Laura
Existe um tipo muito específico de homem que entra em uma escola infantil como se estivesse entrando numa zona de guerra. O Sr. Caine Walker é exatamente esse tipo.
Desde o momento em que o vi parado na porta da sala dos Girassóis com aquele terno perfeitamente alinhado, cara de quem chupou limão azedo e um olhar que diz "estou pronto para fugir em três, dois, um…", eu soube: ele era uma causa perdida. Ou... um desafio. E eu amo um desafio.
Elijah, como sempre, iluminou o ambiente ao vê-lo. O menino é luz. Ele adora desenhar o Sr. Walker em situações aleatórias com pessoas da escola. No mês passado, me desenhou casando com a faxineira. Na semana anterior, com a coordenadora. Agora, aparentemente, fui promovida a par romântico oficial. Com direito a nave espacial e tudo.
— Ele é só meio sério, mas tem um coração bom — Elijah me disse um dia, enquanto coloria um desenho de um Caine de bigode. — Só precisa aprender a sorrir mais.
Sim, Elijah. Concordo. Mas isso é mais difícil do que fazer crianças de cinco anos comerem beterraba.
Na manhã seguinte, estou na sala dos Girassóis bem antes do horário, pendurando estrelinhas de papel no teto — as crianças estão ensaiando uma dança para o piquenique anual e essa sala vai brilhar, literalmente. Tenho glitter no cabelo, cola nos dedos e um CD infantil tocando a versão instrumental de “If You’re Happy and You Know It”.
É aí que ouço uma batida na porta.
— Com licença. Temos… uma entrega especial
A voz é dele. E por algum milagre do universo, menos ranzinza do que ontem.
Me viro e vejo a dupla dinâmica parada ali: Elijah sorridente segurando um copo de café com as duas mãos, e Caine segurando uma caixinha com muffins.
— Trouxemos café pra você, Miss Laura! — Elijah anuncia com entusiasmo.
— E muffin. De mirtilo. Aparentemente você gosta disso. — Caine completa, parecendo que está prestes a cometer um crime de guerra.
— Eu... nossa. Que gentileza. — Pego o café como se fosse um troféu. — Obrigada, Elijah. E obrigada, Sr. Walker.
— Caine. — Ele suspira. — Sr. Walker me faz parecer ainda mais velho do que essa roupa sugere.
— Então, obrigada, Caine. — Sorrio, e é impossível não notar que ele desvia os olhos por um segundo. Será que o CEO está... sem graça?
— O Elijah me fez parar na cafeteria e disse que professores merecem café quente e doces. — Ele levanta o muffin, como se não estivesse acreditando que está mesmo me entregando aquilo. — Estou obedecendo ordens dele. E ele é convincente.
— Isso é verdade — digo, pegando o muffin. — Ele me convence a dançar Baby Shark em loop toda sexta-feira.
— Ah, então não sou o único sob chantagem emocional constante.
— Eu não chantageio ninguém! — Elijah protesta, mas sorri e nos cutuca, um em cada lado.
— Vamos ensaiar a dança hoje? — ele pergunta.
— Sim! E seu tio vai assistir, né?
— Eu só vim entregar o Eli.
— Mas você já está aqui. Com café e muffin. E, veja só, temos cadeiras extras para espectadores ranzinzas.
Ele me encara como se eu tivesse sugerido que ele dançasse vestido de palhaço. E talvez, só talvez, essa ideia tenha passado pela minha cabeça.
— Elijah, por que você acha que seu tio precisa de café hoje? — pergunto, só por diversão.
— Porque ele ficou acordado até tarde lendo contratos! E fazendo aquela cara de quem precisa de abraço! — Ele faz uma careta imitando perfeitamente o olhar cansado de Caine.
— Eu não faço essa cara. — Caine responde, mas não convence ninguém.
— Você faz sim, mas tudo bem. — Elijah se agarra à minha cintura.
Quase deixo o muffin cair com o afeto do garotinho.
— Vamos dançar, Elijah? — digo, tentando mudar de assunto. — E depois talvez o seu tio possa ver o novo desenho que você fez.
— É o que tem a gente num foguete indo para Marte, lembra? — ele cutuca o tio. — Você disse que eu podia mostrar!
— É. E eu não recuei oficialmente disso. — ele murmura, como se já estivesse se arrependendo de cada segundo da visita.
Mas fica.
Caine Walker fica.
Senta-se na cadeirinha azul de plástico, com as pernas esmagadas, o café na mão e o muffin no colo. E por vinte minutos assiste Elijah dançar desengonçado, rir alto, e errar todos os passos da coreografia.
E eu percebo algo raro, quase milagroso.
Caine está sorrindo. De verdade. Ainda que meio contido.
Mas é um começo.
E eu sou uma especialista em lidar com começos.