Inicio / Lobisomem / LYRIA — A Filha do Destino / CAPÍTULO 1 — A LUZ NA PONTE
CAPÍTULO 1 — A LUZ NA PONTE

A noite estava tão silenciosa que Lyria ouviu o próprio coração enquanto atravessava a ponte. A madeira rangia sob seus pés, e o vento gelado cortava o rosto como lâmina. Ela apertou o casaco contra o corpo e acelerou. Estava tarde, e o vale sempre parecia diferente depois do último sino da igreja.

Diferente… e estranho.

O terceiro degrau rangeu mais alto do que o normal. Ela parou, olhando para trás por instinto. Nada. Só escuridão e o reflexo fraco da lua na água.

— Para com isso, Lyria — murmurou para si mesma. — O vale é só um vale.

Tentou convencer o corpo, mas o arrepio não passou.

Quando deu o próximo passo, sentiu — de novo — a sensação de estar sendo observada. Não era medo vazio. Era algo físico, como uma pressão nas costas, um aviso.

O telefone vibrou no bolso.

Mensagem do pai:
Anda. A ponte não é lugar pra ficar parada a essa hora.

Ela revirou os olhos e guardou o celular, mas caminhou mais rápido.

Foi quando sentiu.

Um calor repentino contra o peito. Bem no centro.

Ela levou a mão ao local e encontrou a corrente.

O medalhão.

Aquele maldito medalhão que ela nem lembrava de ter colocado quando saíra para estudar naquela tarde.

A pedra esquentou. Depois pulsou. Um brilho fraco atravessou o tecido da blusa.

— Ei… para com isso — ela resmungou, apertando o pingente entre os dedos.

Mas a luz aumentou.

Uma explosão curta, prateada, iluminou a ponte inteira por menos de um segundo — mas foi o suficiente para revelar que ela não estava sozinha.

Uma figura parada no fim da ponte.

Alta. Imóvel. Ombros largos. Capuz cobrindo parte do rosto.

Lyria congelou.

O medalhão tremeu na mão dela.

— Quem está aí? — ela chamou, a voz mais firme do que se sentia.

A figura não respondeu. Não se moveu. Apenas… ficou ali. Como se estivesse esperando.

A garganta dela secou.

O vento parou. Literalmente.

O vale ficou completamente mudo.

— Lyria! — o pai gritou de longe. — Agora!

Ela piscou. O som do mundo voltou. A água corria, o vento voltou a soprar, folhas bateram umas nas outras.

Mas a figura tinha desaparecido.

Sumiu.

Sem passos.

Sem sombra.

Sem barulho.

Lyria correu até a outra margem sem olhar para trás.


O pai já estava na varanda, de braços cruzados.

— Tá demorando pra quê? — ele reclamou, puxando-a para dentro. — Eu te disse pra não ir estudar tão tarde.

— Pai, tinha alguém na ponte — ela disse, ainda ofegante. — Alguém parado. Me olhando.

Ele travou por meio segundo. Quase imperceptível. Mas ela viu.

— Deve ter sido um turista perdido — respondeu rápido demais. — O povo vive entrando onde não conhece.

— Pai, ninguém some daquele jeito! — ela insistiu. — Um segundo estava ali, no outro… nada.

A avó apareceu na porta da cozinha.

— Fecha a porta — ela ordenou.

O pai obedeceu sem discutir. Enganchou o trinco com força.

Lyria franziu o cenho.

— Vocês estão… estranhos.

A avó encarou o peito dela.

— O que tem aí?

Lyria instintivamente cobriu o medalhão com a mão.

— Nada. É só um colar que encont—

A velha atravessou a sala mais rápido do que alguém da idade dela deveria conseguir.

— Mostra.

Lyria hesitou. Mas o medalhão pulsou de novo, como se respondesse à avó.

Ela puxou a corrente.

O silêncio que se seguiu foi pesado.

O pai empalideceu. A avó deu um passo para trás. E pela primeira vez na vida, Lyria viu um medo real nos olhos dos dois.

— Onde você pegou isso? — o pai perguntou, a voz baixa.

— Apareceu no meu quarto hoje de manhã — ela respondeu. — Eu pensei que era alguma lembrança da mamãe que vocês tinham guardado. Eu—

— A sua mãe nunca deixaria isso com você — a avó cortou. — E se estava no seu quarto… é porque voltou pra você.

— Voltou? Como assim voltou? — Lyria riu nervosa. — Vocês dois enlouqueceram?

A avó ignorou.

— Desde que horas isso está com você?

— Desde cedo.

— E brilhou agora?

Lyria assentiu, sem coragem de mentir.

— Na ponte — disse. — Foi forte. Uma luz prateada. E depois aquela pessoa…

A avó e o pai trocaram um olhar grave.

— Ele achou ela — a avó murmurou.

Antes que Lyria pudesse perguntar o que aquilo significava, três batidas firmes soaram na porta.

As três ao mesmo tempo prenderam a respiração.

O pai caminhou devagar até a janela, levantou a cortina só o suficiente para ver lá fora — e empalideceu mais ainda.

— Não abre — ele disse. — Não abre de jeito nenhum.

— Quem é? — Lyria sussurrou.

A avó respondeu antes do pai.

— O guardião.

A porta bateu outra vez.

— Abra — disse uma voz masculina. Firme. Controlada. — Eu não vim para machucar ninguém.

O pai hesitou.

A avó fechou a mão.

Lyria sentiu o medalhão vibrar.

— A gente não confia nele — o pai murmurou.

— Ele veio por causa dela — a avó rebateu.

Lyria sentiu os dois a encararem.

— Eu estou aqui, tá? — ela disse. — Alguém por favor me explica o que está acontecendo?!

A porta bateu a terceira vez.

— Lyria Kaelith, abra a porta. — A voz agora disse seu nome. O nome que ela nunca contou a ninguém. O nome que não sabia que tinha.

Seu corpo inteiro gelou.

— Meu nome não é esse — ela sussurrou.

A avó engoliu em seco.

— É. Esse é o nome que sua mãe te deu.

A porta rangeu.

O trinco começou a tremer, sozinho.

— Não temos tempo — a voz do lado de fora disse. — Se eu não entrar agora, eles vão chegar primeiro.

— Eles quem?! — Lyria quase gritou.

O pai a puxou para trás.

A avó se posicionou entre a porta e a neta — como alguém pronto para lutar, mesmo sabendo que não venceria.

A luz do medalhão acendeu.

Forte.

Forte demais.

O trinco se soltou.

A porta abriu com violência.

E a figura que Lyria tinha visto na ponte entrou.

Capuz. Olhos prateados. Marca brilhando no pulso. E um olhar que parecia atravessá-la inteira.

Ele olhou direto para ela.

— Finalmente te encontrei.

Lyria recuou um passo involuntário.

— Quem é você? — ela perguntou, a voz tremendo.

Ele ergueu o rosto.

— Meu nome é Kael — disse. — E você precisa sair daqui agora, antes que o vale deixe de existir por sua causa.

O medalhão vibrou como se confirmasse.

E o vale, lá fora, começou a tremer.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP
Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP