O Segredo do Herdeiro de Monteverde
O Segredo do Herdeiro de Monteverde
Por: Isadora Luz
prólogo

Eu não sabia que o inferno podia começar numa sala de estar.

Nem que o estalo de uma porta batida pudesse doer mais que qualquer tapa.

Mas quando o meu cunhado — aquele bastardo de fala mansa e olhar podre — me disse que eu não servia nem pra esquentar o sofá da casa dele, eu soube. O inferno tinha nome, cheiro de cigarro barato e um suspiro de nojo estampado no canto da boca dele.

— Some daqui, Enya. Vai viver de favor em outro lugar — ele cuspiu as palavras como se eu fosse sujeira na sola do sapato.

Eu nem discuti. A casa dele nunca foi minha. E naquele instante, eu só queria sumir.

A Nádia tentou me segurar, mas eu não deixei. Ela ainda chorou quando bati a porta, mas eu não chorei. Eu tava seca por dentro, como se toda lágrima tivesse virado fumaça e desaparecido.

Eu só tinha uma mala nas costas e uma raiva que latejava no fundo do peito.

Foi aí que a Bruna apareceu.

Me encontrou na calçada, o cigarro pendurado no canto da boca, o batom vermelho borrado de quem já tinha começado a noite bem antes de mim.

— Vem, Enya. Eu tenho um colchão no chão e um armário meio capenga. Fica lá até se ajeitar.

— Não sei nem pra onde vou, Bru.

— Então vem pra festa comigo. Você vai esquecer tudo por uma noite.

E eu fui. Porque naquela hora, eu não queria lembrar de nada.

Não queria lembrar do olhar da Nádia, da voz do meu cunhado me expulsando, da vida que parecia se rasgar na beirada de cada passo. Eu só queria sentir alguma coisa que me fizesse lembrar que eu ainda estava viva.

A festa estava tão cheia que o ar parecia pegajoso, colando no corpo como suor. A Bruna, meio bêbada mas ainda lúcida o bastante pra me puxar pela mão, me arrastou pro meio da pista. A música batia no peito como um soco, e eu deixei a batida me guiar. O copo de plástico balançava na minha mão, e cada gole queimava mais do que o anterior.

Eu não sei quanto tempo se passou.

Eu sei que eu dançava sem parar, que eu girava até a vista escurecer.

E no meio do turbilhão, eu vi ele.

Érico.

Não era um nome ainda. Era só um rosto. Um rosto que parecia feito pra me destruir de dentro pra fora.

Ele estava ali, com aquele olhar de quem também carregava o próprio inferno no peito. E eu sabia — antes mesmo de chegar perto — que aquela noite não ia terminar bem.

Eu fui até ele como quem vai até a beira do precipício.

Ele me olhou como quem vê a própria queda refletida nos meus olhos.

A gente não trocou palavra.

Eu só puxei a camisa dele e beijei. Beijei como quem precisa rasgar a dor no corpo do outro.

Ele retribuiu como se quisesse me engolir inteira.

As mãos dele na minha cintura. As minhas unhas nas costas dele. O gosto de álcool e desespero misturado no beijo.

A gente se perdeu num canto escuro, atrás de um sofá empilhado, enquanto o mundo girava em volta.

Ele me empurrou contra a parede, e eu deixei.

Eu gemia baixo, o corpo tremendo, mas eu queria mais. Eu queria esquecer o mundo inteiro naquela respiração quente no meu pescoço.

Eu queria esquecer o rosto do meu cunhado, o choro da Nádia, o medo de ficar sozinha.

Eu queria morrer naquela noite e nascer de novo.

Mas, mal sabia eu que o inferno na minha vida só estava começando.

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