Eveline Rocha segurava a caneta com dedos trêmulos. O documento à sua frente carregava mais do que seu nome: era a sentença de um destino selado por ambição alheia. Casar-se com um homem que jamais vira, por um acordo que não escolheu. Seu pai, Júlio, e sua madrasta, Cláudia, a observavam em silêncio — satisfeitos como lobos diante da presa entregue. — Assine logo, Eveline. — Cláudia sorriu, o veneno escorrendo pelas palavras. — Você deveria agradecer pela oportunidade de salvar essa família. O cartório itinerante esperava. Do lado de fora, o carro enviado por Marcus Castelão já aguardava. Ela assinou! Eveline tinha 21 anos, um corpo que arrancava suspiros onde passava, embora jamais tivesse se permitido viver o amor ou o desejo. Ainda assim, naquele momento, sentia-se vazia. Como se algo em seu peito estivesse sendo arrancado junto com a sua liberdade. Ela levantou o rosto, encarou a madrasta com o mesmo deboche leve que sempre a incomodava. — Espero que ele me trate melhor do que vocês. E saiu.
Leer másA caneta escorregava entre os dedos finos de Eveline Rocha. O papel à sua frente tremia como se denunciasse o que ela não podia dizer em voz alta. Aquela não era uma assinatura de amor. Era um contrato de resgate. Resgate financeiro — não emocional.
Sentada à mesa da sala de jantar, Eveline parecia pequena demais para a gravidade daquela decisão. A jovem de pele alva e cabelos negros como a noite encarava o documento com os olhos cor de mel marejados. Seu coração batia tão alto que podia jurar que os outros escutavam.
Mas ninguém escutava nada naquela casa.
Seu pai, Júlio Rocha, estava de pé ao lado da lareira, com os braços cruzados e a expressão fria como mármore. Desde que a fábrica da família — uma tradicional tecelagem herdada do avô de Eveline — começara a falir, ele já não a olhava como filha. Era uma moeda de troca, e nada mais.
— Assine de uma vez, Eveline. Não temos o dia todo — disse ele com voz áspera, sem tirar os olhos do relógio de bolso que herdara como um troféu de tempos melhores.
A madrasta, Claudia, estava recostada no sofá com uma taça de vinho, a elegância superficial estampada em um sorriso satisfeito. Usava um vestido de seda vermelha, provocativo e dissonante com o momento. Ela não escondia a indiferença — e nem a crueldade.
— Vai ser a coisa mais útil que você já fez por essa família — disse Claudia, entornando o vinho com prazer. — Um pouco de gratidão cairia bem.
Luiza, a meia-irmã, estava escorada na parede, mascando chiclete e revirando os olhos. Tinha a mesma idade de Eveline, mas o contraste entre elas era gritante. Luiza era preguiçosa, mimada e acostumada a ter tudo sem esforço. Sempre invejou a beleza, a inteligência e até o silêncio resiliente de Eveline.
— Até que enfim a santa vai servir pra alguma coisa — provocou, rindo com escárnio. — Casar com o monstro escondido na fazenda. Mal posso esperar pelas cartas de amor... ou os gritos de pavor.
— Cale a boca, Luiza — sussurrou Eveline, com um fio de voz.
Mas ninguém a defenderia. Ninguém jamais a defendera.
Desde pequena, Eveline fora a estranha dentro da própria casa. Após a morte de sua mãe biológica, Júlio havia se casado rapidamente com Claudia, uma mulher fria e ambiciosa. Ela nunca fez questão de esconder o desprezo por Eveline. Sempre preferiu Luiza, sua filha do primeiro casamento. Enquanto Luiza ganhava festas, roupas caras e elogios, Eveline ganhava tarefas, cobranças e silêncio.
Mesmo assim, ela nunca reclamou. Sonhava em estudar medicina, em sair daquele ambiente sufocante, em cuidar de vidas — talvez porque ninguém nunca tivesse cuidado da dela. Tirava as melhores notas da escola, passava horas estudando escondida, recortava imagens de jalecos brancos e guardava sob o travesseiro.
Mas quando terminou o colegial e falou sobre vestibular, Claudia riu.
