Capítulo 2

Ruby

Dois meses. Sessenta dias morando naquela mansão cinza e silenciosa, dormindo sozinha naquela cama enorme, acordando com o lado dele sempre frio e intocado. Ethan cumpriu cada palavra da noite de núpcias: nunca me tocou. Nem um beijo no rosto, nem um abraço rápido, nem mesmo um toque acidental. Nada.

Mas ele também não me tratava mal.

Pelo contrário. No dia seguinte ao casamento, já havia um cartão black com meu nome em cima da cômoda, limite ilimitado. Um Mercedes preto com motorista esperando na porta toda manhã. Quatro seguranças que me seguiam para todo canto sem eu pedir. Quando fiz vinte e dois anos, três semanas depois do casamento, um buquê de cem rosas vermelhas apareceu na sala com um cartão que só dizia:

— “Parabéns. E.”. — Sem beijo, sem abraço, sem festa. Só as flores e o ponto final.

Eu tentava entender aquele homem. Às vezes, tarde da noite, eu ouvia a voz dele no corredor, falando baixo no telefone. E ele ria. Um riso rouco, verdadeiro, que nunca saiu pra mim. Eu encostava a orelha na porta do quarto e tentava captar pedaços.

— “Claro que sinto sua falta… amanhã à noite eu passo aí… também mal posso esperar.”

A voz ficava mais suave, quase carinhosa. Eu apertava o peito e voltava pra cama chorando baixinho.

Uma noite estávamos jantando juntos, coisa rara. A mesa enorme, só nós dois, os empregados já tinham saído. Eu tomei coragem e perguntei:

— Ethan… você já amou alguém de verdade?

Ele parou o garfo no meio do caminho, limpou a boca com o guardanapo devagar e me olhou direto.

— Já. E continuo amando.

O mundo parou. Senti o estômago embrulhar, o garfo pesar na minha mão.

— Quem é ela? — minha voz saiu mais fraca do que eu queria.

Ele nem piscou.

— Astrid Laurent.

O nome bateu como um tapa. Eu já tinha ouvido falar dos Laurent, família francesa que controla metade dos cassinos da Europa. Astrid era a filha única do patriarca. Loira, alta, perfeita. Eu já tinha visto fotos dela em revistas de fofoca ao lado de Ethan, antes do nosso casamento.

— Ela é… a mulher que te ajudou a trazer os cassinos pra Inglaterra — eu repeti, como se precisasse confirmar.

— Exatamente. — Ele voltou a cortar o filé como se tivesse comentado sobre o tempo. — O casamento com você foi um acordo de negócios, Ruby. Eu nunca menti sobre isso. Mas eu nunca vou permitir que ninguém te falte com respeito. Nem ela, nem ninguém. Você carrega meu nome agora.

Em vez de me consolar, aquelas palavras me rasgaram por dentro. Ele estava me dizendo, com todas as letras, que eu era só o papel. A esposa de fachada. A mulher que ele protegia porque era “certo”, mas que nunca ia desejar.

Naquela noite eu decidi que ia lutar.

Comecei a me arrumar mais. Vestidos justos, decotes, salto alto dentro de casa. Perfume caro que eu mesma comprava com o cartão dele. Passava na frente do escritório dele balançando o quadril, fingindo que ia pegar um livro na estante. Ele nem levantava os olhos do computador.

Nada funcionava.

Até que uma noite choveu forte. O trovão sacudia as janelas da mansão inteira. Eu não aguentei mais. Coloquei a camisola de seda preta mais curta que encontrei, sem nada por baixo, cabelo solto, lábios vermelhos. Desci as escadas descalça e bati na porta do escritório dele.

— Entra — a voz grave veio do outro lado.

Eu abri. Ele estava de camisa preta, mangas dobradas, sentado na poltrona de couro, copo de uísque na mão, olhando a chuva pela janela enorme. Quando me viu, arqueou a sobrancelha.

— Tá tarde, Ruby.

Eu fechei a porta atrás de mim e caminhei até parar na frente da mesa dele.

— Eu sou sua esposa, Ethan.

Ele largou o copo devagar, se recostou na cadeira e me encarou. Os olhos desceram pelo meu corpo, pela seda colada na pele, pelas pernas de fora, e voltaram pro meu rosto. Nenhum músculo do rosto dele se moveu.

— Eu sei quem você é — ele respondeu, calmo.

Eu respirei fundo, sentindo o coração bater tão alto que parecia que ele ia ouvir.

— Então me trata como esposa. Uma vez só. Me toca. Me beija. Me faz sentir que eu existo pra você.

Ele se levantou. Devagar. Veio andando até parar a poucos centímetros de mim. O calor do corpo dele me envolveu, o cheiro de uísque e perfume caro me deixou tonta. Ele era tão alto que eu precisei erguer o rosto inteiro pra encarar aqueles olhos cinza.

— Ruby… — a voz dele saiu mais baixa, quase perigosa. — Eu já tenho outra mulher na minha cama. Toda noite. E não é você.

Eu senti as lágrimas queimarem, mas segurei.

— Eu não ligo. Só uma noite. Eu juro que depois eu paro de te incomodar.

Ele segurou meu queixo com força, me obrigando a manter o olhar preso no dele.

— Escuta bem o que eu vou te dizer. — O polegar dele roçou meu lábio inferior, quase carinhoso, quase cruel. — Em respeito ao nosso nome, eu nunca vou deixar ninguém saber do meu caso com Astrid. Você nunca vai ser humilhada em público. Nunca vão apontar pra você na rua e dizer que a esposa do Ethan Storm é corna. Isso eu te prometo. Mas do que isso você não terá de mim.

Eu tremi inteira. As lágrimas escaparam.

— Mas aqui dentro de casa… — ele continuou, a voz mais baixa ainda — você nunca vai ser ela. Nunca vai ser a mulher que eu desejo. Então para de tentar. Para de se machucar. Eu não valho isso.

Ele soltou meu rosto como se eu o machucasse. Deu um passo pra trás.

— Vai dormir, Ruby.

Eu não consegui me mexer. As pernas moles, o peito doendo tanto que parecia que ia explodir.

— Eu te odeio — sussurrei.

Ele deu um sorriso triste, quase imperceptível.

— Ótimo. Odeia. É mais fácil assim.

Eu virei e saí correndo, a camisola grudando no corpo por causa da chuva que entrava pelas janelas abertas do corredor. Cheguei no quarto, bati a porta e me joguei na cama.

Eu queria odiar ele de verdade. Mas quanto mais ele me afastava, mais eu queria me jogar nos braços dele.

Naquela noite eu entendi que estava perdida. Eu já amava Ethan Storm. E esse amor ia me destruir.

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