— BYANKA
Eu sempre odiei despedidas, nunca gostei de ser a pessoa que fica observando e sofrendo enquanto as outras vão embora da minha vida, a cada partida que eu presenciei uma parte de mim se foi, como se aos poucos eu me tornasse cada vez mais quebrada, cada vez mais fraca para ser moldada da forma que eles quisessem. Cresci e convivi até a maioridade com várias meninas, apenas para assistir cada uma ser tomada de minha vida deixando um buraco que nenhum outro pode ocupar, cada partida mais traumática que a outra, cada uma mais revoltante que a outra, casamentos onde elas eram dadas a homens que nunca viram em sua vida com idades variantes de 30 a 70 anos, cada casamento que se parecia mais como um funeral de cada espírito alegre e amoroso que um dia elas foram e tudo para que? Apenas para selar acordos, apenas para que a máfia não entrasse em guerra mais uma vez? Qual é o sentido de tanta guerra se nunca há paz? E no fim, restaram apenas eu e Yelena, nosso grupo de sete irmãs se resumiu apenas a nós duas, digo irmãs porque crescemos juntas e nos foi ensinado a protegermos umas às outras como irmãs, para aconselharmos uma às outras a guardar o que era mais sagrado em nossa vida, a nossa virgindade, como se apenas um conjunto de fibras musculares, vasos sanguíneos e terminações nervosas ditasse quanto cada uma de nós vale. Mas agora até Yelena se foi, casou com um membro da Cosa Nostra que ela também nunca havia visto e que pelo menos não parecia ser tão ruim quanto os outros, pelo menos ele tinha por volta dos 27 anos e tinha todos os dentes em sua boca. Nunca chorei tanto quanto naquele dia, quando vi Yelena entrando naquele jatinho e me dando um tchau triste, meu coração se partiu em mil pedaços diferentes, meu mundo parecia que iria desabar. Senti braços fortes me rodearem e chorei em um peito com um perfume desconhecido e foi assim que conheci Dimitry, no momento mais frágil da minha vida ele apareceu com a segurança de que tudo ficaria bem. E realmente ficou por um tempo até que ele pediu minha mão em casamento e tudo começou a sair dos trilhos, o que começou como um romance perfeito e seguro se tornou cada vez mais distante e mais frio, perdi a conta de quantas vezes chorei no colo de minha irmã e sofri por sua indiferença, perdi a conta do número de vezes que ela me disse que não era nada, que era apenas o estresse do trabalho e que eu não deveria me preocupar com nada do que estava acontecendo. E eu realmente acreditei que fosse isso, afinal, como ter um coração bom e caloroso se ele literalmente vive matando pessoas, isso deve de alguma forma extinguir aquela luz de dentro dos olhos, certo? Pelo menos foi o que eu me forcei a acreditar, que era apenas o trabalho, como minha querida irmã disse, tentei ser compreensiva, tentei ser amorosa até mesmo quando ele me esnobava, tudo por causa dos conselhos da minha irmã. Eu realmente confiei nela, afinal, ela era minha irmã mais velha e já havia se casado, mas seu marido faleceu com apenas dois meses de casamento e a família dele a devolveu para meus pais, devolveu uma Aleksandra quebrada e arruinada para tudo que interessava ao nosso pai, o casamento de uma virgem. Eu vi a depressão tomar minha irmã aos poucos, até o meu noivado onde ela conheceu Dimitry, eles se tornaram amigos instantaneamente, confesso que por algumas vezes eu até fiquei com ciúmes de como a relação dos dois era fácil quando comigo era tão difícil e cada vez mais distante. Quantas vezes Aleksandra disse que conversaria com ele, que diria a ele para ser menos duro comigo e realmente funcionava por um tempo até que ele voltava a ser o típico homem russo, frio e sem coração e aos poucos me deixava cada vez mais gelada. Balanço minha cabeça com a sucessão de memórias que me retornam neste momento, não é hora para isso