— Faculdade? Pra quê? Vai cuidar de doentes como sua mãe fracassada? Sua única chance de fazer algo certo nessa vida é casar-se com um homem rico. E agora você vai ter essa sorte.
Era isso: Sorte. A palavra soava como uma ofensa.
A fábrica de tecidos estava à beira da falência. Os bancos já haviam cortado as linhas de crédito. Júlio, orgulhoso demais para declarar falência, aceitou a proposta que viera por meios estranhos — uma união entre sua filha mais velha e o recluso Marcus Castelão, milionário do setor agropecuário. Eveline nunca o vira. Sabia apenas que ele havia sofrido um acidente grave, que vivia isolado em sua fazenda e que queria uma esposa e um herdeiro. O casamento seria discreto. Sem cerimônia. Sem festa.
Sem escolha.
Com a mão trêmula, Eveline assinou.
Seu coração afundou.
Não houve aplausos. Nenhum parabéns. Só o som do papel sendo retirado da mesa e entregue ao oficial do cartório, que saiu tão indiferente quanto chegou. Júlio pegou a taça de Claudia e bebeu como quem brinda à própria salvação.
— Prepare-se. O carro de Marcus chega em uma hora. E trate de ser agradável, Eveline. Sua obrigação agora é obedecer.
Ela levantou-se em silêncio, tentando manter a postura apesar do nó na garganta. Enquanto subia as escadas para arrumar suas coisas, ouviu a voz de Luiza, rindo no andar de baixo:
— Aposto que ela nem vai saber o que fazer na cama.
Eveline parou por um segundo no topo da escada. Não chorou. Não respondeu. Mas ali, em silêncio, jurou a si mesma que sobreviveria — nem que tivesse que transformar aquela prisão dourada na chave para sua liberdade.
O quarto da suíte nupcial agora era um templo privado. A brisa do mar entrava suavemente pelas cortinas esvoaçantes, misturando-se ao perfume das pétalas sobre a cama. O corpo de Eveline, ainda úmido da banheira, exalava calor e desejo. Marcus a olhava como se quisesse gravar cada detalhe daquela noite na memória — e, de fato, queria. Ele se deitou sobre ela, com os cabelos ainda levemente molhados e o olhar aceso. Suas mãos deslizavam pela pele alva de Eveline, que estremecia sob cada carícia. — Eu esperei muito por isso — ele sussurrou, seus lábios quase encostando nos dela. — Esperei pela sua entrega... pelo seu olhar dizendo “eu voltei”. Eveline passou os dedos pelos cabelos dele, prendendo-o ali. — Eu voltei. E agora sou toda sua, Marcus. Sem reservas. Sem medo. Ele beijou-a com intensidade. A princípio, lento, como se a saboreasse. Depois, mais fundo, como se quisesse tomá-la para si de vez. O corpo de Eveline se arqueou debaixo dele, os seios tocando o peito nu dele, e
O céu já vestia seu manto noturno quando Marcus e Eveline chegaram à suíte nupcial do resort à beira-mar. O hotel cinco estrelas exalava luxo em cada detalhe — da recepção perfumada aos corredores silenciosos que conduziam ao andar mais alto. A suíte era um verdadeiro refúgio romântico: ampla, com varandas de frente para o mar, lençóis brancos como nuvens e uma banheira de hidromassagem estrategicamente posicionada sob um teto envidraçado com vista para as estrelas. Marcus abriu a porta do quarto com um leve empurrão, os olhos fixos em Eveline, como se ela fosse a única coisa que existia no mundo. A luz suave refletia na madeira polida do chão, criando um brilho quente e acolhedor. Sem dizer uma palavra, ele a pegou nos braços, como prometera a si mesmo fazer desde o dia em que ela disse “sim”. O vestido de noiva dela escorregava com leveza, quase como um sussurro, deixando um rastro de seda branca sobre o chão. Os cabelos castanhos estavam meio soltos, algumas mechas escapando do p
