O silêncio entre Dominic e Donavan à mesa era denso. O jantar havia esfriado, e a tensão do telefonema ainda pairava no ar. Dominic girava o copo de uísque com lentidão, os olhos fixos em um ponto qualquer da toalha branca.
Foi quando um lampejo cortou sua mente como uma lâmina: Isabella. — Merda... — murmurou, passando as mãos pelo rosto. Donavan o observava com o canto dos olhos, e um sorriso debochado surgiu no rosto dele. — Pior que um tiro... é uma mulher esquecida. Dominic soltou um riso abafado, mais de frustração que de humor. — Com tudo isso... eu simplesmente esqueci que ela estaria me esperando. — Ele se levantou num ímpeto, jogando a guardanapo sobre a mesa. — Vamos. Ainda dá tempo de salvar essa noite. Donavan ergueu-se em seguida. — Isso se a noite não decidir te matar antes. Ambos caminharam para fora do restaurante. O ar noturno estava pesado, quase como um presságio. A brisa carregava um cheiro distante de gasolina e pólvora — ou talvez fosse apenas paranoia. O Knight XV os aguardava com os vidros escuros e os faróis discretamente ligados. Dois seguranças à paisana vigiavam os arredores. Quando Dominic e Donavan estavam a poucos passos do carro, os faróis de um outro veículo se acenderam subitamente na esquina. Um carro preto, janelas escuras. O motor rugiu como um aviso, mas não houve tempo de reação. — Dominic! — gritou Donavan, ao mesmo tempo em que o carro avançava. O primeiro disparo foi seco, rasgando o ar. Os seguranças gritaram comandos, sacaram as armas e tentaram revidar, mas o tiroteio se intensificou em segundos. Dominic puxou Donavan pelo braço, arrastando-o para trás do carro blindado enquanto os estilhaços voavam ao redor. — Baixa! — Dominic gritou, com os olhos faiscando. Outro tiro. Outro. Mais dois. Dominic sentiu uma queimação violenta no ombro esquerdo, mas não parou. Com o corpo já meio caído, empurrou a porta do carro e entrou, seguido por Donavan. O som dos pneus cantando no asfalto foi abafado pelo disparo final. O Knight XV arrancou em velocidade, atravessando o quarteirão enquanto os seguranças davam cobertura e o carro inimigo recuava. Dentro do veículo, Donavan olhou rapidamente para o amigo. Dominic apertava o ombro com a mão direita, os dedos encharcados de sangue. — Você levou um tiro. — disse ele, pálido, mas mantendo o tom firme. Dominic não respondeu. Apenas encostou a cabeça no vidro, com o maxilar travado, o corpo inteiro vibrando de raiva. — Para onde? — perguntou o motorista, pela comunicação interna. — Hospital não. Vá para o galpão da zona portuária. Temos médicos lá. — ordenou Donavan. Depois se virou para Dominic. — Você vai aguentar? Dominic abriu os olhos devagar, forçando um sorriso torto apesar da dor. — Isso não vai me matar. Só me atrasar... E eu detesto me atrasar. Donavan soltou um suspiro, apoiando as mãos nos joelhos. — Alguém sabia que você estaria aqui hoje. Isso não foi acaso. — Um recado. — Dominic respondeu, com os dentes cerrados. — Um maldito recado. O carro seguiu em silêncio por alguns minutos, o som do motor abafado pela tensão. Donavan observava Dominic com um misto de preocupação e respeito. Conhecia homens que desabavam com um tiro. Mas Dominic… Dominic apertava os dentes e pensava em Isabella. Ela estava esperando por ele. E agora, mais do que nunca, ele sentia que colocá-la naquele mundo seria perigoso demais. Ele desviou os olhos para o ombro ferido, o sangue ainda escorrendo por entre os dedos. Um lembrete físico de que ninguém, nem mesmo ele, estava a salvo. — Você vai vê-la hoje ainda? — perguntou Donavan, quebrando o silêncio. Dominic