Nos dias seguintes, Léo cumpriu sua promessa. Me levava ao médico, me ligava toda noite, me trazia comida mesmo quando eu dizia que não precisava. Era cuidadoso. Presente. Quase perfeito demais.E talvez fosse isso que começou a me incomodar.Algo no olhar dele, nos silêncios longos, nas respostas medidas… era como se ele estivesse sempre a um passo de dizer algo importante — e decidisse, no último instante, engolir a verdade.Eu não era estúpida.Tinha convivido a vida inteira com a manipulação da minha mãe. Sabia reconhecer quando alguém me dava carinho demais, na hora exata, como se tentasse anestesiar minhas perguntas.E eu tinha muitas.Por que Dante tinha sumido tão de repente? Por que não respondia? Por que o Léo sabia tanto sobre o que “ele deveria estar fazendo”, mas nunca dizia onde ele estava? Ou com quem?Na terceira noite em que dormi na casa do Léo — por insistência dele, porque segundo ele “era mais seguro” —, comecei a vasculhar em silêncio. Nada invasivo. Ainda. Apena
O endereço no bilhete me levou até uma rua discreta na zona oeste da cidade, entre prédios comerciais e galpões silenciosos. Era uma manhã nublada, e tudo ali tinha a aparência de algo que preferia não ser notado.Eu desci do carro com o coração acelerado. Não fazia ideia do que estava procurando. Mas desde que Dante desapareceu da minha vida, alguma coisa dentro de mim não conseguia descansar. Não era só saudade. Era inquietação. Instinto.Na fachada discreta do número 927, havia uma porta de metal escura e uma câmera de segurança posicionada bem no alto. Toquei a campainha. Duas vezes.Ninguém atendeu.Quando já estava prestes a desistir, a porta se abriu sozinha. Um homem alto, de terno e fone no ouvido, apareceu no corredor. Me olhou de cima a baixo.— Você é…?— Helena. Estou procurando por… Dante. Acho que ele esteve aqui.O segurança não disse nada por alguns segundos. Depois soltou um suspiro impaciente e pegou o rádio no cinto.— Ela tá aqui. A mulher.Meu corpo congelou.A m
Dirigi sem rumo pela cidade, ignorando os sinais de alerta. Eu não queria pensar nas consequências. A única coisa que me importava era ele, a sensação de perder ele, e a necessidade de saber o que estava acontecendo. Não havia mais espaço pra hesitar.O telefone vibrava no banco do carona, mas eu ignorei. Era Léo, me pedindo pra voltar, me dizendo que não valia a pena. Mas eu já sabia que não valia a pena me afastar. Eu não queria estar sem ele.A estrada à minha frente parecia infinita, mas a neblina me fez perder a visão do caminho. Minhas mãos suavam, a tensão se acumulando em cada centímetro da minha pele. Eu estava tão focada em Dante que não percebi a curva que se aproximava. Quando dei por mim, o carro derrapava descontrolado.O impacto foi ensurdecedor. O carro capotou, e meu corpo foi projetado para o lado, batendo com força no vidro. O silêncio que se seguiu foi pesado. A dor começou a tomar conta de mim, mas era uma dor distante, como se eu estivesse observando tudo de fora
Fiquei sozinha de novo.O silêncio do quarto de hospital parecia mais alto depois que Dante saiu. Eu tentava não chorar, tentava fingir que estava tudo bem. Mas por dentro, era só ruído. Um grito surdo preso na garganta.O monitor apitava em intervalos regulares, como se me lembrasse de que eu ainda estava viva. Mas só o que eu queria era viver com ele. Por ele. Porque mesmo que Dante dissesse que era perigoso, eu sabia — a verdadeira ameaça era não ter ele por perto.Minhas mãos tremiam levemente sobre o lençol. E antes que a solidão afundasse de vez, ouvi um som familiar: passos. Leves, apressados. A porta se abriu de novo.— Helena? — Era minha mãe.Ela entrou com aquele olhar entre o susto e a reprovação. Estava com os cabelos impecáveis, mas os olhos cansados denunciavam que não dormia há dias.— Meu Deus, o que aconteceu com você? — Ela veio até mim, tocando meu rosto com dedos frios e preocupados. — O hospital me ligou… você poderia ter morrido!— Mas não morri — murmurei, tent
