Logan narrando
O sábado começou cedo, diferente do que costumo fazer nos finais de semana. Normalmente reservo esses dias para organizar projetos em andamento, revisar relatórios e, se possível, descansar um pouco do ritmo intenso da semana. Mas naquela manhã, eu tinha uma palestra agendada em uma faculdade. Confesso que palestras não são meu passatempo favorito, mas eu reconheço a importância de estar presente, mostrar o rosto, inspirar jovens e, de certa forma, também manter a minha imagem fora dos muros da empresa.
Cheguei ao auditório com meu terno cinza claro, bem alinhado, acompanhado do meu segurança e de um assessor que sempre organiza esses compromissos. O lugar estava lotado, estudantes atentos, ansiosos, muitos com cadernos na mão, outros já gravando tudo com o celular. Subi ao palco com a segurança de quem vive o que fala. Não precisei de muitas anotações. Eu conheço cada detalhe da minha trajetória, cada erro e cada acerto que me trouxeram até aqui.
Falei sobre negócios, sobre investimentos, sobre o risco calculado que existe por trás de cada decisão. Contei alguns episódios da minha vida profissional, momentos em que a maioria teria desistido, mas eu segui em frente. Notei que muitos olhares me acompanhavam com uma intensidade quase esperançosa. Sei que, para muitos ali, minha presença simbolizava um futuro que eles desejavam alcançar.
No final da palestra, como sempre acontece, alguns estudantes se aproximaram. Queriam agradecer, pedir conselhos, tirar fotos. Foi nesse momento que uma jovem, aparentemente nervosa, se destacou no meio da multidão. Ela tinha nas mãos um envelope e, quando conseguiu se aproximar, falou rápido, quase atropelando as próprias palavras. Disse que precisava muito de um trabalho, que aceitava qualquer função, e me entregou o currículo.
Olhei para o segurança que me acompanhava e assenti. Ele pegou o envelope e guardou. Eu já estava acostumado a esse tipo de abordagem. Expliquei, de forma breve e educada, que para isso eu tinha uma equipe de recursos humanos, que cuidava das contratações, e que o melhor caminho seria ela mesma procurar a empresa, entregar o currículo e ver se havia vagas. Não prometi nada. Nunca prometo. Não é justo criar expectativas em alguém quando sei que a decisão não passa diretamente por mim.
Depois disso, despedi-me do público, entrei no carro e segui meu caminho. Não dei mais importância à cena. Já havia presenciado esse tipo de situação muitas vezes, e, por mais que eu entenda a necessidade de cada pessoa, eu não posso resolver os problemas do mundo sozinho.
O restante do meu sábado foi como eu gosto: silencioso, focado. Voltei para a cobertura, subi até meu escritório e mergulhei em projetos que estavam me exigindo atenção. Diagramas espalhados pela mesa, gráficos no computador, relatórios que precisavam ser ajustados. Não senti o tempo passar. Só percebi a madrugada chegar quando meus olhos começaram a arder de cansaço e o corpo deu sinais de que não aguentava mais. Dormi tarde, mas com a mente ainda ligada em cálculos e possibilidades.
No domingo, acordei tarde. O relógio já marcava quase meio-dia quando finalmente levantei. Não sou de dormir demais, mas naquela manhã o corpo exigiu. A primeira coisa que fiz foi preparar um café forte, abrir as cortinas e observar a cidade lá embaixo. São Paulo nunca dorme, mas naquele instante parecia mais calma, talvez pela luz suave que entrava pelas janelas.
Pouco depois, lembrei do compromisso do dia: o aniversário do meu sobrinho, que também é um dos diretores da minha empresa. Relações familiares não são exatamente meu ponto forte, mas quando se trata dele, faço questão de estar presente. É um garoto inteligente, dedicado, alguém em quem deposito confiança dentro da empresa. Além disso, a família cobra minha presença nesses eventos, e eu sei que, por mais ocupado que eu esteja, esses momentos também importam.
Coloquei uma roupa menos formal, algo mais descontraído, e segui para o local da festa. Era uma casa ampla, decorada para a ocasião. Crianças corriam de um lado para o outro, adultos conversavam em grupos, havia música baixa e mesas fartas. Eu, como sempre, mantive minha postura mais reservada, cumprimentando quem se aproximava, trocando algumas palavras, mas sem me alongar demais.
Foi então que, no meio do movimento, meus olhos captaram uma cena inesperada. Entre os convidados, estava a mesma jovem que, no dia anterior, havia me abordado na faculdade e entregado o currículo. Ela me viu. Não restou dúvida. O olhar dela encontrou o meu por alguns segundos, e imediatamente notei o desconforto. Ela desviou o olhar, fingiu ocupar-se com algo e, em seguida, simplesmente desapareceu entre as pessoas.
Aquilo me fez franzir a testa. Não era comum. Coincidências acontecem, claro, mas a forma como ela reagiu não parecia ser apenas um acaso. Fiquei em silêncio, observando discretamente se a via novamente, mas ela não voltou a aparecer.
Meu instinto me dizia que havia algo errado, mas resolvi não me aprofundar naquele momento. Não era nem lugar, nem hora. Eu estava ali para celebrar o aniversário do meu sobrinho, e não para investigar uma estudante desesperada por trabalho. Respirei fundo, deixei a preocupação de lado e procurei aproveitar a festa da maneira que conseguia.
Conversei com alguns parentes, participei de uma roda de risadas, ouvi as histórias de negócios que inevitavelmente surgiam até mesmo em encontros familiares. De vez em quando, pegava uma taça de vinho, olhava ao redor e refletia sobre como minha vida havia tomado rumos tão diferentes. Eu era cercado de gente, mas ainda assim sentia uma certa distância de todos. Talvez fosse pelo peso da responsabilidade, talvez fosse apenas da minha natureza.
Quando a festa terminou, despedi-me da família, entrei no carro e voltei para casa. No caminho, fiquei pensando em como a vida às vezes cruza caminhos de maneira inesperada. Talvez eu nunca mais visse aquela jovem. Talvez fosse apenas uma coincidência. Ou talvez não.
Não gosto de viver de suposições. Eu aprendi, ao longo dos anos, que a verdade sempre encontra um jeito de aparecer. E se havia algo para ser descoberto naquela história, cedo ou tarde viria à tona.
Por enquanto, preferi me concentrar no que realmente importava: meus negócios, meus projetos, e a certeza de que, apesar de todos os imprevistos, eu continuava no controle.