Mundo ficciónIniciar sesiónPOV - Adrian Cavallieri
A porta do meu escritório se abriu com um estrondo, fazendo as paredes de vidro vibrarem.
Não precisei levantar os olhos dos relatórios financeiros para saber quem era. O cheiro de perfume doce e barato misturado ao suor do medo a denunciava.
— Eu não aguento mais! — A voz de Emanuelle era estridente, arranhando meus ouvidos como giz num quadro negro. — Eu me demito!
Girei a cadeira devagar, encarando a mulher parada no meio da sala. Ela estava descabelada, com o uniforme torto e uma mancha de tinta guache azul na saia. Tinha cabelos castanhos e longos, corpo magro e pele morena. O fio-dental que usava no Ambrosia Club destacava a bunda empinada, detalhe que, na época da contratação, chamou minha atenção mais do que deveria.
“Talvez eu devesse ter me preocupado com coisas mais importantes”, pensei. “Como, por exemplo, descobrir se ela realmente levava jeito com crianças.”
— O que foi dessa vez, Emanuelle? — perguntei com a voz baixa e calma. Fui o mais contido que pude. Odiaria ser interrompido.
— Aquelas meninas... elas não são crianças. São monstrinhos! — Ela gritou, tremendo, e jogou um tufo de cabelo castanho na minha mesa. — Elas cortaram meu cabelo enquanto eu cochilava! Olha isso!
Olhei para o cabelo em cima dos meus papéis. Meus olhos se estreitaram. Eu não me importava com o cabelo dela, nem com a demissão dela. Mas me importei com o tom.
— Repita — ordenei, levantando-me. O movimento foi fluido, predatório.
Emanuelle recuou um passo, a bravata vacilando.
— O... o quê?
— Como você chamou as minhas filhas?
Caminhei até ela, ignorando qualquer noção de espaço pessoal, encurralando-a contra a estante de livros. Emanuelle trabalhava no meu clube nos fins de semana como garçonete extra, e sempre me entretinha perfeitamente. Eu sabia disso. Ela era uma das poucas que conheciam minha verdadeira posição como dono do lugar, mas eu também conhecia o tipo dela: uma submissa disfarçada de rebelde, alguém que fingia desafiar o fogo só para sentir o prazer de se queimar.
— Elas são monstrinhos — ela sussurrou, tentando sustentar o olhar.
Num movimento rápido, minha mão disparou e se fechou na nuca dela, entrelaçando os dedos no cabelo que ela insistia em reclamar. Puxei a cabeça para trás com violência, forçando-a a olhar para o teto e expondo a garganta vulnerável.
Ela se engasgou. As mãos agarraram meu pulso, mas sem qualquer força para me deter.
— Nunca — rosnei perto do ouvido dela, sentindo o pulso acelerar sob meus dedos — ouse insultar as minhas filhas novamente.
— Sr. Cavallieri... — Ela gemeu, e o cheiro da excitação dela se misturou ao pavor.
Patético. Ela queria aquilo. Implorava por controle.
— Você gosta de brincar com o perigo, Emanuelle? É por isso que está falando desse jeito? — Apertei mais a nuca dela, observando as pupilas dilatarem. Desci a mão pelo corpo dela, explorando com desdém, e só parei quando ouvi o gemido escapar.
— Você quer que eu te castigue? Porque, se eu começar a te ensinar respeito, só vou parar quando você ficar incapaz de andar. É isso que você quer?
Ela estremeceu. O corpo dela amoleceu contra o meu, esperando, desejando a punição. Isso me deu nojo. Mulheres eram fracas. O prazer delas era barato. Se vendiam por migalhas de atenção ríspida.
Soltei-a com um empurrão brusco, jogando-a contra a porta de madeira. Peguei o lenço de bolso e limpei a mão, como se tivesse tocado em lixo.
— Saia. — Voltei para minha mesa sem olhar para trás e apertei a campainha. — Fale com a Adelaide. Ela vai acertar sua rescisão e o adicional de silêncio.
Ela se levantou, ajeitando a roupa com o rosto vermelho de vergonha e desejo frustrado.
— Eu... eu vou te ver no clube hoje, Sr. Cavallieri? — arriscou, a voz trêmula de esperança.
— Suma da minha frente, Emanuelle. — Nem levantei os olhos. — Quando eu estiver entediado, quem sabe.
Ela saiu quase correndo. E, no mesmo instante em que abriu a porta, Adelaide entrou.
