O aplauso pareceu distante, um som abafado debaixo d'água. Calleb observava as costas de Maria enquanto ela se afastava, elegante e composta, como se os três minutos de valsa não tivessem arrancado uma confissão velada de sua alma. "...sobreviver a este acordo que você aceitou tão facilmente." A frase ecoava em sua mente, colidindo violentamente com a narrativa que ele sustentava há uma década.
Ele precisava de ar. Com um aceno de cabeça brusco para um conhecido, ele se desviou da multidão e caminhou com passos firmes em direção às portas de vidro que levavam a um terraço. O ar frio da noite o atingiu, um alívio bem-vindo para a confusão que fervia em seu peito. Ele afrouxou o nó da gravata borboleta, apoiando as mãos na balaustrada de pedra fria e olhando para as luzes da cidade abaixo.
Passos leves soaram atrás dele. O perfume de lírios. Helena.
"Meu amor, você está bem?", ela disse, a voz um bálsamo de preocupação. Ela deslizou um braço em volta do dele, encostando a cabeça em seu ombro. "Eu vi a dança. Ela é boa. Sabe exatamente como parecer frágil."
Calleb não respondeu imediatamente. Ele olhou para o rosto dela, iluminado pela luz fraca que vinha do salão. Pela primeira vez, ele não viu apenas a mulher que amava, mas a arquiteta de seu ódio. A voz dela, que sempre fora seu porto seguro, agora soava... ensaiada.
"Ela disse algo", ele admitiu, a voz mais rouca do que pretendia.
"Claro que disse", Helena respondeu, um traço de impaciência em seu tom. "É o que ela faz. Ela planta pequenas sementes de dúvida, se faz de vítima para que você se sinta o culpado. É o mesmo jogo que ela jogou conosco anos atrás. Não se deixe enganar."
Mas a semente já havia sido plantada, e não por Maria. Foi a expressão nos olhos dela. Dor. Genuína e inconfundível.
"Acho que preciso de uma bebida." A voz de Gabriel soou ao lado deles, fazendo Helena se sobressaltar. Ele segurava dois copos de uísque. Ofereceu um a Calleb.
"Obrigado", disse Calleb, aceitando o copo e tomando um gole generoso.
Gabriel encostou-se na balaustrada, olhando para o casal. Seu olhar sobre Helena era educado, mas frio como o aço. "Foi uma bela noite", ele comentou, o tom casual. "O noivado parece um sucesso. Todos estão comentando sobre a noiva. Forte, elegante. Não parece o tipo que se faz de vítima."
Helena forçou um sorriso. "Aparências enganam, Gabriel. Ninguém sabe disso melhor do que nós."
"Tem razão", concordou Gabriel, seu olhar se fixando em Calleb. "Enganam mesmo." Ele terminou seu uísque. "Só espero que meu amigo aqui seja inteligente o suficiente para saber a diferença entre um engano e uma verdade que ele se recusa a ver." Ele deu uma batidinha no ombro de Calleb e se retirou, deixando um silêncio pesado para trás.
Helena tentou preencher o vazio com mais palavras tranquilizadoras, mas Calleb mal a ouvia. A pergunta de Gabriel ecoava mais alto. Ele olhou para dentro do salão, para Maria, que agora conversava com seu pai. Ela ria de algo que o velho Maliki dizia, mas o riso não alcançava seus olhos. E ele viu. Não uma vilã, não uma santa, mas uma mulher desempenhando um papel, assim como ele. E pela primeira vez, ele se perguntou quem havia escrito o roteiro dela.