Ainda estava escuro quando a porta do quarto foi abruptamente aberta.
Meu irmão e meu pai entraram às pressas e me deram um tapa no rosto.
— Giselle! A Natália, de boa vontade, foi te fazer uma massagem e você ainda teve a audácia de chutá-la! Você não sabe que ela ainda está doente?
As lágrimas escorreram dos meus olhos ao ver minha família, que me repreendia sem sequer tentar entender a situação. Meu coração doeu ainda mais do que o rosto, onde levei o tapa.
Se algum dia, no futuro, meu irmão e meu pai descobrissem que foi a Natália a responsável pela morte da mamãe, será que se arrependeriam de tudo o que fizeram comigo hoje?
— Você já matou sua mãe quando nasceu, agora quer matar sua irmã também?
— Giselle, como você pode ser tão cruel!
As palavras de meu pai vieram como um golpe, e ele parecia pronto para me dar outro tapa. Talvez tenha notado o quanto eu estava chorando, tão angustiada.
Um traço de hesitação cruzou o rosto do meu irmão.
Ele segurou o braço do papai, impedindo-o.
— Pai, ela está grávida. Deixa pra lá.
Meu pai franziu a testa, mas continuou a me repreender.
— Mesmo que a Natália tenha te machucado sem querer durante a massagem, não era motivo pra você chutá-la! Ela é uma doente!
— Vamos, venha comigo ao hospital pedir desculpas à Natália!
Olhei para eles, amargamente, e sorri:
— Essas queimaduras foram causadas de propósito pela Natália. Eu não chutei ela, ela mesma se jogou no chão de propósito.
Meu irmão e meu pai trocaram olhares. Depois de um momento de surpresa, ficaram longos instantes em silêncio.
No momento em que pensei que talvez estivessem começando a acreditar em mim, meu pai explodiu de raiva.
— Você sempre foi mimada e egoísta, mas pelo menos era honesta. Agora, para fugir da culpa, tem coragem de inventar essas mentiras absurdas!
— A Natália é tão bondosa, jamais faria mal a você!
— Essas feridas no seu braço, qualquer um vê que foi você mesma quem fez pra tentar ganhar nossa compaixão!
Ao ver como meu pai confiava cegamente na Natália, minhas lágrimas se misturaram com uma risada amarga.
Já fazia tempo que eu sabia que eles preferiam a Natália a mim. Eu sabia da resposta havia muito, então por que ainda tentava me defender? Por que ainda me machucava com isso?
— Vamos logo, venha conosco pedir desculpas no hospital!
Meu pai me deu um chute com força.
Uma tontura intensa me atingiu, e desmaiei.
Antes de perder os sentidos, ouvi uma voz aflita:
— Giselle, Giselle, você está bem?
Parecia que Mateus tinha voltado.
Quando abri os olhos novamente,
Minha mão estava enfaixada de novo, e Mateus segurava minha mão com um olhar preocupado:
— Me desculpa por ter chegado tarde. Agora que estou aqui, vai ficar tudo bem.
A palma da sua mão era grande e quente, sua voz transmitia segurança, mas aquilo agora só me sufocava.
Porque sempre que eu era punida por meu irmão e por meu pai, era ele quem vinha me salvar.
Antes, eu achava que Mateus era uma luz na minha vida, mas agora, só consigo ver encenação em toda essa preocupação.
— Ainda é cedo, tenta dormir mais um pouco.
Mateus acariciou suavemente meu rosto, com uma ternura quase surreal.
Eram cinco da manhã.
Ainda era cedo, eu realmente precisava dormir para ter forças para partir.
Meio sonolenta, voltei a dormir. Quando acordei, já eram nove horas.
O quarto estava vazio.
Sorri amargamente. Não me surpreendia que Mateus não estivesse ali, ele certamente tinha ido ao hospital ficar com a Natália.
Era melhor assim, eu poderia ir embora sem ser notada.
Depois de conferir minha bagagem, estava pronta para sair quando meu celular recebeu um vídeo curto da Natália.
No vídeo, Mateus cortava frutas para Natália. Papai perguntou a Mateus se, depois que eu tivesse o bebê, ele se divorciaria de mim. Mateus franziu o cenho:
— Eu não vou me divorciar da Giselle. No passado, errei com ela, mas daqui pra frente vou cuidar dela por toda a vida.
Mateus pediu que não falassem mais em divórcio, pois compensaria sua culpa comigo pelo resto dos seus dias.
Natália enviou uma mensagem zombando de mim:
[Seu marido não se recusa a se divorciar por amor, mas por culpa. Giselle, você nunca terá amor verdadeiro nesta vida, nem de sua família, nem de seu marido. Você não merece!]
As lágrimas caíram novamente.
"Mateus, você algum dia me amou de verdade...?"
"Se esse seu amor é só mentira, eu prefiro não tê-lo."
Peguei minha mala e entrei num táxi.
Enviei anonimamente ao e-mail do Mateus o vídeo que gravei no hospital, no qual Natália admitia que ele havia confundido a pessoa e que ela estava fingindo estar doente.
Depois, enviei anonimamente ao meu pai e ao meu irmão o vídeo da câmera do quarto, gravando Natália confessando ter sido ela a responsável pela morte da mamãe.
Depois de fazer tudo isso, joguei meu celular pela janela.
A partir de agora, começaria uma nova vida.