Capítulo 3 – Chegando mais perto
Assim que a voz da Janete me tirou da quinta série, levantei os olhos e a vi pedindo que eu me dirigisse até a sala do Deus King. Matias me acompanhou e, ao entrar na sala, percebi um clima descontraído e íntimo. Não intimidade entre homem e mulher, mas entre amigos, conhecidos ou parentes.
As mulheres me cumprimentaram com um aceno de cabeça e um breve sorriso. King, Deus do deserto, me lançou um sorriso e mencionou que era bom me ver de novo.
Janete havia contado para ele sobre a minha ideia de pesquisa de campo, e ele aproveitou o momento para elogiar a minha iniciativa. Aumentou minha pressão e o nível de exigência quando mencionou que estava ansioso para conhecer o novo doce encomendado.
Ele me apresentou as três mulheres deslumbrantes: Marcela, Roberta e Ana. Marcela, irmã do Matias, na faixa dos 28 anos; Roberta e Ana, amigas de longa data da família. Estudaram todos na mesma escola tradicional da cidade.
Após as apresentações, Matias chamou sua irmã e as amigas para verem uma nova criação na cozinha. Ele precisava da opinião sincera e sem rodeios, queria saber o quanto aquela receita iria tocar os clientes.
Dr. Café ficou na sala e pediu que eu permanecesse para discutir um ponto. Sabendo que eu ficaria três dias em estudo na loja, propôs que a última visita fosse guiada por ele. Não explicou os motivos, apenas sorriu e manteve a postura profissional de sempre.
Muito curiosa e quinta série, questionei o que ele tinha em mente para o dia e se eu precisaria preparar algo.
Mais uma vez, com um toque de mistério, ele respondeu de forma evasiva que o dia já estava planejado — bastava eu comparecer no horário.
Saí da sala intrigada e com o corpo pegando fogo. Eu tentava não pensar naquele King, mas era quase impossível. O homem era bonito até do avesso, e fingir normalidade ficou fora de cogitação.
Saindo da sala, Matias estava se despedindo das meninas. Eles estavam combinando de se encontrar em algum lugar após o fechamento da loja.
Nossa visita guiada continuou. Seguimos para a cozinha, e Matias fez questão de me explicar sobre os processos de qualidade e higiene obrigatórios — e o quanto isso faz diferença na durabilidade e excelência dos produtos. Logo depois, começou a detalhar as receitas fixas do cardápio, o nível de complexidade e os pratos com receitas secretas que ele dominava.
Foi uma tarde de muita troca e aprendizado. Matias finalizou o que tinha planejado, e eu já não aguentava mais. Me mantive tão concentrada que refletiu no corpo — a dor de cabeça veio com força.
Me despedi da Janete e dos demais funcionários para seguir viagem para casa.
Chegando em casa, já tinha anoitecido. Toda força que me restava permitia apenas tomar banho, comer um miojo de tomate, pegar o tablet para estudar uma hora e dormir.
O estudo rendeu. Foquei em conhecer mais sobre ingredientes que combinam com café e a relevância do tipo de solo na construção do sabor do grão. Mais uma vez, dormi com o tablet em cima do rosto — vencida pelo cansaço.
No dia seguinte, caí da cama tarde. Meu corpo pedia cama, minha mente pedia trabalho. Minha agenda não incluía sair de casa, apenas produzir as encomendas e despachá-las.
Minha rotina com doces e cozinha sempre começava com uma bela preparação e limpeza do ambiente, para que todos os balcões e mesas ficassem desocupados para uso.
Depois disso, deixava todos os ingredientes picados, porcionados e higienizados para a hora do show. Fazer minhas receitas foi ganhando um espaço enorme no meu coração — virou sinônimo de prazer.
Me perdi no tempo e nas produções, percebendo a hora somente às 13h. O período da manhã foi suficiente para que todas as encomendas fossem preparadas, embaladas e despachadas com os motoboys.
Uma das encomendas foi a primeira remessa de doces com brasilidade para a cafeteria do Gabriel. Estavam previstos três envios por semana, com aproximadamente 300 doces em cada. Era uma encomenda considerável, e o meu retorno financeiro era certo.
À tarde, com a sensação de dever cumprido, me permiti assistir a um filme e relaxar no sofá. A cabeça estava no dia seguinte, agoniada com a possibilidade de ver o King. Não deveria estar pensando nisso — meu foco estava cada vez mais embasado — mas o pensamento era mais forte que eu.
