Inicio / Romance / Isabela, a esposa inesperada / Silêncio que Grita parte 2
Silêncio que Grita parte 2

Isabela, por sua vez, nunca cobrava. Nunca exigia nada de mim. Não me pedia ajuda, não me exigia presença, não me lançava olhares de cobrança ou palavras veladas. Cuidava de Ana como se fosse sua missão solitária, como se tivesse aceitado que aquele papel era só dela — e talvez por isso eu começasse a enxergá-la com outros olhos. Era impossível ignorar a força silenciosa com que ela sustentava aquele novo mundo que agora era nosso, mesmo que eu insistisse em fingir que não fazia parte dele.

Houve uma madrugada em que acordei com o choro de Ana. O som era agudo, insistente, e cortava o silêncio da casa como uma lâmina. Levantei-me por instinto, sem pensar, como se meu corpo tivesse agido antes da mente. Quando cheguei ao quarto, encontrei Isabela sentada na poltrona de amamentação, os cabelos soltos em desalinho, a camisola simples caída no ombro, revelando mais do que deveria. O rosto cansado não apagava a beleza suave que se acentuava na maternidade. Havia nela uma serenidade que me desconcertava.

Ela me olhou surpresa, talvez esperando uma crítica, um comentário ácido, uma frase fria que a colocasse de volta no lugar que eu sempre impus. Mas eu não disse nada. Apenas fiquei ali, encostado no batente da porta, observando em silêncio.

— Volte a dormir, Pedro. Eu cuido dela. — sua voz era baixa, calma, quase um sussurro, como se não quisesse acordar a casa, como se não quisesse me provocar.

Eu quis responder, mas as palavras não vieram. E naquele instante, percebi: o silêncio falava mais alto do que qualquer frase que eu pudesse pronunciar. Era um silêncio carregado, denso, cheio de tudo o que eu nunca disse.

Quando Ana se aquietou, Isabela a deitou no berço com delicadeza, ajeitou a manta com cuidado, como quem embala um tesouro. E antes de sair do quarto, sem perceber que eu ainda estava ali, ela beijou a testa da nossa filha e murmurou:

— Você é o maior presente da minha vida.

Aquelas palavras me atravessaram como uma flecha. Era impossível não sentir algo. Impossível fingir que não fui tocado por aquela cena, por aquela entrega, por aquela mulher que, mesmo ignorada, continuava inteira.

De volta ao meu quarto, não consegui dormir. Fiquei deitado, encarando o teto, como tantas outras vezes, mas dessa vez havia algo diferente. Fiquei me perguntando se, em meio ao desprezo que eu nutria, não estaria surgindo uma admiração silenciosa por Isabela. Talvez ainda não fosse amor, talvez nunca viesse a ser, mas já não era indiferença. E isso, por si só, era perigoso.

Eu sabia que, se não tomasse cuidado, aquela mulher poderia derrubar, pouco a pouco, todas as muralhas que construí para me proteger. E o pior: ela não fazia esforço algum para isso. Era sua presença, sua constância, sua força silenciosa que me desarmava. E eu, que sempre fui mestre em manter distância, começava a perder o controle.

Na manhã seguinte, ao descer para o café, encontrei Isabela na cozinha, com Ana no colo. Ela cantava baixinho, distraída, e não percebeu minha chegada. Quando me viu, calou-se imediatamente.

— Bom dia — disse ela, com um sorriso tímido.

— Bom dia — respondi, mais por reflexo do que por vontade.

Ela colocou Ana no carrinho e começou a preparar o café. Eu a observei em silêncio, como vinha fazendo há dias. E então, sem pensar, perguntei:

— Você dormiu bem?

Isabela parou por um segundo, surpresa com a pergunta. Depois assentiu.

— O suficiente. Ana acordou duas vezes, mas voltou a dormir rápido.

— Eu ouvi. Quase fui até lá.

Ela me olhou, com os olhos cheios de algo que eu não soube decifrar.

— Mas não foi.

— Não. — admiti. — Você parecia saber exatamente o que fazer.

Ela sorriu, mas havia dor naquele sorriso.

— É o que mães fazem, Pedro. A gente aprende. Mesmo sem ajuda.

Fiquei em silêncio. Não havia resposta para aquilo. E talvez fosse melhor assim.

Naquele instante, percebi que o capítulo que eu tentava encerrar há tanto tempo — o da minha indiferença — estava prestes a ser substituído por outro. Um novo capítulo, onde Isabela não era apenas a mulher que me acompanhava por obrigação. Ela era a mãe da minha filha. E, talvez, a única pessoa capaz de me fazer sentir.

E eu sentia. Mesmo que não quisesse.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP
Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP