Romeu nunca foi de hesitar, mas naquela tarde, ao fechar a porta do apartamento de solteiro no centro da cidade, sentiu-se vacilar. Como se estivesse prestes a fazer algo que deveria ter feito há muito tempo, mas ao mesmo tempo nunca se sentiu minimamente impelido a fazer. Não voltaria para ali tão cedo, pois para que o plano de conquistar Isabella desse certo, a mansão deveria ser novamente seu lar em tempo integral.Sem olhar para trás, Romeu atravessou a cidade até o prédio de Allegra. Aquela seria uma conversa difícil, ele não queria ter que terminar, mas se ia tentar para valer com Isabella, aquele era o único caminho possível. Ela o recebeu com um sorriso insinuante, trajando um vestido leve demais para o clima da estação. Bastou um olhar para saber que ela não entenderia suas palavras sem lutar.— O que houve, amore? — ela perguntou, jogando os braços ao redor do pescoço dele.Romeu afastou-a com delicadeza, mas com firmeza.— Allegra — disse, a voz fria como aço —, isso acabou.
— Isabella — chamou, a voz baixa e carregada de irritação mal contida. — Preciso falar com você. Agora.Ela se virou, surpresa pela abordagem brusca, sentindo o clima pesar de repente. Lorenzo, notando a mudança imediata no ar, sorriu de forma educada, mas desconfortável.— Foi um prazer conhecê-la, Isabella. Espero vê-la por aí — disse, lançando um olhar breve para Romeu antes de se afastar.Assim que ficaram a sós, Romeu cruzou os braços e a encarou com uma intensidade sufocante.— Quem é esse? — perguntou, sem rodeios, a voz cortante como navalha.Isabella piscou, atordoada com a agressividade.— Um vizinho — respondeu, tentando manter a calma. — Ele só estava se apresentando.— Se apresentando? — Romeu bufou, descrente. — E você já estava aí, rindo e trocando confidências?Ela estreitou os olhos.— Era só uma conversa. Nada além disso.— Conversa demais pro meu gosto — murmurou ele, olhando na direção onde Lorenzo desaparecera.— Desde quando você fiscaliza com quem eu falo? — retr
Ele não dormiu naquela noite, após rolar na cama, levantou-se e foi sentar na varanda da mansão, encarando o jardim vazio, onde a discussão com Isabella ainda parecia ecoar entre as flores. Cada palavra dela pesava como uma pedra em seu peito.Ela estava certa, ele nunca teve coragem de vê-la como uma opção aceitável, muito menos de amá-la do jeito que ela merecia. Primeiro porque ela era muito nova e depois porque se tornou um fardo, fardo esse que ele não queria. Mas agora... agora ele precisava fazer alguma coisa. Já tinha trinta e cinco anos, era hora de se estabelecer seriamente. No início da manhã, sem se permitir pensar demais, Romeu atravessou a casa e parou diante da porta do quarto dela. Bateu uma vez, o som seco ecoando no corredor silencioso.— Isabella, podemos conversar?Houve um momento de silêncio, um momento que pareceu durar uma eternidade antes da porta se abrir. Ela estava lá, com o rosto cansado e os olhos ainda inchados pelo sono e o choro da noite anterior. Isab
Os dias seguintes trouxeram uma mudança silenciosa à mansão. Isabella, cansada de esperar atitudes que nunca vinham, resolveu viver.Na manhã de sábado, ela estava no jardim, observando as flores que começavam a desabrochar, quando ouviu passos atrás de si.— Belo dia para admirar a primavera — disse uma voz masculina.Ela se virou, encontrando Lorenzo. O vizinho sorria de maneira calorosa, segurando uma pequena caixa de ferramentas.— Vim ver se precisava de ajuda com o jardim — explicou ele, apontando para as plantas. — Notei que algumas precisam ser podadas. Isabella sorriu, aquecida pela gentileza genuína.— Eu adoraria — respondeu.Eles passaram a manhã juntos, rindo, trocando histórias. Lorenzo era leve, atencioso e, o mais surpreendente, não parecia reparar na forma desajeitada e lenta como ele se movia. Se reparava, não deixava transparecer. Conversava com Isabella como se nada a separasse do resto do mundo. E Romeu, observando da varanda, sentia o sangue ferver nas veias. El
Isabella estava diante do espelho, terminando de ajustar um cachecol fino ao redor do pescoço, quando a campainha soou. Abriu a porta. Lá estava ele, Lorenzo, pontual como sempre. O sorriso que trazia nos lábios era fácil, quase displicente, mas havia algo atento no seu olhar. Como se estivesse sempre observando mais do que deixava transparecer.Nas mãos, um pequeno buquê de flores silvestres.— Para você — disse, estendendo o presente com naturalidade.Isabella piscou, surpresa pelo gesto. Era algo tão simples, tão inesperadamente gentil, que seu coração acelerou sem pedir permissão.— São lindas — agradeceu, sorrindo com sinceridade. Sentiu o rosto corar, uma cor suave nas bochechas. — Pronta para nossa caminhada?Ela assentiu, com um brilho nos olhos que não se via há tempos. Leveza. Era isso que sentia. Como se, enfim, houvesse espaço dentro dela para respirar.Mas ao virar-se para pegar a bolsa, ouviu passos pesados atrás de si. Passos que conhecia bem. Passos que não deveriam es
Romeu olhou para o arranjo de flores sobre a mesa e sentiu um desconforto estranho. Tudo estava organizado para a inauguração da nova ala da galeria da família, seria um evento elegante, cheio de rostos conhecidos e câmeras.E, pela primeira vez, ele queria que Isabella estivesse ao seu lado. Precisava que todos a vissem como a senhora Castellani. Aquilo seria uma mudança e tanto, pois sempre ia sozinho ou acompanhado de alguma amiga especial do momento. A senhora Castellani era apenas um nome e um rosto que aparecia em poucas fotos até então. Sempre achou que seria extremamente desconfortável para Isabella, tanto pelo esforço físico, quanto porque os holofotes estariam inevitavelmente apontados para a sua deficiência.Quando a encontrou no jardim, observando as primeiras flores da estação, aproximou-se com cuidado.— Isabella — chamou, a voz mais baixa que o habitual.Ela virou-se devagar, o rosto sereno, mas os olhos atentos.— Algum problema? — perguntou, sem esconder o ceticismo.R
O silêncio na limusine era ensurdecedor. A cidade se esvaía pelas janelas escuras, mas ali dentro, tudo parecia em suspenso, como se o tempo segurasse a respiração junto com eles.Romeu não parava de olhar para Isabella. Ela, no canto do banco de couro, com a postura ereta e o olhar fixo na janela, parecia feita de gelo. Mas ele sabia, sabia que por trás daquela frieza havia uma tempestade prestes a romper.— Você foi perfeita hoje — arriscou ele, a voz baixa, tensa.Ela soltou uma risada seca, sem humor.— Ah, que sorte a sua. Ter uma esposa decorativa que cumpre sua função quando é conveniente.Romeu franziu o cenho, inclinando-se um pouco para ela.— Não fale como se eu tivesse te arrastado até lá...— Não? — Ela girou o rosto para ele, o olhar faiscando. — Você me deixou sem escolha, Romeu. Como sempre. Me empurrou naquele evento, ao lado daquela mulher que adora me humilhar. E ficou quieto, até o último segundo.— Eu falei com ela, a coloquei no seu devido lugar!— Quando já tinha
— Bom dia. — Isabella falou com um sorrisinho debochado assim que ele entrou na cozinha, sem sequer levantar os olhos do pão que passava na manteiga.Romeu parou no vão da porta, como se ponderasse se era seguro entrar.— Dormiu bem? — ela completou, lambendo a faca com naturalidade e sem nenhum pudor. Estava de camiseta larga e short de moletom, com uma meia de cada cor. Nenhum traço da esposa recatada e insegura que ele estava acostumado a ver.Ele pigarreou, desconfiado.— Não exatamente.— Hm. Que pena. Eu dormi como uma pedra — respondeu, mordendo o pão com gosto. Depois piscou para ele. — O tapa me aliviou.Romeu arqueou as sobrancelhas, andando devagar até a cafeteira. O maxilar ainda doía. O ego, mais ainda.— Você tem um braço forte — murmurou, sem olhá-la. — Para alguém tão... delicada.— É o que dá passar três anos ignorando o básico da sua esposa. A gente desenvolve talentos ocultos.Ela deu uma risadinha e bebeu seu suco, como se estivesse falando do clima. Romeu a observa