Capítulo 5

A porta de vidro estava entreaberta, e o vento frio da noite tocou meu rosto quando a empurrei. Do lado de fora, iluminada apenas pelo brilho da cidade e pelo reflexo suave das luzes natalinas da festa, havia uma mulher.

De costas para mim, apoiada no parapeito, os ombros tremiam enquanto ela soluçava.

Aquilo me pegou desprevenido.

Eu já lidei com todo tipo de emoção em mulheres — paixão, raiva, desejo, até adoração. Mas tristeza genuína? Essa, eu nunca soube administrar. Sempre me causa uma estranha sensação de desconforto… quase dor.

Limpei a garganta, um som discreto, mas suficiente para chamar sua atenção.

Ela virou o rosto de leve. Os olhos estavam cheios de lágrimas, algumas ainda presas nos cílios longos.

E então aconteceu.

Fui atingido por uma coisa que não esperava.

Ela era linda. Não do jeito ensaiado, cheio de glitter e artifícios, como as mulheres com quem eu costumava me envolver. Não. Havia nela algo cru, real… que me provocou uma necessidade súbita de protegê-la. Algo inédito.

— Desculpe interromper — minha voz saiu mais suave do que eu tinha planejado, mas não perdi o charme —. Está muito frio para ficar aqui fora.

Ela me encarou. Por um instante, pareceu decidir se devia ou não responder. Então passou a mão pelo rosto, tentando apagar os vestígios das lágrimas.

— Quem… quem é você? — perguntou.

A voz dela saiu rouca, mas ainda carregava curiosidade. Dei um sorriso de canto e me inclinei levemente contra o parapeito, ao lado dela.

— Digamos que sou uma espécie de enviado especial do Polo Norte. — apontei para a fantasia de Papai Noel que usava — Estou aqui para garantir que todo mundo esteja se comportando bem.

Ela soltou uma risada baixa, quase imperceptível, mas eu notei. Um pequeno alívio em meio ao peso que ela carregava.

— Sério? — perguntou, arqueando uma sobrancelha enquanto cruzava os braços, tentando se aquecer.

— É claro. — respondi com um sorriso enigmático, inclinando a cabeça. — Você, por outro lado, não parece estar na lista de travessuras… mas definitivamente precisa de um pouco de alegria natalina. Posso ajudar?

Ela balançou a cabeça, desviando o olhar. As lágrimas ameaçavam voltar.

— Eu não sou exatamente fã do Natal. Não mais.

Senti a curiosidade se acender em mim, mas resisti ao impulso de pressioná-la. Em vez disso, recuei um pouco, deixando que o silêncio falasse por mim. Depois de alguns segundos, acrescentei suavemente:

— Você não precisa falar nada. Mas, se precisar de alguém para ouvir… eu sou um excelente ouvinte. E meu anonimato vem garantido com o traje.

Ela me olhou de novo, e havia algo naquele olhar — dor, desconfiança, mas também um estranho alívio — que fez com que eu sentisse aquele impulso de novo. Não era só atração. Era algo mais. Uma necessidade quase irracional de ser mais do que apenas o galanteador habitual.

— Você não respondeu. — disse ela, apertando a barra da fantasia contra si, vulnerável. — Quem é você de verdade?

Sorri, inclinando-me um pouco mais perto, mas mantendo o mistério.

— Quem eu sou não importa. O que importa é que você é linda demais para estar aqui sozinha.

A resposta pareceu bastar, pelo menos por enquanto. Vi seus ombros relaxarem levemente. E, pela primeira vez naquela noite, percebi que eu não estava pensando em mim mesmo. Não estava calculando, nem medindo minhas palavras. Só estava ali.

E talvez… talvez eu estivesse gostando disso.

Mas antes que ela pudesse perguntar mais alguma coisa, o som distante da música e das vozes me puxou de volta à realidade. Eu tinha outro lugar para estar, outra cena para encenar.

Engoli em seco, afastando-me devagar.

— Preciso ir — murmurei, sem dar explicações.

Deixei-a ali, na sacada, com aquela sensação estranha grudada em mim. Uma sensação que eu não sabia nomear, mas que já estava bagunçando tudo.

PONTO DE VISTA DE OLIVIA

A porta de vidro da sacada se fechou atrás de mim com um clique suave, abafando o frio da noite. Ainda assim, um arrepio persistia na minha pele. Não era só o vento gelado que havia ficado lá fora. Era algo mais profundo, visceral, uma mistura de choque e… algo que eu não conseguia explicar.

Encostei-me brevemente no parapeito, como se precisasse de um apoio invisível para manter os pensamentos organizados. A cena de instantes atrás se repetia na minha cabeça sem trégua.

O estranho vestido de Papai Noel.

Aquele sorriso intrigante.

As palavras que, de alguma forma, atravessaram a espiral de solidão que vinha me consumindo há meses:

“Você é linda demais para estar aqui sozinha.”

Fechei os olhos. A frase ecoava dentro de mim, reverberando até onde eu não queria tocar. O peito apertou. O estômago revirou.

Eu mal o conhecia. Não sabia quem ele era, o que fazia naquela festa ou por que havia parado diante de mim. Ainda assim… havia algo em sua voz, em seu olhar, que parecia diferente. Sincero. Como se, por um instante, ele tivesse realmente se importado.

E o pior — ou talvez o melhor — era o calor que ainda queimava em mim quando me lembrava dele. O jeito como sorriu, como manteve distância suficiente para me dar espaço, mas também firmeza suficiente para não me deixar escapar por completo.

Eu me odiei naquele momento. Como poderia, depois de tudo o que passei, sentir uma atração tão repentina… tão absurda… por um completo desconhecido?

Mas não era só isso. O que realmente me desconcertava era a gentileza dele. A forma como percebeu meu estado sem que eu tivesse de dizer uma única palavra. Era como se, por um instante, o peso que eu carregava tivesse sido dividido — ainda que por um estranho vestido de Papai Noel.

Respirei fundo, endireitei os ombros. Ele havia ido embora tão de repente, como se fizesse parte daquele mistério todo. Talvez fosse melhor assim. Talvez eu não devesse saber mais nada sobre ele.

Caminhei de volta para o salão. A música e as luzes explodiram contra mim, quase opressivas, como se me empurrassem para um mundo ao qual eu já não sentia que pertencia. A festa estava em pleno vapor: risadas altas, gente dançando como se nada mais existisse além daquela noite.

E eu, com o coração ainda em guerra.

Meu olhar procurou instintivamente por Sophie, e não demorou muito para encontrá-la perto do bar. Ela olhava ao redor com uma expressão preocupada, o cenho franzido até me ver.

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