Capítulo 4

Laura

Quando Elijah chegou com o tio Caine, trazendo um café quentinho e um muffin só para mim, eu precisei de uns segundos para processar.

Sério. Porque, veja bem, aquele homem tem cara de que não sabe sorrir nem sob ameaça de tortura medieval. Aquele tipo de sujeito que dá “bom dia” já cobrando juros. E, ainda assim, ali estava ele, entregando um muffin como se fosse uma oferenda divina, e um café que, convenhamos, é praticamente uma declaração de amor no universo das professoras.

Sim, eu me senti tocada.

Não no corpo (infelizmente), mas na alma. Porque, se até Caine Westbrook tem um coração, então talvez o mundo não esteja tão perdido assim.

Mas logo percebi a urgência nos gestos dele, como quem faz questão de deixar claro: “cumpri minha obrigação, agora preciso correr porque minha vida importante me chama”.

E é lógico, né, Laura? Ele é um tubarão dos negócios. Um homem que parece ter uma reunião marcada até pra ir no banheiro. Não sobra espaço na agenda para coisas de criança, glitter e coreografia com girassóis.

Só que… Elijah ama o tio. Isso é inegável.

Ama de um jeito que dói de ver. Inclui Caine em tudo, até quando o homem não aparece. “Meu tio ia gostar desse desenho”, “meu tio sabe consertar”, “meu tio uma vez me mostrou tal coisa”… Nathan já tinha me falado sobre o irmão mais velho, mas ouvir de Elijah é outra coisa. É quase como se o menino enxergasse nele um super-herói de capa invisível.

Eu só não imaginava que esse super-herói seria… tão gostoso.

Sim, eu disse. E vou repetir mentalmente até o fim do dia. Gostoso. Aquele tipo de homem que entra em qualquer sala e automaticamente faz você pensar em duas coisas:

Ele vai dominar qualquer conversa.

E provavelmente domina uma mulher na cama com a mesma intensidade.

Eu sei, eu sei. Consciência escandalizada, gritando dentro de mim:

— O que é isso, sua doida? Cobiçando os familiares dos alunos agora?

Mas, sinceramente? É impossível não notar Caine Westbrook. Até a senhorinha da limpeza comentou, depois que ele saiu, abanando o rosto com o espanador:

— Esse homem trouxe calores que eu não sentia há muito tempo, menina.

E olha… não houve uma única funcionária que discordasse.

Eu não sei se o assustei com minha “alegria exagerada” ou se ele só me achou maluca mesmo. Quer dizer, vamos recapitular:

O homem chega com aquela cara fechada de CEO que engole concorrente no café da manhã, usando um terno que custa mais do que o meu carro inteiro, entrega um muffin com a delicadeza de quem assina um contrato e, depois de aguentar a apresentação das crianças, minutos depois já está desaparecendo pelo portão da escola como se o chão estivesse pegando fogo.

E eu fiquei lá, segurando o café, o muffin e um leve sentimento de: “o que acabou de acontecer aqui?”.

— Está tudo bem, Miss Laura? — perguntou Ana, minha colega de sala, reparando que eu estava meio… aérea.

— Está sim… só… admirando o poder de um café quente vindo de um homem bonito.

— Como é?

— Nada, Ana. Absolutamente nada.

Dei um gole no café e me afundei na tarefa de reorganizar as mochilinhas das crianças, tentando ignorar a lembrança da voz dele dizendo meu nome. Laura. Só isso. Mas dito com aquele tom grave, firme, que poderia significar duas coisas: ou ele estava prestes a me demitir de uma empresa que eu nem trabalho, ou prestes a me convidar para um jantar íntimo.

E, honestamente, não sei qual opção seria mais perigosa.

Ok, chega.

Definitivamente, estou carente. É isso. Só pode ser isso.

Três meses sem beijo decente, sem transa satisfatória — só meia dúzia de encontros frustrantes, onde a parte mais emocionante era decidir qual pizza pedir. Aí, de repente, aparece um homem daqueles na minha sala, e meu cérebro resolve escrever sozinho um roteiro de comédia romântica adulta em plena quarta-feira.

Mas o que realmente me pegou não foi nem o muffin, nem os olhos intensos (que, convenhamos, dariam fácil propaganda de perfume masculino proibido para menores de 21 anos). Foi a forma como Elijah olha pra ele.

Como se o tio fosse o personagem principal da vida dele. Como se não importasse que apareça pouco — quando aparece, basta.

E talvez baste mesmo. Porque, para uma criança, esses pequenos gestos — trazer um café, assistir a uma dança de girassóis, ficar presente por meia hora — já dizem tudo.

E isso, sinceramente, é mais do que muita gente faz.

Nathan já tinha me falado do irmão. Disse que Caine era reservado, sério, focado até a alma nos negócios da família. Que raramente se permitia lazer, mas que sempre esteve presente quando necessário. Foi ele quem segurou tudo quando Naomi… quando as coisas ficaram insuportavelmente difíceis.

Não gosto de pensar nisso.

Mas sabe o que Nathan nunca mencionou?

Que o irmão mais velho tem aqueles olhos. Escuros, intensos, que parecem atravessar sua alma.

E que, apesar de toda a pose de executivo inabalável, a expressão dele suaviza quando o sobrinho sorri.

Isso ele não contou.

E agora eu estou aqui, em plena tarde de atividades com massinha colorida, pensando em um homem que provavelmente já esqueceu meu nome e que deve estar, neste exato momento, assinando contratos milionários enquanto toma um segundo café — sem muffin — em uma sala com vista panorâmica para o mar.

Mas tudo bem. Eu sou Miss Laura. A otimista.

A que canta “Baby Shark” sem medo de ser feliz, que usa tiara de florzinhas na cabeça e acredita que o mundo precisa de mais abraços inesperados e menos formalidades.

Eu sou do tipo que entrega sorrisos de brinde.

Eu só não estava preparada para receber um muffin em troca.

A campainha toca, anunciando o fim do recreio.

Coloco o copo de café na mesa, ajeito a tiara, sacudo a saia (que já tem purpurina grudada de ontem), respiro fundo e volto para a sala.

E sigo com o passo leve de quem, mesmo coberta de glitter e com massinha até na sola do sapato, ainda acredita que coisas boas podem surgir dos lugares mais improváveis.

Até mesmo de um terno bem cortado e de uma carranca matinal que, por um segundo, quase me pareceu sorrir.

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