(Narrado por Sergio Vance)
Estava em meu escritório na sede da Vance Holdings, imerso em relatórios de aquisição há pouco mais de uma hora, quando o telefone pessoal tocou. Apenas um punhado de pessoas tem esse número. Era Mary, minha afilhada. Sua voz era um fio, cheia de um pânico que fez eu me endireitar na cadeira instantaneamente. Vou ser sincero: no mundo dos negócios, me chamam de frio, implacável, um predador. E eu sou. Mas com a minha família, com aqueles que eu amo, sou outra pessoa. Uma mudança que começou há cinco anos e que me redefine todos os dias. Mary... eu a criei como uma filha desde que seu pai, meu melhor amigo, Jack Walker, se foi. Sua morte só intensificou o meu dever ferrenho de protegê-la. — Padrinho, por favor... — ela soluçou. — Ethan está viajando a trabalho, e estou sozinha. O Liam está chorando tanto... parece estar com uma dor horrível. Preciso levá-lo à emergência, mas estou tão nervosa que não consigo nem pensar em dirigir. O senhor... poderia mandar um dos motoristas? Ouvi os gritos agudos do pequeno Liam ao fundo, e uma urgência que não sentia há tempos tomou conta de mim. Meu instinto de proteger falou mais alto. — Calma, querida. Respira — minha voz, que era capaz de congelar uma sala de reuniões, suavizou-se deliberadamente. — Não se preocupe com o motorista. Eu vou aí pessoalmente, ok? Estarei aí em quinze minutos. — Mas, padrinho, não quero incomodar... o seu trabalho... — Você nunca é um incômodo, meu anjo. Ponto final — cortei, com a autoridade branda que ela conhecia desde criança. — Além disso, até eu fiquei preocupado. Nunca ouvi esse garotão chorar assim. Por favor, querida, apenas me espere. Já estou a caminho. Não esperei resposta. Desliguei, peguei as chaves do Porsche e saí. As aquisições, os milhões em jogo... tudo podia esperar. Algumas coisas são simplesmente mais importantes. O que eu não esperava, porém, era que ao chegar naquele hospital, cruzaria com a pediatra mais deslumbrante que já vi na vida. Quando entrei com Mary e o Liam no colo e levantei o olhar, avistei-a. E simplesmente... paralisei. Ela não era bonita. Bonita era adjetivo para mulheres comuns. Ela era uma tentação. Uma armadilha perfeita de curvas e inocência enfiada num jaleco branco. Cabelos castanho-claros, da cor do mel, presos de qualquer jeito como se ela não soubesse – ou não se importasse – com o poder que tinha. Os lábios... Cristo. Eram um convite ao pecado. Naturalmente volumosos, desenhados para gemer e para sorrir daquele jeito doce que excitava e enlouquecia um homem. Era a boca de um anjo com a promessa de um vício profano. Mas o que mais me prenderam foram os olhos. Verdes como um lago profundo, onde um homem podia se afogar sem nem perceber. Aquela visão não me desconcentrou. Ela me dominou. Paralisou o ar nos meus pulmões e apagou qualquer pensamento que não fosse "é minha". Não consegui desviar o olhar. Fiquei hipnotizado, um predador reconhecendo outra fera – mesmo que ela não soubesse disso ainda. E quando a vi corar sob o meu olhar, um pensamento possessivo me tomou. “Esse rubor é meu. Só meu”. Apertar sua mão foi o meu maior e mais perfeito erro. O toque foi suave, quente, uma contradição deliciosa com a força que eu sabia que aquelas mãos tinham. E o choque que percorreu meu braço não foi silencioso. Foi um aviso severo e primal. De que aquele corpo, sob aquele jaleco, era uma tempestade prestes a acontecer. E eu, Sergio Vance, nunca me afastei de um bom caos. Pelo contrário: eu o comprava, dominava e moldava como desejava. — Muito prazer. Sergio Vance — apresentei-me, com um tom de voz mais baixo e intencionalmente suave, assim que Mary fez as apresentações. Quando me disse seu nome gravei imediatamente “Hellen”. Um nome bonito. Clássico. Soava como algo que eu gostaria de sussurrar no escuro. A jovem médica me deixou... interessado. Uma reação pura e primitiva, que há muito, nenhuma outra mulher conseguiu provocar em mim. Meus