Suspirei, massageando as têmporas. Outra babá. A sexta em dois meses.
— Adelaide.
— Pois não, senhor Cavallieri?
— A babá se demitiu. Pague o que ela quiser, dê cinquenta por cento a mais se for preciso para ela calar a boca. E me consiga outra. Urgente. Não me importa o custo. Só quero alguém que não seja uma imbecil completa e que dure mais de uma semana.
— Sim, senhor.
Ela se retirou, e eu caminhei até a janela. O jardim estava impecável, mas vazio. Eu precisava ter a conversa de novo.
Encontrei Ângela e Geovana na sala de jantar. As duas estavam sentadas à mesa enorme, balançando as pernas, com sorrisos inocentes demais para quem tinha acabado de cometer um ato de terrorismo capilar.
Parei na cabeceira da mesa.
— Emanuelle foi embora.
— Ela era chata — Geovana disse, sem parar de comer o purê.
— E o cabelo dela era feio — Ângela completou. — A gente só ajudou.
Olhei para as duas. Rostos angelicais escondendo mentes calculistas. Elas não queriam babás. Queriam afastar qualquer mulher daquela casa.
— Vocês sabem as regras — falei, friamente. — Não me importo com o que fazem com os brinquedos, mas os funcionários são caros para substituir.
— A gente não precisa de babá, papai. A gente tem você e a tia Ade — Ângela largou o garfo, os olhos marejando com aquela raiva infantil que beirava o dramático.
— O papai precisa trabalhar. Pagar as contas, comprar os presentes, juntar dinheiro para as melhores faculdades, para que vocês tenham tudo que quiserem.
— Mas pai... elas sempre tentam... tentam roubar o lugar da mamãe.
Senti o estômago revirar. O gosto ácido da bile subiu. Mamãe.
A palavra era proibida ali dentro.
Lembrei-me de Sara. Lembrei de como ela ria quando as meninas choravam recém-nascidas. “Eu não nasci para trocar fraldas, Adrian. Eu sou uma Dominadora. Nasci para ser adorada, para causar dor e prazer, não para limpar vômito. Você é muito tosco... muito.”
E então ela foi embora com o primeiro que prometeu uma vida sem responsabilidades. Abandonou as meninas com três anos, como se fossem bonecas quebradas.
Mas o que eu poderia esperar? Eu sabia quem ela era quando me casei. Achei que podia mudá-la. Eu estava errado. Ela só se importava com sexo e com quantos orgasmos teria. Era só isso.
Olhei para minhas filhas. Ajoelhei-me diante delas, ficando na altura dos olhos. Não as abracei. Abraços deixavam as pessoas moles. Eu precisava que elas fossem fortes como aço.
— Escutem bem. — Segurei o queixo de Ângela com delicadeza firme. — Ninguém vai substituir a mãe de vocês. Porque ninguém é bom o suficiente para entrar nessa família. As pessoas vão embora. As mulheres mentem. O amor... o amor é uma fraqueza que as pessoas usam para te manipular. A única coisa real nesse mundo é o dinheiro, e o papai tem o bastante para comprar tudo.
— Mas você ama a gente? — Geovana perguntou baixinho, enroscando o braço no meu.
— Eu amo vocês mais que tudo no mundo, e sempre vou proteger vocês — corrigi, engolindo o nó na garganta. — E vou construir um império para vocês duas.
Beijei a testa de cada uma e fiz um cafuné rápido.
— Mas eu e a tia Ade precisamos de ajuda. Está bem? Então facilitem, e eu levo vocês à Disney no ano que vem. Pode ser?
— Jura de mindinho?
Enrolei meu dedo mindinho nos delas.
Levantei-me, arrumando o paletó, voltando a ser o General.
— Dinheiro, meninas. Dinheiro é a única coisa que nunca acorda de manhã e decide te abandonar. O dinheiro é leal. O poder é fiel. É nisso que vocês devem confiar. Entenderam?
Elas assentiram, absorvendo a lição como se fosse a única verdade do mundo. E talvez fosse. Era tóxico? Sim. Mas melhor prepará-las para a vida do que vê-las quebradas como eu estive um dia.
— A tia Ade vai trazer uma nova babá amanhã — avisei. — Tentem não a matar na primeira hora.
Subi para meu quarto. Troquei de roupa. Foi um dia tenso e ainda tinha mais contabilidade para fazer.







