Capítulo 2
Coloquei o bolo de carne sobre a longa mesa de carvalho da sala de jantar, o aroma pairando no ar como uma promessa esquecida.

Risos ecoavam da sala de estar.

Pai, normalmente enterrado em reuniões do Conselho dos Alfas e na logística da Alcateia Véu de Cinzas, estava sentado confortavelmente, ouvindo com atenção enquanto Eris falava animadamente sobre seu tempo na Academia Acônito.

— Treinamos com o ancião da alcateia, Eldric. — Disse ela, os olhos brilhando. — Ele disse que eu tenho os instintos de uma Alfa nata — forte o suficiente para liderar qualquer alcateia.

Mamãe segurou a mão de Eris, os olhos marejados de emoção.

— Minha menina doce. Você emagreceu, não foi? Precisa descansar mais — muito tempo de treinamento enfraquece sua loba e embota seus sentidos.

Dax estava sentado ao lado delas, ainda descascando castanhas com diligência, como um servo de Beta.

Fiquei em silêncio no limiar entre a cozinha e a sala de estar — observando, nunca convidada.

Aquela sala era quente, iluminada, cheia de vozes e atenção.

Esta sala — a minha — era quieta, escura. Esquecida.

A voz de Eris se ergueu com uma doçura forçada.

— Vera, por que está só parada aí? Ainda está brava comigo por ter arruinado sua cerimônia?

A conversa parou bruscamente.

Três pares de olhos se voltaram para mim como se eu fosse um problema que tinha voltado.

A testa de pai se franziu.

— Vera, venha aqui. Não fique emburrada.

Mamãe me lançou aquele olhar impaciente — o mesmo que sempre surgia quando Eris chorava.

— Você foi quem escolheu aquela data infeliz. Eris tinha acabado de chegar, estávamos todos exaustos da viagem ao aeroporto. Você sabe disso, não sabe?

E então veio a punhalada.

— Se for agir com mesquinharia com sua irmã, então não é filha minha.

Eris arquejou, os olhos arregalados cheios de uma falsa preocupação.

— Mãe, não seja tão dura. A Vera vai se magoar…

Mas o sorriso dela dizia outra coisa.

Ela sabia a data da minha cerimônia. Eu avisei com uma semana de antecedência.

Ela até respondeu:

“Mal posso esperar! Preparei uma surpresa pra você.”

Surpresa, de fato.

Desde que éramos filhotes, Eris sempre dava um jeito de transformar cada situação em um teste — um em que a alcateia precisava escolher.

Eles sempre escolhiam ela.

Até o meu companheiro escolheu ela.

Eu deveria sentir alguma coisa — raiva, traição, tristeza.

Mas havia apenas… silêncio.

— Não estou com raiva.

Essas palavras cortaram a tensão como garras em casca de árvore.

Todos encararam.

Pai piscou.

Mamãe semicerrava os olhos.

Eris inclinou a cabeça, fazendo um biquinho fingidamente confuso.

Eles esperavam um chilique, não serenidade.

O que significava… que sabiam que o que fizeram me machucaria.

Só não se importaram o suficiente para evitar.

Pai soltou o ar e forçou um sorriso.

— Ótimo. Que bom. Somos uma alcateia. Não guardamos rancor.

— Claro. — Eu disse, assentindo com perfeita obediência.

Era a mesma voz que eu usava para falar com os lobos anciãos durante os rituais de lua cheia.

O alívio nos olhos deles foi instantâneo.

Voltaram a dar atenção para Eris.

O jantar começou.

A empregada havia preparado vários pratos além do meu bolo de carne — patas de caranguejo, vieiras ao alho e limão, todos os favoritos de Eris.

— Você está muito magra. — Murmurou pai, enchendo o prato dela.

— Coma mais. Vai precisar de forças antes da prova orquestral. — Completou mamãe, enxugando os olhos novamente.

Dax entrou na conversa com um sorriso.

— Não se preocupe. Se algum daqueles lobos da cidade te der trabalho, arranco a garganta deles.

Eris riu, seu cabelo prateado brilhando sob a luz.

— Não precisa. Eu dou conta.

Todos riram.

Eu comia em silêncio, o calor do bolo de carne fazendo pouco para aquecer o frio dentro de mim.

Então, pela primeira vez naquela noite, mamãe olhou para mim.

Hesitou. Pegou uma colherada do bolo de carne e colocou no meu prato.

— Prova. Não pense que não nos importamos com você só porque damos atenção à Eris. Eu me importo com você também.

As palavras soaram… ensaiadas. Como uma fala de um roteiro que ela já tinha usado muitas vezes.

Olhei para a comida, depois coloquei lentamente os talheres de lado.

— Não. Estou satisfeita.

A expressão dela mudou — primeiro surpresa, depois irritada.

— O que está acontecendo com você ultimamente?

Ela começou a dizer mais, mas Eris de repente levou a mão à garganta, os olhos arregalados.

— Mãe… Eu… Eu não consigo respirar…

A voz dela falhou, o ar faltando.

Cambaleou para trás, derrubando a cadeira.

O pânico tomou conta imediatamente.

— Eris! — Gritou mamãe.

— O que está acontecendo?! — Pai se levantou tão rápido que a mesa tremeu.

Dax já estava ao lado dela, farejando seu pescoço e rosto em busca de sinais de veneno, seus instintos de Beta em alerta total.

— O cheiro dela está disparando — tem algo errado!

Meu coração batia forte no peito, não de medo, mas por causa da ironia silenciosa e retorcida de tudo aquilo.

No meio do caos, ninguém notou que eu permanecia completamente imóvel — apenas observando.

A voz de Vespa sussurrou suavemente na minha mente.

“Ela não está sufocando, Vera. Ela está se transformando. Algo dentro dela está despertando.”

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