LYRIA — A Filha do Destino
LYRIA — A Filha do Destino
Por: Anne Vellencourt
PRÓLOGO

A floresta estava escura demais para uma noite comum. Não havia animais, nem vento, nem som. O silêncio parecia anunciar apenas uma coisa: eles estavam próximos.

Ela corria.

Os pés batiam no chão úmido, o coração disparado, a respiração curta. O medalhão preso em sua mão brilhava em pulsos rápidos — como se alertasse que o tempo estava acabando.

Um estalo ecoou atrás dela.

Ela olhou por cima do ombro e viu as sombras se levantando entre as árvores. Altas, tortas, se moviam como fumaça presa num corpo. O ar ficou gelado.

— Não hoje… — ela murmurou, acelerando.

O caminho estreito levou até uma clareira circular. No centro, o ar tremulava como se estivesse sendo rasgado. Uma luz azulada se espalhava no chão, iluminando as pedras antigas.

O portal.

Ele nunca estivera tão instável.

Ela correu até ele. O medalhão reagiu, brilhando mais forte. A luz dentro do portal aumentou, puxando o vento para dentro da fenda como um redemoinho.

Mas o som atrás dela fez seus cabelos arrepiarem.

Passos.

Pesados.

Vários.

Ela se virou rápido.

A primeira criatura saiu da escuridão — magra, comprida, sem rosto, apenas dois rasgos prateados onde deveriam ser olhos. Outras surgiram logo atrás.

Ela apertou o medalhão com força.

— Vocês não podem tê-la — ela disse.

A voz da criatura não veio da boca. Veio do ar.

Ela pertence ao outro lado.

A mulher deu um passo para trás, aproximando-se do portal.

— Não enquanto eu respirar.

As sombras avançaram.

Ela levantou o medalhão. A pedra estourou numa luz prata que cortou o chão como uma lâmina. As criaturas recuaram, gritando agudo, mas não pararam. Elas nunca paravam.

A mulher virou-se para o portal. A luz puxou seu braço para frente, como se pedisse o medalhão. Era agora. Era a última chance.

— Me ajuda… só mais uma vez — ela sussurrou.

A pedra respondeu com outro pulso intenso.

Ela encostou o medalhão na rachadura.

Um estrondo atravessou a clareira. A luz explodiu, empurrando tudo para longe. O portal se abriu completamente por um segundo — um único segundo — revelando a cidade do outro lado: torres escuras, céu manchado, soldados correndo.

E então começou a fechar.

A mulher caiu de joelhos. A energia drenava seu corpo como se arrancasse sua vida pela pele. Ela não soltou o medalhão.

Atrás dela, uma criatura gritou:

A herdeira precisa cruzar!

— Ela não vai — a mulher respondeu, firme. — Nunca pela mão de vocês.

O portal fechava rápido. A luz diminuía. O tempo acabava.

Ela levou a mão ao ventre — uma barriga pequena, mas suficiente para lembrar a razão de tudo. Lá dentro, a criança se mexeu.

— Você vai viver — ela sussurrou. — Mesmo sem mim. Mesmo longe do seu mundo.

Um galho quebrou perto.

Alguém chegou.

Mas não era criatura.

Eram soldados — guerreiros do próprio reino dela. Armaduras prateadas, lanças de energia, máscaras escuras. Eles cercaram a clareira com passos firmes.

Na frente deles, veio o comandante. Alto, rígido, com olhos frios que brilhavam igual ao medalhão.

— Você desobedeceu o conselho — ele disse. — Abriu o portal sozinha. E tentou salvar a criança.

— Ela é minha filha — a mulher respondeu, sem medo.

— Ela é uma herdeira — o comandante rebateu. — E herdeiros pertencem ao reino.

Ela segurou o medalhão junto ao peito.

— Não enquanto eu viver.

O comandante ergueu a mão. A lâmina de luz se formou ao redor do punho.

— Você não deixa escolha.

A criança chutou dentro dela. A mulher fechou os olhos por um instante — um único segundo de despedida silenciosa.

Quando abriu de novo, olhou não para o comandante, mas para o garoto parado atrás dele.

Um menino de uns onze anos, olhos prateados idênticos aos dela, marca recém-gravada no pulso — símbolo de guardião. A expressão dele era assustada, mas firme.

Ela o reconheceu.

E ele a reconheceu.

— Kael… — ela chamou, com a voz fraca.

O garoto engoliu em seco. O comandante virou-se para ele por instinto, e foi nesse instante que a mulher falou:

— Quando ela despertar… proteja. Mesmo que precise mentir. Mesmo que precise ser duro. Mesmo que precise enfrentá-los. Proteja minha filha.

Kael apertou os punhos, o olhar tremendo.

O comandante avançou.

A mulher fez força. Toda que tinha. Encostou o medalhão no chão, bem no limite onde o portal fechava. A pedra brilhou mais uma vez — uma última vez.

A luz prateada engoliu tudo.

O portal se fechou com um estrondo tão forte que derrubou metade dos soldados.

Quando a poeira baixou, ela estava caída no centro da clareira.

Ainda respirava.

Por dois segundos.

Depois, não mais.

O medalhão sumira.

Os soldados se espalharam, desesperados. O comandante rugiu ordens. A clareira tremia, como se o mundo tivesse sentido a morte.

Kael ficou parado, olhando o corpo dela.

O comandante colocou a mão no ombro do garoto.

— Você viu onde o medalhão foi parar?

Kael fechou os olhos.

Ele viu.

E sabia exatamente para onde seguia.

— Não — respondeu.

O comandante estreitou os olhos.

Kael manteve a voz firme:

— O portal fechou rápido demais. Não deu para ver nada.

Foi a primeira mentira do garoto.

Mas não seria a última.

Porque naquele instante, ele sabia:

A herdeira havia escapado.

E um dia, ele teria que buscá-la. Viva ou morta.

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