Capítulo 4 – O Convite
Acordei atrasada, como sempre. Parece que as noites estavam mais curtas e agitadas.
Tomei meu banho de princesa, caprichei nos cuidados, na perfumaria e dei aquele tapa na depilação como se fosse ter um encontro. Escolhi a roupa íntima combinando, pronta para mostrar — pena que não seria verdade. Era só a minha mente delirante me enganando.
Escolhi novamente o jeans Levis, só que agora o preto. Era minha paixão, eu não me via com outro jeans. Camisa de botão branca, básica, reta e com gola. Bota preta tratorada nos pés e uma argola prata ligeiramente grande. A bolsa de couro preta caía muito bem com o look, e só a make soft com blusa rosa suave para finalizar.
Resolvi ir de Uber, pois estava ligeiramente atrasada. Era meu segundo dia de estudo de campo na cafeteria, e tinha planejado começar mais uma vez com uma degustação.
Chegando lá, cumprimentei todos os funcionários do salão — meu rosto já tinha virado conhecido. Janete estava repondo estoque e se deslocou para me cumprimentar. Informou que Matias estava atrasado e pediu que eu o aguardasse. Falei para ela que havia planejado novamente uma degustação e não teria problema esperar.
Para não perder tempo, me dirigi até o balcão e iniciei os pedidos. Para o segundo dia, o plano era ousar um pouco mais. Pedi um café com suco de laranja e conhaque, e para comer, uma torta de queijo da Canastra com tomate cereja e alecrim.
Pedido servido à mesa, comecei a degustar. O café com suco de laranja era incrível — uma mistura estranha, mas com sabores perfeitamente equilibrados. O conhaque deu um toque especial e ousado à experiência. Me senti levemente alterada logo nos primeiros minutos e pedi uma água com gás para tentar equilibrar a sensação.
A torta parecia ter saído direto da fazenda para a mesa. Bem fofinha, com a quantidade de queijo e sal equilibrados. O tomate confit e o alecrim estavam dispostos na parte superior com toda a leveza e sutileza que esses ingredientes pedem.
Estava tudo muito bom, e escolhi comer bem devagar para sentir cada ingrediente. Estava quase terminando e Matias ainda não tinha chegado. Mas tudo bem — eu sabia que poderia ser assim.
Estava concentrada quando fui surpreendida por uma voz que eu já conhecia. Era ele. O Sr. Dad do cafezal estava em frente à mesa onde eu sentava e me chamou pelo nome. Me cumprimentou, pegou na minha mão pela primeira vez — e deu para sentir a textura. E vou te falar: era boa. Mão suave e grande ao mesmo tempo.
Questionou o que eu estava fazendo, e o relembrei que havia combinado com a Janete de ir três vezes para uma pesquisa de campo. Sr. King na hora lembrou que tinha se comprometido e me acompanhar também no terceiro dia — pediu desculpas por não lembrar.
Mas ok. Aproveitei para ficar falando e olhando para aquele rosto lindo. Expliquei minha inspiração para o doce exclusivo, e Gabriel falou que prefere a surpresa — para eu compartilhar somente quando estivesse pronto.
Ele estava conversando comigo em pé, e me senti mal-educada ficando sentada. Aproveitei para convidá-lo a sentar comigo. O bonito olhou para os lados, para o relógio, e sentou. Parecia que tinha compromisso.
Seguimos falando sobre ingredientes, e ele me fez uma pergunta pessoal. Liguei o alerta de garota criadora de fantasias na cabeça. O bonitão me perguntou onde eu tinha nascido, e contei sobre minha cidade natal e minhas origens no Centro-Oeste.
Gabriel fez várias perguntas sobre a região, e eu aproveitei para devolver a pergunta pessoal. Pedi que ele contasse onde tinha nascido e sobre suas raízes. A conversa fluía para um lado mais mais pessoal — não digo íntimo, mas descontraído num nível que eu não esperava para hoje.
Surpreendentemente, a conversa fluía bem demais. Gabriel falava coisas simples e aparentemente tinha uma vida normal, apesar dos muitos milhões que ele devia ter na conta.
Passaram 40 minutos de conversa boa e de vários assuntos. Matias não tinha dado o ar da graça nem mandado mensagem. Aproveitei que Janete estava passando perto da mesa e a questionei se Matias havia dito algo sobre sua chegada. Janete falou que ele estava em uma emergência na cozinha de outra franquia e não conseguiria chegar a tempo.
Diante da informação, Sr. King se mostrou preocupado e verificou por telefone o que de fato havia acontecido. Aparentemente era Matias na linha, e sua preocupação principal era com as pessoas — se todos estavam bem.
Desligou o telefone e compartilhou comigo que uma das franquias teve um vazamento de gás e foi necessária a presença de bombeiros e perícia.
Aproveitei que Janete ainda estava próxima à mesa e informei que iria embora, tendo em vista a urgência que Matias teve que atender.
Me virei para o God of Coffee com o intuito de me despedir. O Deus grego perguntou qual era minha programação para o período da tarde, e expliquei que não tinha planos — iria aproveitar para testar algumas combinações para o doce exclusivo.
Ele falou que precisava ir para uma das lojas, conforme sua rotina semanal. Combinamos então sobre o dia seguinte, e já que o estudo de campo seria com ele — para conhecer, sob o olhar do CEO, a história do negócio da família.
Perguntou também se eu não queria uma carona até minha casa.
