conheceu muito bem enquanto ele ficava te ameaçando no nosso primeiro jantar lá em casa ou se esqueceu? — Comecei a ficar brava com ele por ser tão burro. — A gente conversou sobre isso, Igor. Conversou sobre como eu queria que Rafael estivesse longe de qualquer detalhe da minha relação com você.

            — Gisele, eu falei com o Kaio, não com seu irmão! — ele falou tão alto, como eu, como se tivesse alguma razão.

            — Ah, claro. Kaio. O digno de confiança. — Usei o sarcasmo para tentar me acalmar.

            — Ele não vai contar para ninguém!

            — Você realmente acredita nisso? Ele não perde a oportunidade de expor alguém e só guardaria segredo se o envolvesse mesmo, como andou fazendo — falei baixo, tentando economizar minha energia.

            — Como assim? Ele é meu melhor amigo, Gi, ele não vai falar nada — Igor disse confuso.

            — E mesmo se ele não falasse nada… Eu sou um jogo para você? — Mudei a direção dessa conversa assim que eu vejo que ele poderia derrotar meus argumentos com facilidade. — Você vai marcar pontos comigo?

            — Você está exagerando… — Ele sorriu de lado.

            — Não estou, não. Você é um babaca — comentei agora sorrindo também. Sorrindo com o maior nível de sarcasmo que pude achar dentro de mim.

            — Gisele…

            — Não. Nem tenta. Sai da minha frente — pedi tentando ser educada.

            — Amor, vamos sentar na cama e conversar…

            — Pra quê? Pra você correr pro seu amigo e dizer como me dobrou e conseguiu marcar uns pontos? Eu espero que tenha gravado bem na memória como eu estava, Igor, porque foi a primeira e única vez que me viu daquele jeito — eu disse muito confiante do que estou falando agora. — Eu sou uma mulher, não um troféu. Então eu preciso ser tratada como uma. Agora sai da minha frente.

Passei por Igor sem ao menos ele dar licença ou rebater o que eu estava dizendo. Engoli em seco e passei pelo portão da sua casa, ignorando todas as vezes que ele chamou o meu nome. No caminho de volta para a minha casa eu fechei os olhos várias vezes pensando no erro que eu ia cometer se tivesse transado com ele e como era irônico que, talvez seu amigo repulsivo tenha me ajudado com alguma coisa. Se eu tivesse ido adiante, e naquele momento eu iria, Rafael ia descobrir em uma semana e ia enlouquecer. Eu respirei aliviada. E mesmo carregando o sentimento de que eu evitei um estrago, fiquei frustrada. Eu não tive meu momento. Não tive minha hora H. E por mais que Igor fosse um babaca fofoqueiro, antes de perceber isso, ele me deixou com um gostinho de quero mais. Gostinho esse que eu não vou provar tão cedo.

Continue lendo este livro gratuitamente
Digitalize o código para baixar o App
Explore e leia boas novelas gratuitamente
Acesso gratuito a um vasto número de boas novelas no aplicativo BueNovela. Baixe os livros que você gosta e leia em qualquer lugar e a qualquer hora.
Leia livros gratuitamente no aplicativo
Digitalize o código para ler no App