O sol filtrava-se por entre as copas das árvores da mansão Castelão, lançando feixes dourados sobre o gramado impecável. Era como se o dia inteiro tivesse sido escrito em função daquele momento. O jardim, transformado em um cenário de sonho, exalava perfume de lavanda, rosas brancas e jasmim. Ao fundo, um arco de flores silvestres contornava o altar, e as cadeiras elegantemente alinhadas estavam cobertas com tecidos marfim. Arranjos suspensos balançavam levemente com a brisa suave da manhã. Era como se até o vento soubesse que o amor seria celebrado ali.No andar de cima da mansão, Eveline estava quase pronta. Vestia-se com a ajuda de Clara e de Helena, que não conseguia conter as lágrimas ao ver a nora como uma verdadeira princesa. - Eu vou beber uma água com açúcar não posso fuçar emocionada de mas, eu volto já meninas.- Eve antes que eu esqueça olha isso! Uau amiga não me diga que vc está noiva? Clara mostrou para a amiga o anel de brilhante que Daniel deu para ela, quando a p
O sol da tarde banhava a mansão Castelão com tons dourados e suaves, refletindo nas janelas altas e no jardim cuidadosamente decorado. O cheiro de flores frescas preenchia o ar, enquanto os jardineiros finalizavam a montagem do altar ao ar livre. Cortinas de tule branco esvoaçavam com a brisa, ladeadas por arranjos de orquídeas, rosas e lavandas. Tudo estava sendo preparado para o que prometia ser um dos dias mais especiais na vida de Eveline e Marcus. Dentro da mansão, Clara ajudava Eveline no andar superior, no quarto sobre a cama, repousava o vestido de noiva que Eveline havia escolhido com os olhos brilhando de emoção. Era leve, rendado, com mangas delicadas e uma longa cauda que parecia flutuar. — Você vai deixar todos sem ar — disse Clara, ajeitando os últimos botões do corpete. — Principalmente o Marcus. Eveline riu, mas os olhos estavam marejados. Ela se virou, pegando as mãos da amiga. — Obrigada por tudo, Clara. Por estar aqui, por não me julgar quando nem eu sabia o qu
O fim de tarde chegava com tons dourados e um clima ameno. A mansão Avelar, decorada com velas suaves e flores brancas sobre a mesa de jantar, exalava uma atmosfera de expectativa e celebração. Clara, depois de revisar os últimos detalhes com Marta, subiu para se arrumar. Escolheu um vestido na cor off white de alças finas, discreto e elegante, que realçava sua silhueta com naturalidade. No andar de baixo, Daniel conversava com Beatriz e Lucas, que ajudavam Marta a dobrar os guardanapos e posicionar os lugares à mesa. Queria que as crianças participassem de tudo, pois aquele jantar não era apenas uma recepção — era uma declaração. Clara faria, em breve, parte daquela família, e era hora de todos a acolherem como tal. — Clara vai ficar ainda mais bonita hoje? — perguntou Beatriz, com os olhos grandes de curiosidade. — Vai, minha princesa — respondeu Daniel, sorrindo. — E vocês dois vão ajudá-la a se sentir ainda mais especial. Às 19h30, o carro trazendo os pais de Clara chegou. Ao
A clínica havia retomado sua rotina habitual, e a presença de Clara nos corredores — agora mais confiante, segura e com um brilho que vinha de dentro — parecia contagiar os pacientes e funcionários. Daniel, totalmente recuperado, estava de volta aos atendimentos, mais presente do que nunca, e sempre acompanhado de um olhar cúmplice trocado com ela entre um prontuário e outro.Clara sabia que a vida estava mudando — e que estava mudando para melhor.Naquela sexta-feira, Daniel a esperou no consultório depois do expediente. Vestia uma camisa azul clara, dobrada nos punhos, e um sorriso diferente, sereno, mas ansioso. Sobre a mesa, uma pequena caixa de veludo azul repousava discretamente ao lado de uma taça de vinho.Quando Clara entrou, ele se levantou.— Uau... — disse ela, sem esconder o encantamento ao ver a mesa posta, com flores, velas e aroma suave de lavanda no ar. — Você está aprontando alguma coisa, doutor Avelar?Daniel sorriu.— Estou celebrando... nós.Ela largou a bolsa em
Último capítulo