hesitou. — Não sei se devo. — Vai deixá-la esperando? — Estou sujo de sangue, Donavan. Literalmente. — Dominic virou o rosto, encarando o reflexo no vidro. — Ela merece flores, vinho… não isso. Não esse mundo. Donavan o olhou por um instante, depois riu baixo. — Flores murcham. Mas uma mulher como ela… pode suportar tempestades, se estiver ao lado do homem certo. Dominic não respondeu. Apenas fechou os olhos. Sabia que mais cedo ou mais tarde, teria que tomar uma decisão: afastá-la ou torná-la parte da sua vida — mesmo que isso significasse colocá-la em perigo. Mas antes... ele precisava descobrir quem tentou matá-lo. E fazer com que pagassem. O Knight XV avançava pelas ruas desertas até chegar ao galpão na zona portuária, onde homens armados já aguardavam. O portão foi aberto com rapidez, e assim que o veículo entrou, Dominic foi retirado com cuidado pelos braços dos seus seguranças. O sangue havia manchado parte da camisa social e escorria até o cós da calça. Seu rosto estava pálido, mas seus olhos ainda ardiam em fúria. Donavan o segurava firme, mantendo a cabeça do amigo erguida. — Já estamos aqui. Segura firme, irmão. Dois médicos da famiglia se aproximaram. Ambos estavam tensos. Um deles sussurrou algo no ouvido de Donavan, que soltou um palavrão baixo. — Sem anestesia, Dominic. O doutor que você confia está fora da cidade e não vamos arriscar alguém de fora. Dominic assentiu com um olhar de aço. — Tira essa maldita bala de uma vez. Foi deitado numa mesa improvisada, e os instrumentos foram colocados ao lado com rapidez. O cheiro de álcool e metal tomou o ar. Donavan segurava o braço dele, apertando com força para manter Dominic consciente. O som da pinça entrando na carne fez Dominic arquear as costas, o maxilar travado para conter um grito. O suor escorria por sua testa, e os dedos cravavam o metal da mesa. — Aguenta. Tá quase. — disse um dos médicos. Um gemido grave escapou por entre os dentes de Dominic. Em segundos eternos, a bala foi retirada. O médico a ergueu, ainda suja de sangue. — Consegui. Dominic arfava, o peito subindo e descendo com força. Mas não disse nada. Estava exausto. Donavan o ajudou a levantar e o levou até o carro novamente. Dominic tentava alcançar o bolso para pegar o celular, mas Donavan foi mais rápido — tirou o aparelho das mãos dele e guardou no paletó. — Nada de ligações, nada de Isabella. Você vai pra casa e vai descansar. Depois… você fala com sua futura dama. — Donavan… — Dominic tentou protestar, mas sua voz saiu fraca. — Você quer liderar essa famiglia ou morrer antes? — rebateu, sério. — Deixa o orgulho de lado por uma noite. Você é humano, Dominic. Até um rei precisa dormir. Sem escolha, Dominic recostou-se no banco. Pela primeira vez em muito tempo… fechou os olhos, vencido pelo cansaço e pela dor. Mas dentro dele, a raiva só crescia. E a vingança… já estava a caminho.As paredes da casa estavam silenciosas demais para uma noite de Domingo na Sicília. Isabella caminhava pela sala com passos lentos e inquietos, lançando olhares constantes para o relógio pendurado na parede. Os ponteiros marcavam exatamente meia-noite. Ela suspirou fundo, frustrada.— É claro que ele não vem... Homens como ele só aparecem quando querem! — murmurou para si mesma.Sofia havia saído mais cedo com Roberto para uma festa de algum conhecido da família, deixando Isabella sozinha com os pensamentos e a espera. A jovem não fazia ideia do que havia acontecido com Dominic, e isso a deixava ainda mais irritada do que a sua ausência em si.Sentindo o estômago roncar de fome, ela foi até a cozinha e abriu a geladeira. Vasculhou por alguns minutos, fazendo caretas para as sobras de comida ou para os ingredientes que exigiriam tempo e paciência que ela não tinha. Resignada, pegou o celular e ligou para a sua pizzaria favorita.— Uma marguerita grande, por favor. E pode colocar bastan
