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Não sou mulher de ninguém

05

Às 19h em ponto, eu ainda estava diante do espelho, indecisa entre dois vestidos. Um preto, justo, de alças finas — clássico e direto. O outro, vinho, com um decote sutil e tecido que desenhava meu corpo com firmeza e elegância.

Optei pelo vinho.

Ele dizia exatamente o que Elói pedira: "Eu comando minha própria história."

Prendi o cabelo em um coque moderno, deixando alguns fios soltos nas laterais. Batom vinho escuro, delineado preciso. Salto alto, postura reta. Cada detalhe era uma declaração: não sou acessório. Sou presença.

Às 19h30, a buzina curta do carro cortou o silêncio da rua.

Desci as escadas com as mãos frias, mas o coração em brasa. Papai apareceu no corredor, me lançando um olhar mudo. Ele sabia que aquela noite era mais do que apenas um jantar. E não disse nada. Apenas sorriu de lado — cúmplice, talvez preocupado.

Lá fora, o carro preto me aguardava. O vidro desceu lentamente, revelando Elói — de blazer escuro, camisa com o colarinho aberto, e aquele mesmo olhar hipnótico.

— Está absolutamente no controle — ele disse, abrindo a porta para mim com uma mão.

— Sempre estive — respondi, entrando com elegância.

O trajeto foi silencioso, mas longe de desconfortável. Uma música instrumental preenchia o fundo, enquanto ele dirigia com precisão. De vez em quando, seus olhos se voltavam para mim, como se tentassem registrar cada detalhe.

— O jantar é em um rooftop privado. Vista da cidade, boa comida, e uma ou duas propostas indecentes — comentou, com um sorriso irônico. — Negócios como devem ser.

— Estou pronta. Desde que saiba que não como na palma da mão de ninguém.

— Ainda bem. Prefiro quem vira o jogo inteiro.

Chegamos.

O local era sofisticado, mas intimista. Luzes suaves, música elegante, poucas mesas com gente que cheirava a poder. O tipo de lugar onde olhares valem mais que contratos.

Ele me ofereceu o braço.

Aceitei.

E quando entramos juntos, senti os olhares se voltarem para nós. Não porque eu era “a acompanhante” de Elói.

Mas porque éramos dois predadores. Iguais. E perigosos.

A garçonete nos conduziu até uma mesa com vista privilegiada. A cidade abaixo brilhava como joias espalhadas, mas nada cintilava mais do que a tensão entre nós.

Sentamos. Um garçom elegante nos ofereceu vinho. Elói aceitou por nós dois.

— Cabernet Sauvignon, 2014 — ele comentou, girando a taça. — Forte, encorpado, intenso. Como você.

— Já começou a me comparar com vinho?

— Apenas com os melhores.

Sorri de canto, mas meus olhos o desafiavam. Ele sabia brincar com palavras. Eu, com verdades afiadas.

O jantar começou com entradas leves. Entre goles de vinho e olhares longos, Elói ia desfiando nomes, conexões e interesses dos investidores presentes.

— Aquele é Victor Sahim. Dono de metade dos hotéis de luxo do sudeste asiático. Ao lado dele, Oliver Lopes, especialista em fusões. Vai sondar o projeto de Seul. Mas o que ele quer mesmo... — inclinou-se levemente — é saber até onde eu vou com você.

Arqueei a sobrancelha.

— E até onde você vai?

Ele apenas sorriu, cortando o filé com calma.

— Veremos.

Antes que eu respondesse, uma voz cortou o ar:

— Elói Riveira… sempre chegando com um furacão ao lado.

Virei o rosto. Um homem se aproximava. Alto, moreno, cabelo perfeitamente penteado. Elegância controlada. Mas os olhos... alerta. Curiosos. Afiados.

Elói se levantou, cordial.

— Jonathan Katsu. Não sabia que estava no Brasil.

