Ela me procurou com os olhos marejados, a voz trêmula, e um misto de medo e esperança no rosto. Eu a ouvi em silêncio, mas meu coração se fechou em ferro. Meu primeiro impulso não foi de responsabilidade, e sim de revolta.
— Você fez isso de propósito? — lembro-me de cuspir as palavras, sem medir o quanto poderiam destruí-la.
— Pedro como pode falar isto? Voce foi quem me procurou aquela noite. Eu sempre guardei paramim meus sentimentos e agora finalmente poderemos nos dar uma oportunidade de sermos felizes e contruir uma historia juntos.
— Voce so pode ta brincando, isso nunca deveria ter acontecido,voce aproveitou da minha noite de bebedeira e veja o que deu. Como pode me dizer que nao foi de proposito.
Ela empalideceu. O choque em seu rosto foi tão brutal que, por um instante, pensei que fosse desmaiar. Isabela havia esperado anos por aquele momento, acreditando que a entrega de sua inocência tinha sido um elo entre nós. E ali estava eu, acusando-a de manipulação, como se sua pureza tivesse sido um golpe arquitetado.
A verdade é que eu não estava pronto para encarar o peso daquela notícia. Aos vinte e três anos, minha vida estava apenas começando. E agora alguém me dizia que eu seria pai. Que eu teria que abandonar meus planos e assumir uma responsabilidade que não havia escolhido.
Mas as famílias souberam rápido. A notícia correu como fogo em palha seca. A vergonha não era só dela ou minha — era coletiva. E a solução, como em tantas famílias tradicionais, foi imediata e implacável: casamento.
Tudo foi decidido às pressas. Em meio a discussões abafadas, olhares acusadores e sussurros de desaprovação, eu me vi empurrado para um altar que nunca sonhei pisar.
Aurora, minha avó, parecia satisfeita com o arranjo. Seu olhar sobre Isabela era de ternura, quase de triunfo, como se finalmente tivesse conseguido amarrar nossos destinos. E isso me corroía. Eu via naqueles olhos a confirmação de que, para ela, Isabela era a filha que nunca teve, a mulher perfeita para continuar o legado dos Santos.
Mas dentro de mim, só havia amargura. Eu não a amava. Jamais a havia escolhido. E, no entanto, ali estávamos: unidos por um erro, por uma noite de inconsequência e por uma vida que já crescia no ventre dela.
Isabela, por sua vez, parecia dividida. Havia a felicidade silenciosa de estar ligada a mim, o homem que sempre amara em segredo. Mas também havia a dor da minha frieza, da minha recusa em enxergá-la além da obrigação.
Eu a observava, e às vezes me perguntava se aquela fragilidade dela era real ou apenas um reflexo das dores do passado. Não que isso mudasse algo: eu estava preso, e ela também.
Nos olhos de todos, seríamos um casal. Para mim, éramos apenas dois estranhos condenados a compartilhar o mesmo destino.
E naquele início, enquanto o mundo celebrava a união forçada, dentro de mim nascia um ressentimento que eu ainda não sabia onde me levaria.