olhos, treinados para analisar detalhes em negociações de milhões, fizeram um scan rápido dela. Nenhuma aliança. Nenhuma marca de compromisso. A observação acendeu um farol verde na minha mente. “Disponível”. Ela era jovem demais, é claro. Uns vinte e poucos anos, um bezerro perto dos meus quarenta e sete. Mas a idade nunca foi um impedimento; era apenas mais um atributo no pacote. Aquele ar de inocência, misturado com a competência profissional, era uma combinação intoxicante. A atração que senti foi brutal, direta e sem pedir licença. E, para minha surpresa, até a forma carinhosa e eficiente como ela tratou o pequeno Liam alimentou minha obsessão. Era a prova de que ela não era apenas um rostinho bonito. Ela era... qualidade. Algo raro. Algo que valia a pena possuir. Não contive o ímpeto de elogiar seu trabalho – um primeiro movimento tático, já que elogios diretos à sua pessoa seriam prematuros. E antes de sairmos da sala, assegurei meu primeiro contato. Toquei seu pulso ao pegar a receita, um gesto calculado para marcar território e medir sua reação. Sentir a pele suave dela sob meus dedos e vê-la corar foi mais do que uma pequena vitória; foi a confirmação de que a caçada estava apenas começando. Ela era ainda mais deliciosa no contato. Algumas horas depois, ao sairmos da sala de observação onde Liam ficou, já totalmente calmo e dormindo plácidamente no colo de minha afilhada, Mary fez questão de voltar à sala da Dra. Bennett para agradecer. E eu, lógico, achei a ideia perfeita. — Muito obrigada, Doutora! Você foi um anjo — Mary sorriu, aliviada, apertando o filho no colo. — Ver meu filho calmo e sem dor não tem preço. A doutora também sorriu, de forma genuína. — Que isso, querida. Só fiz meu trabalho. Além disso, ver esse príncipe bem outra vez pra mim é que não tem preço. Foi então que seus olhos verdes-claros, por um breve instante, desviaram-se para mim. Não perdi a oportunidade. — Também preciso lhe agradecer, obrigado novamente, Doutora Bennett, por ter ajudado a acalmar a minha afilhada. Ela apenas acenou com a cabeça, um aceno profissional e contido. Mary, porém, em seu entusiasmo juvenil de 19 anos e com aquele orgulho transbordante que só quem te vê como um herói tem, comentou entusiasmada: — Inclusive, doutora, acabei esquecendo de dizer! Sabia que o meu padrinho é um dos maiores sócios do hospital? Ele que praticamente modernizou toda a ala pediátrica no ano passado! Ele é o dono da Vance Holdings! — ela disse, inflando o peito como se fossem as próprias conquistas. Um lado de mim esperou, naturalmente, pela reação habitual. O olhar que se tornava respeitoso, um pouco temeroso, talvez até um sorriso mais doce e interessado. Era a reação padrão quando meu nome e meu império eram mencionados. E já estava pronto para acenar com modéstia falsa. A reação da doutora, porém, não foi a que eu esperava. — É mesmo, querida? — respondeu a doutora, com uma voz absolutamente plana, sem um pingo de curiosidade ou temor. Seus olhos verdes nem piscaram. Foi como se Mary tivesse dito que eu era apenas o entregador de pizza. E então, veio o golpe final. Sem que Mary percebesse, e aparentemente pensando que eu também não veria, a Dra. Hellen Bennett revirou os olhos com uma expressão de tédio tão profundo e genuíno que foi como um soco direto no meu ego. Naquele momento, porém longe de tal reação me irritar, me fascinou. Ela não estava impressionada. Não estava se fazendo de difícil. Ela genuinamente não dava a mínima para Sergio Vance, o magnata. E aquele desdém, por algum motivo perverso, era o afrodisíaco mais potente que eu já tinha experimentado. Fiz de conta que não tinha visto, é claro. Minha expressão permaneceu a máscara impenetrável de sempre. Mas quando ela praticamente fugiu de nós, alegando outros pacientes, uma coisa ficou queimando na minha mente, com a mesma força obsessiva com que comando meus negócios: Eu precisava vê-la de novo. E dessa vez, eu faria ela me notar.