Donatella
_ Demitida?
O homem coçou a cabeça constrangido. O escritório de advocacia estava falindo, disso ninguém tinha dúvidas, mas a minha surpresa em ser demitida mesmo depois de estar com quase dois salários atrasados, e continuar trabalhando pontualmente me pegou desprevenida.
_ Desculpa Donna.. sinceramente também não sei o que houve. De uns meses pra cá tudo vem ruindo, não entendo o que houve com nossos clientes, eles simplesmente nos abandonaram. Sem falar nos problemas que estamos tendo com processos, honestamente nem sei o que houve, não sabia que tantos funcionários estavam insatisfeitos.
Ele realmente parecia mais perdido do que eu.
_ Eu.. pelo menos vou receber meus dois salários atrasados?
_ S-sim.. eu só não sei quando..
_ Eu preciso de uma data, tenho dois filhos para sustentar!
Minha voz saiu mais irritada do que eu queria. Nunca fui mal educada, nunca levantei a voz para ninguém, porém estava completamente falida. Francis e Elise haviam pego uma virose na semana passada e precisei arcar com custos hospitalares, o restante do meu dinheiro simplesmente sumiu.
O homem na minha frente não disse uma palavra. Ainda era manhã quando sai pelas portas do prédio que estava trabalhando a anos. Fiquei completamente desorientada. Caminhei um pouco sem rumo enquanto enxugava as lágrimas. Andei muito, muito até que me toquei que estava perdida e era meio dia. Sentei em uma praça e peguei meu almoço que estava frio, mas como a barriga estava roncando engoli a comida forçadamente junto com a bola de tristeza que se formava na minha garganta. Depois de chorar mais um pouco abri meu celular e coloquei no g****e maps para descobrir onde estava, e para a minha surpresa estava quase do outro lado da cidade.
Suspirei chateada, procurando um ponto de ônibus mas não achei, então voltei a caminhar.
Essa parte da cidade era meio assustadora, haviam muitas boates e prostíbulos, homens mal encarados e mulheres estranhas. Procurei não olhar muito para os lados, apenas seguir meu rumo, quieta.
Senti que estava sendo seguida. Parece loucura, mas eu realmente me preocupei e apertei os passos. Na primeira oportunidade tentei contornar um prédio passando por um beco, obviamente foi uma péssima ideia, e só me dei conta disso quando sento uma mão agarrando meu braço com força. Fechei meus olhos e tentei estapear quem quer que fosse que estava me tocando.
_ Para! Ei!
A voz conhecida me fez abrir os olhos. Franzi minha testa ao ver a versão mal humorada do meu amigo que vejo quase todos os dias na praça.
_ Mikael?
_ Que porra você faz aqui ?
Sempre muito educado.
_ Eu.. eu to .. eu não sei.
Comentei me sentindo perdida. Ele arqueou uma das sobrancelhas e continuou me encarando.
_ Estava em alguma boate ?_ Perguntou ele do seu jeito sombrio.
_ Que? Óbvio que não, sai fora garoto!
Saí do aperto dele e voltei a caminhar em direção a rua. Mais uma vez Mikael segurou meu braço, isso já estava ficando constrangedor. Olhei para ele esperando alguma explicação.
_ Como você chegou aqui?
_ Caminhando!
_ Veio do outro lado da cidade? Você não deveria estar trabalhando?
_ S-sim.. mas ..
Não queria falar sobre a demissão, só de pensar já sentia vontade de chorar novamente.
ele arqueou novamente a sobrancelha. Sem dúvidas agora vejo muita diferença entre ele e Luan. A simpatia é bem diferente.
Mikael suspirou, largando meu braço. Ele colocou as mãos dentro da jaqueta de couro.
_ Eu levo você de volta. Vem!
Mikael passou por mim e caminhou para o lado oposto ao que eu estava indo.
Me dei por vencida quando observei o céu, a formação de nuvens indicava chuva.
Caminhei rapidamente atrás dele, e quando Mikael entrou dentro da boate de homens mal encarados fiquei estática.
_ Entre, ninguém vai encostar em você! _ Disse ele tentando me encorajar.
_ Eu.. vou esperar aqui fora.