Dominic despertou com um incômodo no ombro esquerdo. O ferimento ardia levemente, lembrando-o dos últimos acontecimentos. Levantou-se devagar, sentindo o lençol colado à pele pelo suor da noite mal dormida. Passou a mão pelo rosto, tentando dissipar o cansaço e a dor que se misturavam em silêncio. Pegou o celular na escrivaninha ao lado da cama e, ao ver o horário — 9:00 — soltou um suspiro impaciente.Dirigiu-se ao banheiro e girou o registro do chuveiro. A água quente deslizava sobre sua pele como uma tentativa de apagar os rastros da violência da noite anterior. Ficou ali mais tempo do que o habitual, em silêncio, com os olhos fechados, como se esperasse que a água levasse embora o peso em seus ombros — e não apenas o físico.Ao sair, vestindo apenas uma toalha, Dominic encontrou Donavan sentado na poltrona no canto do quarto. Ele segurava um copo de água e uma cartela de remédios. Sem dizer nada de imediato, Donavan se levantou, estendeu o copo e os comprimidos ao amigo e o cumpri
Dominic saiu do carro com passos firmes, o sol da Sicília se escondia atrás de nuvens pesadas, anunciando o mau presságio que ele já sentia no ar. O prédio onde ficava seu escritório era afastado do centro da cidade, discreto por fora, mas fortemente protegido. Era ali que decisões importantes eram tomadas, longe dos olhos curiosos da sociedade.Donavan andava ao lado dele, observando tudo ao redor. Assim que entraram no hall de entrada, Dominic ajeitou os punhos da camisa branca impecável e soltou um suspiro de tédio misturado com tensão. Ele não gostava de reuniões, mas sabia que parte de ser líder da famiglia era ouvir reclamações e controlar egos inflados.— Preciso de alguns minutos, preciso resolver uma ligação urgente. — Donavan falou, afastando-se discretamente.— Tudo bem. Encontre-me lá dentro. — Dominic respondeu seco, já caminhando em direção à sala de reuniões.Ao abrir as portas pesadas de madeira escura, todos os olhares se voltaram
Mesmo com o cansaço do dia arrastando-se por cada músculo de seu corpo, Isabella não conseguia simplesmente se render ao silêncio da noite. Havia algo nela que insistia em sair, respirar, olhar para o mundo lá fora. Era como se o vazio do sofá e a quietude da casa estivessem pressionando demais seu peito. Depois de lavar o rosto e colocar um vestido simples, mas charmoso, ela pegou a bolsa e saiu sem rumo certo, apenas com a ideia de espairecer e talvez tomar um sorvete — sorvete de pistache, seu favorito desde criança. As ruas estavam tranquilas, mas vivas. Algumas famílias passeavam com suas crianças, casais andavam de mãos dadas como se o mundo inteiro se resumissem aos olhares que trocavam. Isabella caminhava devagar, saboreando cada colherada do doce gelado que comprara em uma pequena sorveteria de esquina. Sorriu ao ver um garotinho tentando esconder um brinquedo novo atrás das costas da mãe. Ela não pôde deixar de pensar: "Será que um dia terei isso? Uma famíli
