Fico calada, calculando se ainda tenho alguma dignidade sobrando para jogar fora.
Ele finge que não me conhece, me insulta e, no final, ainda tem a audácia de j**ar a vaga como quem j**a migalhas. — Jamais — respondo, reunindo forças para erguer o queixo. — Nunca trabalharia para você, especialmente depois de tudo isso. — Tem certeza? — ele levanta a sobrancelha. — Porque imagino que sua situação financeira está longe de ser boa. — Prefiro morrer de fome a me rebaixar a isso. — digo, me dirigindo à porta de novo. — Como quiser — ele responde, voltando a olhar os papéis. — A proposta continua até o final do dia. Mas não demore… paciência não é meu forte. Saio da sala sem me dar o trabalho de responder, com as pernas bambas, carregando o que sobrou do meu orgulho. Quando entro no elevador, me apoio na parede, tentando respirar. — Parabéns, Ann. Conseguiu se humilhar direitinho — murmuro, sentindo as lágrimas queimarem meus olhos. — Como pude cair naquela farsa de homem gentil? De todas as recusas, entrevistas caóticas e propostas indecentes, essa foi a pior. A mais humilhante. Volto para casa no automático. Só quando viro a esquina da minha rua e me aproximo do portão é que volto à realidade. Um grupo de vizinhos está parado em frente à minha calçada, sussurrando entre si. Quando chego em frente à minha casa, vejo o motivo. A tinta vermelha ainda escorre na madeira branca do portão. Em letras tão grandes que é impossível ignorar: “VADIA!” — Meu Deus… — sussurro, levando a mão à boca. — Ah, Ann… — Dona Gertrudes, a fofoqueira da rua, se aproxima com uma falsa preocupação. — Que situação horrível. Todo mundo está falando. Tadinha de você. Ignoro os olhares curiosos, pego a chave e tento entrar rápido. Mas o nervosismo me faz derrubar a chave, e tenho que ouvir mais sussurros. — Dizem que ela era amante do chefe há anos — escuto alguém comentar. — Pobre esposa grávida — outra voz responde. — Imagina descobrir uma coisa dessas. Finalmente, abro o portão e entro correndo, batendo-o atrás de mim. Vou para a porta principal, querendo subir para o quarto e esquecer que esse dia existiu, mas minha madrasta me impede. — Você viu o que fizeram, não viu? — ela coloca as mãos na cintura, negando com a cabeça. — Isso é uma vergonha para a nossa família! — Os vizinhos estão falando — meu pai entra na conversa, parando ao lado dela. — E ainda tenho que ouvir as piadinhas no trabalho. Que vergonha! — Eu não tive culpa… — murmuro, exausta. — Não teve? — ela ri, sem humor. — Ficou anos sendo a outra e agora quer se fazer de vítima? Se tivesse engravidado, pelo menos teria o nome dele e não estaríamos passando por isso. — O hospital ligou de novo hoje. — Meu pai se senta, passando a mão na cabeça. A dívida aumentou, Ann. Dois dias e Daniel está fora. — Eu… sei — sussurro, tentando segurar as lágrimas. — Vou conseguir o dinheiro para pagar ou, pelo menos, renegociar. — É bom que consiga! — Margareth exclama, dando um passo à frente. — Porque, se o hospital parar o tratamento, a morte do seu irmão vai ser sua culpa! E não venha dizer que não avisei. Meu pai aponta o dedo para mim. — Arrume um jeito, qualquer jeito, Ann. Venda suas coisas, peça emprestado, sei lá… Mas encontre uma solução ou carregue o peso de enterrar seu irmão. Concordo em silêncio, me viro para sair e subo as escadas com um peso enorme nas costas. O tratamento médico do meu irmão precisa ser pago e simplesmente não tenho como resolver isso. Ou melhor… tenho. Nathan. Mas trabalhar para ele… depois de tudo, de como me tratou… Talvez eu aceite, deixando claro que será só profissional. Nada além disso. Pelo menos até os boatos acabarem e eu conseguir outra coisa. Sento na beira da cama, abraçando os joelhos. Tento pensar em alternativas, qualquer coisa, mas só me vem à mente o rosto do meu irmão no hospital. Não tenho outra escolha. […] Na manhã seguinte, antes das 10h, chego à Evermont Industries disposta a engolir meu orgulho pelo bem da minha família. — Gostaria de falar com o Sr. Prescott — digo à recepcionista. — Só um momento — ela responde, pegando o telefone e discando um número. Por poucos segundos, fala algo baixo, tão baixo que nem consigo ouvir. Então, desliga a ligação e volta a mexer no computador. — Ele está ocupado — informa, sem nem me olhar novamente. — Pode se sentar e esperar. Te chamo quando ele estiver disponível. Sento em uma das cadeiras, observando os funcionários que passam. Alguns me reconhecem. Dá para ver pelos olhares tortos, pelos sussurros disfarçados. Dez horas viram meio-dia. Meio-dia vira 15h. Pessoas entram, saem, são atendidas. Todos confiantes, todos ocupados. E eu continuo aqui. Invisível. A recepcionista finge que não existo e repete a mesma resposta toda vez que pergunto sobre Nathan: — Ele é um homem muito ocupado. Terá que esperar. Meu estômago ronca, mas não ouso sair para comer. Nem por um segundo. Quando já são quase 18h, um segurança se aproxima. — A senhorita precisa sair. O expediente já acabou. — Mas estou esperando o Sr. Prescott… — O Sr. Prescott? Ele nem está mais aqui — responde, impaciente. — Saiu há horas. A realidade me faz prender a respiração. É claro que ele só queria o prazer de me ver voltar rastejando. Como fui ingênua ao ponto de acreditar que ele realmente me daria outra chance? Me levanto para sair, mas, antes que eu possa passar pela porta, o porteiro me chama. — Você é Ann Sterling, certo? — Sim, sou eu — respondo, franzindo as sobrancelhas. Ele pede um momento e se afasta. Pouco depois, volta com uma caixa nas mãos. — O Sr. Prescott pediu que entregasse isso para você — diz, me estendendo a encomenda. O porteiro se afasta sem esperar resposta. Abro a caixa. Dentro, encontro uma lingerie de renda sensual e um bilhete cuidadosamente dobrado. “Hoje à noite, às 22h, venha ao Hotel Península usando isso.”