— Cheguei ontem. Ouvi falar da sua nova aposta... — Olhou diretamente para mim e estendeu a mão. — Sou Jonathan.

— Já ouvi seu nome — respondi, apertando a mão com firmeza. — Mas não contaram se era mito ou ameaça.

Ele sorriu, encantado.

— Depende de com quem se está jogando.

Elói pigarreou, cortando a tensão.

— Ela não está jogando. Está decidindo se assume o tabuleiro.

Jonathan me lançou um olhar malicioso.

— Nesse caso, espero que escolha bem. Porque, nesse meio, nem todo rei protege sua dama. Às vezes, ele a sacrifica.

Frio percorreu minha espinha. Elói, no entanto, permaneceu impassível.

— Boa noite, Jonathan — ele encerrou.

Jonathan se afastou, mas eu sabia… ele voltaria.

Virei-me para Elói, séria:

— Quem é ele, de verdade?

— Um velho amigo. Ou um inimigo íntimo. Depende de como essa história evoluir.

Mais um gole do vinho. Já não era só sobre negócios. Nem sobre desejo.

Era um jogo perigoso. E eu já estava dentro.

O jantar prosseguiu com sorrisos ensaiados e palavras vazias, mas por dentro, eu estava em alerta. Jonathan Katsu não era apenas reputação. Era aviso. E Elói sabia disso.

Do lado de fora, o vento me fez cruzar os braços. Elói, em silêncio, me ofereceu o paletó. Recusei. Não queria parecer frágil — não depois daquele alerta disfarçado.

Entramos no carro. O clima havia mudado. Não era mais provocação e charme. Era outra coisa. Mais densa. Mais séria.

— Vai me dizer quem ele é? — insisti.

— Jonathan? — ele respondeu, calmo. — Já foi meu sócio. Hoje, é um espelho do que eu não quero mais ser.

— E o que você era com ele?

Elói respirou fundo. Os olhos fixos na estrada.

— Jovem demais. Ganancioso demais. Disposto a tudo por poder. Ele nunca superou o fato de que eu saí antes de tudo explodir. Ou antes que ele explodisse tudo sozinho.

— Ele parece saber mais sobre mim do que deveria.

— Porque investiga qualquer ponto vulnerável. E agora, você... é o centro do tabuleiro.

Meu coração disparou. Não de medo. De antecipação.

O carro parou em frente ao meu prédio. Antes que eu saísse, Elói falou:

— Se decidir seguir comigo para Seul, não será só trabalho. Vai precisar confiar em mim. E confiar, às vezes, é correr com os olhos fechados.

— E cair num buraco?

Na cobertura.

Claro que seria na cobertura.

O elevador subiu lento demais. O coração, acelerado demais.

As portas se abriram com um ding suave. Madeira escura, vidro, silêncio. Caminhei até a porta dupla entreaberta. Bati de leve.

— Entre — a voz inconfundível ecoou lá de dentro.

Elói estava de pé junto à janela, de costas para mim. Usava uma camisa azul-marinho, mangas dobradas. O sol se deitava sobre ele como se soubesse a quem pertencia.

Ele se virou devagar, um sorriso discreto nos lábios.

— Vejo que levou a sério o salto alto.

— Disse que não era fácil lidar comigo. Achei justo vir armada.

Ele riu. Um som grave, controlado. Como tudo nele.

— Gosto disso.

— Do quê? — perguntei, aproximando-me.

— De mulheres que sabem a força que têm... e ainda assim não têm medo de arriscar.

O silêncio entre nós era tenso. Quente.

Ele apontou para a pasta sobre a mesa:

— Precisamos revisar alguns pontos do contrato. Mas antes disso... — Aproximou-se. — Me diga: você está aqui por causa do projeto... ou por mim?

Engoli em seco. A resposta estava presa entre o que eu queria dizer — e o que devia dizer.

Talvez... fossem a mesma coisa.

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