A chuva engrossava a cada minuto, como se o céu tivesse decidido despejar o peso do mundo sobre a cidade. As gotas batiam no para-brisa com força, e os limpadores se moviam frenéticos, sem dar conta de afastar tanta água.
Eu tentava manter a atenção na janela, fingindo desinteresse sobre o que acabamos de conversar, mas era impossível ignorar Lorenzo. O jeito que ele dirigia, firme, seguro, mesmo com a mão relaxada no volante como se estivesse no controle de tudo. Não só do carro — mas de mim também. E essa ideia, por mais absurda que fosse, fez um arrepio percorrer minha pele. De repente, faróis atravessaram a pista. Um carro à frente derrapou, girando como um pião desgovernado. — Ai meu Deus! — Minha voz saiu em um grito sufocado, e minha mão se agarrou instintivamente ao cinto. O coração disparou. Em segundos, Lorenzo girou o volante com firmeza, desviando por centímetros do impacto. O carro deslizou, o som dos pneus cortando a água, e por um instante tudo pareceu câmera lenta. Meu corpo foi arremessado contra o banco, e a mão dele se estendeu até o meu braço, firme, protetora, me prendendo no lugar como se pudesse me blindar de qualquer perigo. — Que porra foi essa? — disse virando para trás para olhar para o carro que havia perdido o controle. Eu respirei fundo, tentando recuperar o ar. — Meu Deus… a gente quase… — Calma… — ele murmurou, ainda com a mão no meu braço. Os olhos escuros me examinaram de perto, atentos a cada reação. — Você está bem? — Eu… sim. — menti, porque meu corpo inteiro ainda tremia. — Só… assustada. Ele não soltou meu braço de imediato. Seus dedos ficaram ali, fortes, quase protetores, demorando um segundo a mais do que o necessário. — Não precisa se preocupar — disse, num tom baixo, grave, como uma promessa. — Enquanto eu estiver aqui, você estará segura. Minhas defesas internas balançaram. Eu queria rir, debochar, responder algo sarcástico como sempre fazia, mas a voz simplesmente não saiu. Em vez disso, fiquei ali, olhando para ele como quem olha para um segredo perigoso demais para ser descoberto. O carro seguiu em frente, e dessa vez o silêncio não era desconfortável — era carregado, quase palpável. Poucos minutos depois, Lorenzo estacionou em frente ao meu prédio. As luzes refletiam na poça de água da calçada, e o som da chuva completava aquele cenário surreal. Soltei o cinto devagar, tentando controlar minhas mãos trêmulas. — Obrigada… por me trazer. E… por salvar a gente agora há pouco. Ele inclinou o rosto na minha direção, apoiando o braço no volante, por um instante tive certeza de que não conseguiria respirar. — Foi um prazer, Mila. A forma como ele disse meu nome fez meu corpo inteiro reagir mais uma vez. Engoli seco, abrindo a porta rápido demais, como se fugir fosse a única forma de retomar o controle. — Boa noite, Lorenzo — murmurei, tentando soar firme. Já do lado de fora, fechei a porta e respirei fundo. Mas antes que eu conseguisse alcançar a marquise do prédio, o vidro do carro baixou lentamente. — Mila… — a voz dele soou clara, mesmo em meio ao barulho da chuva. — Você ainda não me respondeu. Você deixa eu te conhecer melhor? Meu coração falhou uma batida. Permaneci ali, estática, olhando para ele através da água que escorria pelo vidro, sem saber se corria para o meu apartamento ou para os braços daquele homem.