A boate Verona seguia pulsando como sempre — luzes vermelhas, fumaça artificial, corpos colados na pista como se a luxúria fosse o único idioma compreendido ali. Mas mesmo em meio ao caos familiar, eu me sentia deslocado.Mel cruzou o salão em minha direção com aquele vestido justo que deixava pouco à imaginação. Morena, pele dourada, olhos puxados e boca carnuda. Um furacão disfarçado de tentação. Ela era tudo que um homem como eu deveria querer — e nada do que eu precisava.— Você sumiu — disse ela, se jogando no sofá da área VIP como se fosse a dona do lugar. — Achei que tinha morrido ou se apaixonado. E nós dois sabemos que você não ama ninguém.Ri sem humor, jogando um gole de uísque garganta abaixo.— Tô resolvendo uns problemas.Ela se inclinou, os dedos arranhando de leve minha coxa.— Posso resolver um deles pra você. Que tal começar por esquecer a loirinha?Meu maxilar travou. Helena.Desde que deixei o hospital, não consegui pensar em mais nada. O jeito como ela me olhou qu
A campainha tocou de novo, insistente. E eu já sabia que era ele.Meu coração disparou antes mesmo dos meus pés tocarem o chão. Cada passo até a porta parecia pesado, como se eu caminhasse em direção a algo inevitável. Quando abri, lá estava ele.Dante.Tão real quanto a dor no meu peito. Tão bonito quanto eu me lembrava — mas mais sombrio, mais contido. O olhar dele carregava um peso que eu reconheci na hora. Culpa. Desejo. Desespero.Fiquei parada, segurando a maçaneta com força.— O que você está fazendo aqui?— Precisava te ver — ele respondeu, a voz rouca, baixa. — Saber como você está.Eu ri. Um riso curto e amargo.— Agora sabe. E aí? Vai embora de novo?Ele não respondeu. Só entrou, como se o silêncio fosse autorização. Fechou a porta com calma, mas o ar entre nós estava longe de ser tranquilo.— Helena…— Não, Dante. Eu entendi. Você quer distância. Você quer me proteger me deixando sozinha. Beleza. Já aceitei isso. Não espero mais nada de você.Meu queixo tremeu, mas eu me m
O sol já atravessava as cortinas do meu quarto quando acordei. Estava nua sob os lençóis bagunçados, o corpo ainda dolorido de prazer, e a presença de Dante era um calor ao meu lado que me fazia sorrir, mesmo de olhos fechados. A noite anterior ainda ardia em mim — cada toque, cada gemido, cada promessa não dita. Ele me teve de um jeito que nenhum homem jamais teve. Corpo, alma, coração. E eu… eu me entreguei inteira.Abri os olhos devagar, sentindo o aroma dele na fronha, no travesseiro, em mim. Dante estava no banheiro, e o som da água caindo no box era reconfortante. Pela primeira vez em muito tempo, eu me sentia segura.Ou pelo menos achava que estava.Me levantei e cheguei na porta do banheiro. Lá estava ele, lindo, musculoso, aquelas tatuagens que o faziam parecer uma obra de arte. Quando ele levantou a cabeça e olhou pra mim, minha respiração parou.— Está gostando do que vê?— Não é de se jogar fora. - Falei como quem não quer nada.— Então vem aqui que vou te mostrar o que nã
A boate Verona pulsava como um organismo vivo. Cada batida da música reverberava dentro do meu peito como se o lugar respirasse junto com a gente. Luzes vermelhas cruzavam o salão, refletindo nos espelhos, no suor dos corpos apertados na pista, nas taças erguidas e nas máscaras que todos usavam ali — inclusive eu.Mas, apesar de todo o caos ao meu redor, eu só conseguia prestar atenção na mão firme de Dante repousando na minha cintura. Seus dedos estavam ali como uma promessa muda. De proteção. De posse. De desejo.Desde que ele bateu na porta do meu apartamento e eu abri, com o coração disparado e os olhos marejados, era como se estivéssemos num daqueles filmes antigos. Onde o mocinho aparecia no último segundo e pedia perdão com os olhos. Só que Dante não era mocinho. E essa não era uma história comum.Mas eu disse sim mesmo assim.Disse sim com o corpo, com os beijos desesperados, com os gemidos abafados naquela madrugada em que nossos corpos se procuraram até o sol nascer. E agora