A noite chegou, e eu precisava jantar. Comer sozinha nunca foi um problema, mas um companheiro seria bem-vindo para ajudar a dissipar os pensamentos indecentes. Mandei uma mensagem para o João, meu vizinho de andar. Eu morava em um edifício com poucos apartamentos — quase todo mundo parecia ser solteiro e trabalhador. João trabalhava com edição de vídeos e numa editora. Nos aproximamos desde que me mudei no ano passado. Ele geralmente me ajudava quando eu precisava — e eu a ele.
respondeu à mensagem com um “Oi”. Disse que estava comendo churrasquinho na esquina e pediu para eu descer e encontrá-lo. Foi o melhor convite para quem não estava a fim de cozinhar e sujar louça. Nosso cumprimento sempre era caloroso e cheio de saudades. A companhia do J. era boa demais — pena que a gente se via pouco.
Fizemos nossas escolhas de comida e começamos a colocar o papo em dia. J. me contou que estava envolvido em uma grande entrega de edições para um grupo de influencers, que conseguiu uma agência para angariar freelancers e estava dando certo. Ele estava trabalhando no mínimo doze horas por dia, sem tempo para distrações.
Contei para ele que tinha feito o tão sonhado vestibular e estava aguardando a resposta, e que tinha acabado de fechar com um novo cliente para entrega dos doces semanais. Aproveitei e contei sobre o Deus grego que não saía da minha cabeça — e J. caiu na gargalhada. Sabia que eu gostava de uma encrenca e um desafio, mas ao mesmo tempo me pediu para ter cautela. Um cara como esse poderia embaralhar minha cabeça e atrapalhar a realização dos meus sonhos.
Ele tem toda razão. Mas como separar as coisas? Como ser racional diante de uma situação que é física? A atração por alguém, o magnetismo que o outro provoca em você, começa pelo corpo. Seu corpo só vai decidir não ser atraído se você se afastar ou se houver algum tipo de desilusão ou desinteresse. Alguém deveria estudar isso e explicar melhor — para que as pessoas que se sentem atraídas e não conseguem reverter se sintam menos doidas. Claro que estou me referindo a um magnetismo saudável, interessante e sexy.
Contei ao J. que amanhã poderia ver o God Coffee, e que já não sabia como agir na frente dele. O cara era muito perfeitinho — e isso constrange. Mas vamos ver. Sempre aparece um assunto ou oportunidade que gera um momento de troca.
Meu amigo J. sempre se manteve solteiro. Uma vez ou outra saía com garotas, mas nunca o vi com alguém fixo. Nossa relação, no início, evoluiu para um lance. A gente se encontrava esporadicamente e ficava. Era legal, e fazíamos bem um ao outro — mas não ao ponto de dar frio na barriga e vontade de ficar junto o tempo todo.
Evoluímos para amigos com benefícios e depois entendemos que nossa melhor posição era como amigos mesmo. J. é um homem negro, altíssimo, musculoso, se alimenta com disciplina e mantém o cabelo black power como se fosse a menina dos seus olhos. Chama atenção de qualquer um — e mesmo assim, não se empolga com isso. É fiel aos seus princípios e mantém relacionamentos geralmente tranquilos e responsáveis, mesmo que não sejam fixos.
Nossas relações íntimas sempre foram um caso à parte. Não havia pressa nem desespero. Os momentos eram aproveitados com qualidade e dedicação. E isso tem muito a ver com o perfil do J., de ser calmo e atencioso com tudo. Com ele, aprendi alguns truques que só a intimidade e a confiança no outro podem proporcionar.
Só de pensar, dava vontade de viver um remember. Mas J. não era assim — principalmente porque agora sabia que eu tinha um novo pensamento fixo na cabeça: o Sr. King do Coffee.
Terminamos nosso jantar e subimos para o apartamento. Chamei o J. para um cafezinho, e ele topou. Adorava minha comida e tudo que eu preparava — não perdia a chance de encontrar um docinho perdido na minha geladeira. Terminamos o café e a noite, e combinamos uma saída para a balada no fim de semana. J. ainda não conhecia algumas das minhas amigas, e combinamos de eu apresentá-las.
Nos despedimos com o carinho de sempre, e eu fui logo dormir — para garantir a skin perfeita para o dia seguinte.