_ Não, você vai esperar aqui dentro. Vem! _ Ele voltou a puxar meu braço e eu fiquei muito irritada.
Se não estivesse com tanto medo dos homens que estavam parados na porta teria discutido.
Andei com Mikael até algumas escadas e subimos.
_ Fica ai, vou pegar minhas coisas. _ Disse ele enquanto sumia em um corredor.
Sentei em um sofá em formato de U e aguardei. Minha curiosidade apitou quando uma música bem sensual com palavras de sedução começou a tocar. Levantei e fui até a mureta, olhando para baixo. Algumas mulheres dançavam em um palco quase semi nuas. Meus olhos arregalaram ao ver homens jogando dinheiro em direção a elas.
_ Nossa, acho que já sei onde vou arrumar trabalho.. _ Murmurei brincando comigo mesma enquanto me concentrava nas inúmeras notas de 100.
_ O que você disse?
Pulei ao ouvir a voz de Mikael, e pra ajudar a me constranger ainda mais, Luan estava ao lado dele com a mesma expressão do irmão mal humorado.
_ Eu.. ahm.. nada._ Falei pigarreando.
_ Se precisar de trabalho eu arrumo um pra você, mas com certeza não vai ser rebolando com os peitos de fora em cima de um palco. _ Disse Luan, agora divertido e leve.
Acabei rindo e negando com a cabeça.
_ Estava brincando.. acho que nunca faria uma coisa dessas. É demais pra mim. _ Meus olhos varreram novamente o chão do palco enquanto as mulheres dançavam, era muito dinheiro..
_ E nenhum clube aceitaria você !
A voz amarga de Mikael me atingiu e olhei para ele semicerrando os olhos.
_ O que ? Por que ?
Ele não me respondeu, apenas me deu as costas. Será que ele me acha uma baranga a ponto de nenhum clube de striptease me querer?
Fiz o mesmo que ele, agarrei seu braço e o fiz me encarar. Seus olhos estavam pegando fogo e quase me arrependi.
_ Escuta aqui, acha que sou feia demais pra dançar com os peitos de fora em uma maldita boate? Você é muito infantil mesmo! _Comecei a descer as escadas.
_ Ei ei espera Dona! _ Gritou Luan enquanto corria atrás de mim.
Gentilmente ele segurou meus ombros e me fez olhá-lo.
_ Não foi isso que Mikael quis dizer.. meu irmão só não soube se expressar direito..
_ Luan, seu irmão é um mal educado completo! _ Falei enquanto olhava por cima dos ombros de Luan e encarava Mikael.
O rosto dele se contorceu de raiva e ele avançou em nossa direção.
_ Mal educado?
_ Sim, um mal educado e infantil!
_ Pois o mal educado aqui deveria ter deixado você caminhar de volta até o outro lado da cidade e ainda pegar chuva, só pra você aprender a ser grata!
_ Grata? Mas que desaforo!
Nossas vozes estavam alteradas e Mikael aparentava estar irritado, mas o que me intrigava era o sorriso de canto que às vezes ele dava. Luan estava me encarando de um jeito estranho também, diria que até fofo.
Me virei marchando em direção a saída.
_ Onde você vai Dona? _ Perguntou Luan.
_ Vou até o outro lado da cidade andando, já que não sou grata! _ Respondi grosseiramente.
Não queria ser grossa com Luan, mas não estava contendo as emoções. Minha vida estava em ruínas, meu emprego havia acabado e o dinheiro também. Não sabia o que me reservava para os dias seguintes e a preocupação em manter meu filhos me deixava triste.
Quando fui sair pela porta dois armários enormes me pararam, colocando-se entre mim e a saída. Engoli o choro, mas algumas lágrimas bobas escaparam.
Os gêmeos pararam atrás de mim e senti a mão de Luan no meu ombro.
_ Venha aqui Dona, me deixe abraçar você. Parece que está tendo um dia difícil..
Disse ele. Não pensei duas vezes e me joguei em seus braços, afundando meu rosto em seu peito. As mãos dele massageavam minhas costas deixando um rastro de conforto e carinho. Estava sendo acolhida pelo homem que conheci na praça.