Eu, claro, óbvio, certeza e sim — aceitei os dois convites. Não esbocei que estava vibrando por dentro, nem que tinha todas as más intenções físicas com ele. Não romantizava nem pensava em nada além de sexo. Minha consciência de classe era muito fresca, e eu não perderia tempo pensando em coisas que não aconteceriam comigo e com o Sr. Coffee.
Me despedi de todos e recebi olhares que pareciam sons: “Hummmm”. Todos os funcionários com balãozinhos acima da cabeça, sem dizer uma palavra.
Entrei no carro dele — uma Land Rover Evoque, nova e luxuosa — e tentei colocar o cinto sem muito sucesso. O God percebeu minha dificuldade, passou o braço à frente do meu pescoço para ajudar, puxou o cinto e afivelou para mim. Eu, na hora, respirei fundo. Minha vontade era pular no pescoço dele e já pular no colo.
Naquele dia, a aparência dele estava mais relaxada. Será que às quintas os CEOs se permitem vestir uma roupa qualquer e ficar relaxados? Esse mundo dos ricos eu realmente não entendo, e não consigo decifrar quando essas mudanças de estilo e humor são calculadas.
Ele estava vestido com uma calça cáqui, um tênis sem meia e camiseta levemente apertada nos braços. Dava para ver exatamente o contorno do corpo com aquela camiseta justa e a calça. O perfume parecia um encantador de mentes. Me levava a imaginar ele no carro sem toda aquela roupa — e eu podendo aproveitar cada centímetro.
Ele ter colocado o cinto em mim só piorou o tesão reprimido que eu estava sentindo. Era real e palpável. Eu precisava transar — e se fosse com aquele monumento, melhor ainda. Mas precisava manter a postura. Afinal, uma parte da minha renda vinha da empresa dele, e isso não poderia ser atrapalhado. “Júlia, sua abestalhada, para de misturar as coisas. Onde se ganha o pão, a gente não deita na mesa.”
Passei o endereço, o príncipe colocou no GPS e falou que conhecia aquele bairro. Seguimos o caminho, e ele se mostrava ainda mais delicioso enquanto dirigia. A posição era de uma mão na parte superior do volante e a outra segurando o câmbio. Do carro, claro.
Num sinal fechado, quando o carro parou, ele virou, olhou nos meus olhos de uma forma diferente e me perguntou o que eu gostava de fazer. Aquela olhada foi diferente — no olho, perguntando muito mais do que as palavras que saíram da boca. Eu estava confusa, me questionando se aquilo que estava percebendo era verdade. Se de fato ele estava me olhando diferente.
Dei uma gargalhada por dentro — meu lado safado querendo ter a certeza para poder pular logo nele e resolver aquilo que estava me queimando por dentro.
Respondi que eu era uma pessoa bem simples, com gostos que giravam em torno de viver momentos e desfrutar com pessoas, mais do que com coisas. Falei também sobre meu sonho de fazer gastronomia e o resultado que estava aguardando do vestibular.
O lindo ficou meio boquiaberto com minha resposta. Será que foi sugestiva demais? Tomara que sim — só assim ele me considera logo para uma transa e pulamos essas formalidades.
Após a reação, ele interagiu dizendo que adorou minha resposta, que eu parecia ser uma pessoa bem intensa. Soltou, de forma bem esquisita, que também gostava de viver momentos marcantes — às vezes até demais. Falou que era um homem de gostos peculiares.
E nessa hora, minha espinha gelou. O que será que esse maravilhoso, perfeito, estava querendo dizer?
Fiquei na dúvida se deveria sentir tensão, curiosidade ou os dois. A forma como ele disse aquilo parecia carregada de segundas intenções, mas ainda assim envolta em mistério. Eu queria perguntar mais, mas também não queria parecer desesperada. Então, apenas sorri e deixei o silêncio preencher o carro por alguns segundos.
Chegamos na porta do meu prédio. Obviamente, não o convidei para entrar — ele havia deixado claro que tinha um compromisso. Agradeci pela carona e pela boa conversa, e me inclinei para dar um abraço. Com aquele cheiro que entorpece, ele me abraçou, segurou o abraço por alguns segundos, beijou minha bochecha e olhou nos meus olhos ainda abraçado.
Isso foi totalmente inesperado e gerou sensações físicas que provavelmente refletiram em um seio com bico durinho e uma calcinha molhada. Sim, foi exatamente isso. Meu corpo reagiu antes mesmo que eu pudesse racionalizar.
Nos soltamos do abraço lentamente, eu desci do carro com o coração acelerado e a mente em combustão. Entrei no prédio tentando parecer normal, mas por dentro eu estava em chamas.
Subi para o apartamento, tirei os sapatos e fui direto para o banheiro. Precisava de um banho frio — ou talvez nem tanto. Aquele homem tinha mexido comigo de um jeito que ninguém mais tinha conseguido. E o pior (ou melhor) é que ele sabia disso.
Enquanto a água escorria pelo meu corpo, eu pensava: será que ele também sentiu? Será que aquele olhar, aquele toque, aquele abraço... foram só gentileza ou um convite disfarçado?
Não sei. Mas amanhã tem mais. E se ele realmente me guiar pelo estudo de campo, talvez eu descubra o que há por trás daquele CEO de gostos peculiares.
Por enquanto, só me restava dormir com aquele cheiro ainda grudado em mim — e a imaginação solta, como sempre.