Dominic revirava-se na cama, inquieto. Os minutos pareciam horas, e o sono simplesmente se recusava a vir. A madrugada avançava preguiçosamente, mergulhando a casa em um silêncio quase sufocante. Ao longe, ouvia-se apenas o som sutil das folhas balançando com o vento. Ele se levantou, ainda com o gosto amargo do pesadelo anterior entalado na garganta.Decidiu que revisaria algumas papeladas no escritório, talvez o trabalho o ajudasse a colocar os pensamentos em ordem. Vestiu a parte de baixo de seu pijama, amarrou-o com descuido e caminhou até a escrivaninha onde deixara o celular. Quando a tela acendeu abruptamente, uma sequência de alertas apareceu.Os olhos de Dominic se estreitaram ao ler as notificações. Algo estava errado.Sem pensar duas vezes, pegou a arma que mantinha guardada discretamente na gaveta da cômoda. Seu instinto gritava. Aquele tipo de alerta não era normal.Ao descer as escadas apressado, o coração acelerou ainda mais. Quando chegou à sala, parou no meio do camin
A Sicília sempre foi palco de paixões intensas, promessas perigosas e histórias que desafiam a lógica. No coração dessa ilha banhada por segredos e tradições, Isabella nunca imaginou que sua vida tomaria um rumo tão sombrio e arrebatador. Bastou um olhar. Um encontro. E tudo que ela conhecia desmoronou.Dominic, o homem que carrega o sangue da máfia nas veias, não é alguém que se ama sem consequências. Ele é o tipo de homem que não pede permissão — toma. E ao cruzar o caminho de Isabella, a calma da sua vida foi engolida pelo caos.Ela, com sua doçura e força silenciosa. Ele, com seu passado manchado de sangue e honra. Ambos travados em um destino onde amor e perigo andam lado a lado. Entre flores deixadas pela manhã e jantares interrompidos por tiros, Isabella aprenderá que amar Dominic é dançar na beira do abismo — onde cada passo pode ser o último.Mas talvez... seja exatamente isso que faz o coração bater mais forte.A dor latejava em seus pulsos, amarrados com força demais para p
As luzes da balada piscavam em tons de vermelho e azul, acompanhando o ritmo pulsante da música que ecoava como um coração acelerado. Corpos se moviam ao som da batida, copos tilintavam, risos escapavam por entre a fumaça artificial, e no meio de tudo isso… estava ela.Dominic encostou-se ao balcão com um copo de uísque na mão, o olhar cravado nela como se o resto do mundo simplesmente tivesse deixado de existir.— Você tá obcecado ou apenas entediado? — provocou Donavan ao seu lado, erguendo a sobrancelha ao notar a concentração do amigo. — Porque não é comum te ver tão fixado em alguém.Dominic não respondeu. Apenas ergueu o copo até os lábios, sem tirar os olhos da mulher que dançava no meio da pista. Cabelos soltos, expressão entregue, movimentos sensuais sem serem vulgares. Ela não dançava para chamar atenção, mas por estar sentindo a música… como se naquele instante nada mais importasse.Ele não sabia seu nome ainda, mas já sentia que era dela que viria o caos. A paz nunca o atr
O sol atravessava as cortinas pesadas da sala, insistente como se zombasse da ressaca que tomava conta do ambiente. No sofá, entre almofadas jogadas e garrafas vazias de água, Sofia gemeu alto, apertando as têmporas com as pontas dos dedos.— Ah, minha cabeça... — murmurou, a voz rouca e pastosa. — Por que a tequila parece tão legal na hora e tão maldita no dia seguinte?Com os olhos semiabertos, ela virou o rosto devagar, tentando entender onde estava. Quando reconheceu a sala de Isabella, soltou um suspiro cansado. Seus olhos caíram sobre a amiga, ainda dormindo ali do lado, com a boca entreaberta e a maquiagem completamente borrada, deixando marcas escuras ao redor dos olhos.— Olha só quem virou um panda durante a noite... — disse, soltando um riso fraco.Ela se jogou novamente no sofá, escondendo o rosto no travesseiro, quando de repente a campainha começou a tocar com insistência. Uma, duas, três vezes. Sofia grunhiu.— Não... não, por favor...A campainha tocava como uma marret