O intervalo finalmente chegou, e com ele, a primeira oportunidade real de respirar desde que pisei naquele colégio que parecia mais uma escola de elite disfarçada de instituição pública.
Caminhei até o banheiro, mais por necessidade de escapar dos olhares do que por qualquer urgência física. As paredes brancas pareciam brilhar sob a luz fria dos refletores, e o som da água nas torneiras ecoava como um sussurro metálico.
Enquanto lavava as mãos, ouvi vozes vindo da porta entreaberta. Não demorei para perceber que um grupo de garotas falava animadamente do lado de fora.
— Eu vi ele hoje! — exclamou uma delas, a voz aguda e empolgada. — Ele estava absurdamente lindo. Aquele moletom preto e o cabelo bagunçado? Eu morro!
— Kael Thorne é o padrão ouro, amiga. — outra respondeu, soltando uma risada abafada. — Mal posso esperar pelo jogo hoje à noite. Será que ele vai jogar?
— Ah, com certeza. Ele sempre j**a nos grandes eventos da faculdade. Eu tenho que ir.
— Vou fazer o teste pra torcida semana que vem — disparou uma terceira voz, cheia de expectativa. — Último ano, é agora ou nunca. E se eu passar, posso entrar pro time da universidade no ano que vem. A técnica já está de olho nas meninas com potencial.
Um silêncio breve, e depois uma quarta voz, um pouco mais baixa, quase invejosa:
— Acho que a técnica já tem as favoritas dela...
A conversa deslizou sobre risos e sussurros mais abafados. Fiquei parada por um momento, os dedos ainda molhados, a toalha de papel esquecida na pia.
Eu também torcia na minha antiga escola.
Era uma das minhas partes preferidas, a adrenalina dos jogos, a sensação de fazer parte de algo. Mas aqui… tudo parecia mais sofisticado. Mais competitivo.Será que eu teria chance?
Sacudi a cabeça, jogando o papel na lixeira antes de empurrar a porta devagar. O grupo estava encostado no corredor, reunido de frente para uma fileira de armários. Elas falavam baixo agora, os olhos brilhando diante de um armário decorado com fotos de ex alunos, claro que Kael Vardom estava entre eles.
— Não acredito que ele vai ficar noivo no próximo fim de semana… — murmurou uma delas, os olhos fixos no cadeado.
— Eu queria tanto ir — gemeu a loira de cabelo comprido, com um suspiro digno de novela.
— Eu vou — respondeu uma morena de cabelos cacheados, os olhos cintilando. — Minha irmã é amiga da Harper. Ela me prometeu que vai me levar.
— Sua irmã é amiga da Harper Liney? — perguntou a menina com o cabelo preto cortado num chanel perfeito. — Como?... Ela é arrogante.
A cacheada deu de ombros, mas estava sorrindo.
— Arrogante ou não, ela vai casar com Kael. Isso já diz tudo, né?Revirei os olhos, tentando não fazer barulho. Não era da minha conta, e o último lugar onde eu queria estar era no meio de um grupo de fãs obcecadas por um garoto que eu nem conhecia, mesmo que o nome dele parecesse insistir em aparecer por toda parte.
Kael Thorne.
O nome ecoava como uma melodia proibida. Eu não fazia ideia do porquê, mas só de ouvi-lo… sentia um arrepio correr pela espinha.Atravessei o corredor ignorando o grupo, sentindo seus olhares me seguirem brevemente, talvez por eu ser nova, ou talvez porque sabiam que eu tinha ouvido tudo. Nenhuma delas disse nada, e eu também não olhei para trás.
O campus da escola se conectava ao da universidade através de um caminho ladeado por árvores, com bancos de pedra e postes antigos. Resolvi procurar minha irmã. Talvez ela estivesse no centro do campus universitário, tomando café em alguma daquelas cafeterias estilosas que pareciam saídas de filmes.
Caminhei observando os detalhes: as folhas que caíam preguiçosamente, os sorrisos de alguns alunos, as bicicletas presas nos suportes de ferro. Era tudo… limpo e bonito.
Uma cidade perfeita.
Uma escola perfeita. E, aparentemente, um príncipe perfeito.Tudo perfeito...
Demais.— Madisson? — ouvi uma voz familiar vindo do lado esquerdo, na área comum entre os prédios.
Gwen estava sentada em um banco, mexendo no celular com uma expressão leve. Ela usava os fones, mas me viu no mesmo instante em que a notei. Sorriu e acenou.
— Aqui!
Fui até ela, aliviada por finalmente ver um rosto conhecido.
— Já se perdeu na selva Thorne? — brincou, tirando um dos fones.
— Quase. Você sabia que praticamente tudo aqui tem o sobrenome deles?
Ela riu.
— É impossível não notar. Mas sabia que tem toda uma história por trás? Os Thorne fundaram a cidade, literalmente. Começou com a indústria madeireira, depois migraram pra tecnologia e hoje controlam metade de Lunaris Valley.
— E ninguém acha isso estranho?
— Estranho… talvez. Mas funcional. Eles ajudam muita gente. Dão bolsas, mantêm empregos. A cidade gira ao redor deles.
— E o Kael Thorne? Ele é tipo… o herdeiro de tudo?
Gwen me lançou um olhar curioso.
— Por que o interesse?Dei de ombros.
— Escutei algumas meninas falando. Ele vai ficar noivo no fim de semana.
— Ah, sim. Harper Liney, você vai conhecer ela em breve. Ela cursa economia na universidade, mas faz parte da equipe de líderes de torcida.
— Elas falaram como se fosse um evento real… tipo, casamento real.— comentei, não conseguindo parar de fazer careta. — Que tipo de pessoas casa antes dos vinte e cinco?
Gwen riu.
— É, mais ou menos isso mesmo. Tem até festa no clube privado da família. Coisa de filme. E o tipo de pessoa rica, muito rica.
Fiquei em silêncio por um tempo, observando o céu limpo.
Alguma coisa aqui não faz sentido.
— Será que ela está grávida? — comentei, não conseguindo desviar os pensamentos.
— Não, eu vi ela e sinceramente, nunca vi alguém em tão boa forma. Acho que eles se amam, namoram desde o início da adolescência.
Torci o nariz mais uma vez.
— Então isso é sobre primeiro amor? — continuei falando e Gwen começou a rir.
— Esqueça isso, irmãzinha. Eu sei que você não acredita que pode acontecer, mas algumas pessoas realmente acreditam no amor.
— Sim, isso é loucura. — respondi e ela voltou a rir.— Além disso, você não acha essa cidade estranha?
Minha irmã ergueu a sobrancelha para mim e revirou os olhos.
— Essa cidade é perfeita, Maddy. Você vai perceber isso em algum momento.