Bianca
A primeira coisa que fiz depois de sair daquele apartamento foi ligar para a Ana Júlia.
— Amiga, preciso de você. Agora. — minha voz estava trêmula, e ela não hesitou.
Vinte minutos depois, eu estava sentada no sofá da casa dela, com o rosto inchado, os olhos ardendo e uma manta jogada sobre os ombros. Contei tudo. Detalhe por detalhe. Desde a surpresa do presente até o cheiro do perfume queimando na cama.
Ana Júlia ficou em silêncio. Me olhava como se esperasse que eu explodisse em mil pedaços a qualquer momento.
— Você tem noção do que você viveu? — ela perguntou, com raiva visível. — É o tipo de coisa que destrói uma mulher. Que arranca a alma. Que...
— Que me arrancou. — sussurrei. — Eu não tô inteira. Não sei nem se tô viva, Ju. Eu tô em modo automático.
Ela segurou minha mão.
— Você tá viva sim. E agora você vai levantar. Vai tomar um banho, vai colocar a roupa mais linda que tiver e vai àquela festa da empresa.
Arregalei os olhos.
— Você tá louca? Eu não tenho cabeça pra isso agora.
— Bianca… você vai entrar naquele lugar com a cabeça erguida. Você vai mostrar pra todo mundo — e principalmente pra você — que não vai deixar dois vermes destruírem quem você é. Vai ser doloroso? Vai. Mas também vai ser libertador.
Fiquei em silêncio. E então, contra todas as minhas certezas, levantei.
Tomei um banho longo. Passei hidratante no corpo como quem tenta colar as partes quebradas. Vesti o vestido preto que eu tinha separado para a festa dias atrás — justo, elegante, com um decote sutil e costas nuas. Nada gritante, mas poderoso.
Soltei o cabelo, passei um batom vermelho, e quando me olhei no espelho… eu me vi. Pela primeira vez naquele dia.
Uma mulher traída.
Uma noiva abandonada.
Mas ainda assim, uma mulher inteira.
— Você tá perfeita. — Ana Júlia disse, sorrindo. — Agora vai e mostra pra esse mundo que a Bianca não acabou.
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A festa da empresa acontecia em um salão luxuoso no centro da cidade. Eu desci do carro e respirei fundo. Luzes, risos, champanhe. Era como se o mundo tivesse continuado girando… enquanto o meu parou.
Atravessei o hall com passos firmes, mesmo que minhas pernas tremessem. Assim que entrei, avistei alguns rostos conhecidos do escritório. Camila, minha colega de departamento, veio ao meu encontro sorrindo.
— Bianca! Achei que você não viria!
— Quase não vim. — admiti, forçando um sorriso. — Mas achei que merecia uma taça de champanhe depois da semana que tive.
— Uma taça? Você merece a garrafa inteira. — ela riu, me puxando pela mão. — Vamos, vou te apresentar ao pessoal novo da contabilidade.
Enquanto caminhávamos, foi impossível não notar o burburinho no salão. Pessoas cochichando, olhares atentos. O motivo ficou claro segundos depois.
Ele entrou.
E por "ele", eu digo o homem.
Alto. Impecável. Gravata preta, terno ajustado, cabelo escuro e olhar letal. Caminhava como quem mandava em tudo — e de fato, mandava.
Noah Mancini.
O CEO da empresa.
O homem que eu só tinha visto em fotos de reuniões globais, nas matérias de revistas ou em e-mails corporativos frios e objetivos.
Ver ao vivo era outra coisa.
— Esse é o Mancini? — perguntei, meio chocada.
— Sim. — Camila disse com um sorriso torto. — Perfeito, né? E inacessível. Todas as mulheres dessa empresa já tentaram algo com ele. Zero sucesso. Ele é tipo uma entidade. Tá sempre viajando, ninguém sabe da vida pessoal dele. Frio, misterioso, poderoso… perigoso até.
Eu não consegui tirar os olhos dele.
— Ele é ainda mais bonito do que eu pensei. — murmurei, e Camila riu.
— Cuidado, esse pensamento já destruiu muita mulher aqui dentro.
Tentei desviar o olhar, mas foi inútil. E foi aí que ele olhou de volta.
Sim. Noah Mancini cruzou o salão com os olhos fixos em mim.
E, por algum milagre do universo — ou por um castigo elegante — ele começou a andar na minha direção. Meu coração parou por um instante. Meu estômago se revirou.
Camila sussurrou:
— Meu Deus, ele tá vindo aqui... ele tá vindo falar com você!
— Para, deve ser coincidência.
Não era.
Em segundos, ele estava diante de mim. Tão perto que o perfume amadeirado e sofisticado dele me envolveu por completo. Ele estendeu a mão.
— Boa noite. Sou Noah Mancini. Você deve ser Bianca…
Engoli em seco. Como ele sabia meu nome?
— Sou sim… Senhor Mancini.
— Noah, por favor. — ele disse, com um leve sorriso de canto. — Ouvi dizer que você faz um trabalho excelente no setor jurídico.
— Obrigada. Eu tento. — murmurei, tentando soar minimamente estável.
— Não tente. Apenas continue sendo você. Já é o suficiente.
O elogio inesperado me pegou desprevenida. Eu sorri, mesmo que meu coração ainda sangrasse por dentro.
— Você está linda essa noite. — ele acrescentou, com a voz baixa. — Espero que esteja aproveitando a festa.
Antes que eu pudesse responder, ele deu um passo para o lado, mas não sem antes sussurrar:
— Se precisar respirar… eu também não gosto de multidões. O terraço tem uma vista incrível.
E então ele se afastou, como se não tivesse acabado de abalar cada estrutura emocional que me restava.
Camila olhou pra mim de olhos arregalados.
— Bianca… o CEO acabou de flertar com você. Isso realmente aconteceu ou eu bebi demais?
— Se for sonho, não me acorda.
Ela gargalhou. Eu ri também. Pela primeira vez naquele dia, eu ri de verdade.
Mas lá no fundo, uma parte de mim sabia.
Naquela noite, tudo mudaria.
E o que começou como o fim da minha história com Gustavo… estava prestes a ser o começo de algo muito maior.