inferno! É hora de ser a bonequinha russa perfeita e indestrutível, não essa coisa sentimental e frágil que eles podem manipular. Continuo correndo pelas ruas de Moscou, virando em ruas e mais ruas que não conheço bem, o som dos meus passos fazem eco na noite fria e chuvosa, consegui escapar por pouco antes que os guardas chegassem, depois me mantive escondida e quando a oportunidade surgiu eu corri como se não houvesse amanhã, como se eu não tivesse um lar para voltar e agora eu realmente não tenho. Meu corpo inteiro treme de frio e me abraço enquanto impulsiono minhas pernas a continuarem correndo, a não falharem nesse momento, nunca fui uma aluna muito boa em corrida e me arrependo amargamente por não ter me dedicado mais. A essa hora alguém já deve estar atrás de mim, então não posso parar mesmo que eu quisesse, é literalmente correr ou morrer agora e eu realmente não quero perder a minha vida por causa daqueles bastardos, eles não irão tomar nada mais de mim. Ouço o som de pneus cantando ao longe e isso me dá mais força para correr, fico tentada a bater em algumas das portas que me cercam e pedir ajuda, mas não sei até onde vai a influência da máfia aqui em Moscou e não sei em quem eu realmente posso confiar. Sinto pequenas pedrinhas afiadas cortarem a sola dos meus pés, mas continuo seguindo em frente com um pé na frente do outro, meus pulmões ardem por ar e meu corpo implora por um momento de descanso, mas sei que esse pequeno momento seria a minha morte. Não sei se conseguiria fazer minhas pernas voltarem a funcionar depois da pausa, sinto que meu corpo está quase no limite quando alcanço a famosa ponte Patriarshy Bridge, onde eu vim a um dia atrás com Dimitry que estranhamente estava sendo caloroso comigo e eu estava radiante agradecendo minha irmã internamente por ter conversado com ele. Olho para o passado e para toda essa palhaçada de reconexão antes do casamento que eles me forçaram a engolir, penso em toda baboseira que Dimitry disse para convencer meus pais e minha irmã de voltarem a nossa terra natal e vejo que foi apenas um argumento para os dois passarem mais tempo juntos, nunca foi por mim, nada nunca foi pensando em mim. Lágrimas que eu não queria nesse momento escorrem pelo meu rosto e o som do carro fica mais próximo a cada segundo que se passa, olho para trás e sou capaz de avistar os faróis do carro que vem em alta velocidade. Olho para minhas opções e só vejo água ao meu redor, eu sou uma excelente nadadora, mas não sei se a fadiga iria deixar que eu conseguisse nadar, ou se minhas pernas ainda iriam me obedecer se eu as mandasse nadar para sobreviver. Me vejo em conflito com as duas únicas opções que me restam, pular para a incerteza ou aceitar um destino bem pior que a morte, ser humilhada e ter que me casar com o homem que sempre desejou minha irmã, isso se ele estiver vivo. Abro um sorriso para a possibilidade de ter arruinado o seu final feliz também, assim como ela arruinou o meu e decido não dar o gostinho dela me ver novamente, a morte é preferível do que ter que conviver com a consequência dos meus atos. Imagina eu ter que voltar e ser obrigada a ver os dois se casarem enquanto sou destinada a um velho asqueroso como punição, não, qualquer morte é melhor que isso. Sinto o calor dos faróis esquentarem meus ossos gelados de tão próximos que eles estão e paro abruptamente no meio da ponte, subo com pernas trêmulas na borda do guarda corpo e abro meus braços enquanto me jogo para frente. — Hoje não é o seu dia de morrer, Bambola. — pela segunda vez na vida sinto braços fortes me circularem em um momento de desespero e sinto um perfume estranho coçar o meu nariz. Solto um grito e tento escapar dos braços do meu agressor, mas algo cobre meu nariz e cada vez mais a luta foge do meu corpo e eu me sinto mais sonolenta.