Mundo de ficçãoIniciar sessãoO silêncio que ficou depois parecia mais pesado do que as tarefas da fazenda.
Isabella colocou a cesta no chão e se aproximou do rapaz.
— Não ligue para ele. Ele é duro, mas no fundo... — No fundo ele acha que eu não pertenço a este lugar. — cortou Rafael, a voz amarga.Ela suspirou, tentando encontrar as palavras certas.
— Talvez ele só precise ver que você não vai embora no primeiro tropeço. Rafael olhou para o horizonte, onde o sol já se erguia, queimando o céu com tons de laranja. — Então é isso que vou fazer. Não vou desistir. Nem da fazenda... nem da música.ₓ
O sol mal havia surgido quando Rafael foi chamado para uma tarefa que ele sabia ser mais difícil do que qualquer trabalho até então: conduzir o rebanho de vacas do celeiro até o pasto, atravessando o terreno irregular e contornando o riacho que serpenteava pelo meio da propriedade.
Seu Anselmo observava à distância, apoiado na bengala, os olhos atentos a cada movimento. Isabella estava próxima, silenciosa, mas o olhar curioso dizia que ela acompanharia cada passo dele. — Rafael, — começou o avô, com a voz firme — aqui não tem espaço para hesitação. Se uma vaca fugir, é sua responsabilidade. O rapaz engoliu em seco e respirou fundo. — Entendi, senhor. Ele se aproximou do rebanho. As vacas, grandes e pesadas, olhavam desconfiadas para o estranho que tentava guiá-las. Rafael lembrou das instruções de Isabella: movimentos suaves, calma e confiança. — Vamos lá, meninas... — murmurou, estendendo os braços.No começo, a tarefa parecia impossível. Uma vaca empurrou a outra, outra tentou desviar pelo caminho mais difícil, e Rafael quase perdeu o controle.
Seu Anselmo bufava impaciente:
— Mais firme! Não é brincadeira, rapaz! Isabella se aproximou discretamente. — Lembre-se, respire. Elas sentem medo, não força. Rafael fechou os olhos por um instante, respirou fundo e voltou a concentrar-se. Com paciência, começou a conduzir o rebanho, ajustando a posição, usando gestos suaves e falando com calma. Uma a uma, as vacas começaram a seguir, até atravessarem o riacho sem derrapar.Seu Anselmo, que estava parado há minutos, soltou um assobio baixo.
— Bom... não esperava que fosse conseguir. — sua voz estava menos ríspida, com um toque de aprovação. — Você provou que sabe se adaptar. Mas ainda falta disciplina, rapaz.
Rafael sorriu, aliviado, mas ainda sentia o peso do julgamento. — Obrigado, senhor. Eu vou continuar tentando. Isabella se aproximou, sorrindo. — Eu sabia que você conseguiria. Só precisava acreditar em você mesmo. Rafael olhou para ela e sentiu algo diferente: a sensação de pertencimento, algo que a cidade nunca tinha lhe dado. — Parece que a fazenda vai me ensinar mais do que eu imaginava. — disse ele, meio rindo, meio sério. Seu Anselmo cruzou os braços, observando o filho adotivo da terra. — Talvez... mas lembre-se, sonhar é bom, mas trabalho duro mantém você vivo.Enquanto o sol subia e dourava os campos, Rafael sentiu uma mistura de cansaço, orgulho e determinação. Ele sabia que ainda havia muito a provar — para o avô, para Isabella e para si mesmo.
Mas, pela primeira vez, sentiu que poderia enfrentar qualquer desafio que a fazenda colocasse à sua frenteₓ
O sol castigava a terra desde cedo. O ar quente tremulava sobre a estrada de chão batido, e o cheiro de grama recém-cortada misturava-se ao perfume adocicado das frutas maduras no pomar.
Rafael vinha pelo caminho com um saco de sementes pendendo do ombro. Seus músculos ainda protestavam por causa do desafio das vacas, mas ele não reclamava — no fundo, aquela dor tinha gosto de vitória.— Rafael! — a voz de Isabella atravessou o calor da manhã.
Ele levantou o rosto e a encontrou debaixo de uma macieira. Os cabelos soltos balançavam com o vento leve, e os braços estavam ocupados com um cesto cheio de maçãs vermelhas. A visão dela naquele cenário parecia saída de um quadro simples, mas bonito.
— Precisa de ajuda com esse saco? — perguntou ela, arqueando a sobrancelha.
Ele ajeitou o peso sobre o ombro, tentando parecer firme. — Só se você prometer não rir se eu deixar tudo cair. — Ah, então é melhor não prometer nada. — retrucou, rindo — Mas se cair, eu ajudo.Rafael sorriu de volta, e pela primeira vez desde que chegara, sentiu-se realmente à vontade.







