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DEPOIS DO FIM
DEPOIS DO FIM
Por: Niway
CAPÍTULO 1 | LUCY DONOVAN

Era verão na Itália, quando eu tomei a pior decisão da minha vida. A decisão que me levaria até a minha pior versão e também, aos braços da morte.  

Eu nasci na família Donovan, uma garota com cabelos loiros, olhos que sempre eram comparados a diamantes e um rosto angelical. Eu era a primogênita da família Donovan, e isso já ditava 90% da minha vida. Eu sabia disso, cresci com isso em mente. E esse fato não me incomodava, — mas certamente preferia que as coisas pudessem ser um pouco diferente, — só que esperar e ser, são completos opostos. O sol filtrava-se pelas grandes janelas de vidro da ala leste da mansão Donovan, tingindo o mármore branco com tons dourados que faziam tudo parecer mágico, ou pelo menos era assim que parecia para a minha versão que ainda acreditava em contos de fadas, — ou talvez só mais uma manhã comum na casa em que meus pais decidiram viver após muita insistência da minha mãe em dizer: a família sempre residiu na mansão principal, é aqui que nossos filhos devem crescer. Mas não importava quantas vezes acordasse ali, aquele lugar ainda me arrancava suspiros. Havia uma sensação de eternidade naquela propriedade, como se as paredes sussurrassem histórias de gerações que viveram, amaram e caíram nos mesmos lugares onde agora eu caminhava. Talvez isso tudo não passasse de um reflexo da mansão que foi passada de geração a geração.

Minha xícara de chá ainda soltava fumaça quando me acomodei no banco de madeira entalhada do jardim de inverno, ladeado por trepadeiras e roseiras em flor. Entre as mãos, um exemplar antigo de Madame Bovary, presente de minha mãe em meu aniversário de quinze anos — e que eu jamais terminei, já que o tédio me atingia antes que eu pudesse realmente sentir empatia ou sequer... me identificar com qualquer alma naquele romance. A ironia não passava despercebida: uma história de paixões sufocadas em meio a convenções sociais, lida por mim, Lucy Donovan, filha de um banqueiro europeu e de uma dama de linhagem nobre, prestes a aceitar um casamento arranjado sem nem ao menos perceber que era arranjado.

Bom. Eu não era tão burra assim, sabia bem que era um acordo bom para todos os lados, — e depois de tantos anos, — eu já não esperava mais que “amor” existisse, então, o que era melhor para a família, seria o melhor para mim.

Meu irmão mais novo, Jasper, tinha prometido me encontrar para me mostrar seu novo cavalo após o café, mas como sempre, devia estar perdido em alguma distração — talvez treinando salto com o cavalo ou provocando os cozinheiros em seu novo fascínio. Com apenas dezesseis anos, Jasper era caótico e também, era o coração da nossa família. Era ele quem ditava o ritmo, quem animava os jantares, quem dava vida ao mundo monocromático do meu pai e da minha mãe.

Antes que eu pudesse me perder demais nos pensamentos, minha mãe surgiu na varanda, com passos silenciosos e firmes. Lilian Donovan era o retrato da sofisticação contida — cabelos presos em um coque baixo, vestido em tons de creme e ouro, e um colar de pérolas que fora passado por gerações.

— Lucy, querida — disse com suavidade. — Pode me acompanhar por um instante?

Fechei o livro sem hesitar e a segui por entre as portas de vidro. Caminhamos até o salão azul, um dos meus preferidos, onde as janelas davam para o lago. Ela sentou-se em uma das poltronas de veludo e me ofereceu a outra, de frente para ela.

— Então, sobre o que quer conversar? — Perguntei antes que ela tivesse a chance de guiar a conversa.

— É sobre Richard — ela começou, e não me surpreendi. Richard Preston era o primogênito de Alan Desmond, o herdeiro da família Desmond e claro, o responsável por deixar meus pais cada dia mais felizes.

Ele era educado, gentil, doce, e tinha se esforçado bastante no papel de me cortejar. Eu me sentia como uma garotinha de 15 anos em um romance de época, mas... era 2025. Era o século XXI e certamente... eu ainda tinha alguma escolha.

O problema, era que ele era bom em tudo. Perfeito em tudo. Ótimo para minha família, ótimo como um homem que parecia me idolatrar. Richard era diferente de grande parte dos herdeiros que haviam se aproximado de mim ou da minha família nós últimos 6 anos. O que tornava ele, a escolha perfeita.

— Imaginei — respondi, tentando disfarçar o meu incomodo com um sorriso de canto.

— Você gosta dele? — Ela foi tão direta com aquela pergunta, que eu me senti levemente constrangida em não responder de forma... igualmente claro.

— Gosto. 

Eu disse e não era completamente mentira. Eu gostava. Gostava da maneira como ele segura a porta para mim, do jeito como ele escuta quando eu falo... Gostava da calma que ele transmitia.

Ela me observava como se tentasse medir a profundidade do meu afeto, com aquela paciência sutil que só mães conhecem.

— Entendo... — murmurou, — mas você o ama?

— Não — respondi, firme. — Mas... talvez um dia venha a amar. O que sinto por ele... é o suficiente. É mais do que muitas pessoas têm, não é?

Ela assentiu, como se eu tivesse passado em algum teste. 

— Amor, minha querida, é um luxo. Respeito, estabilidade e lealdade... esses são os alicerces de uma vida longa e tranquila. E Richard pode te oferecer tudo isso, ao menos, é o que eu penso, e caso estejamos errados...

Sorri.

— Sim, eu sei. Você e papai estarão ao meu lado.

— Exatamente. — Ela segurou em minha mão, — queremos que você e Richard deem certo, claro que queremos, isso é perfeito para os negócios da família Donovan, assim como será promissor para Richard, mas... ainda estaremos aqui para apoiar você.

— Eu sei, — falei com simplicidade, porque no fim, eu já esperava por isso.

Afinal, faziam 2 anos que eu conheci Richard na casa de férias da minha família. Ele havia sido um perfeito cavaleiro e um namorado encantador, desde que pediu a permissão de meus pais, a um ano.

Estava em tempo de um noivado surgir.

Permaneci em silêncio por alguns instantes mesmo sabendo de tudo aquilo. A verdade é que eu não me sentia pressionada.

O som de passos correndo no corredor interrompeu nossa conversa antes que um “veredito” fosse realmente feito e Jasper irrompeu pela porta com sua camisa desabotoada, cabelo desalinhado e olhos brilhando de animação.

— Lucy! Mãe! Vocês viram minhas botas de montaria? O cavalo novo me odeia, e se eu aparecer atrasado de novo, ele vai me derrubar só de birra, não sei como uma coisa tão cara, pode ser tão problemática.

Sorri.

— Ué irmãozinho, nunca se olhou no espelho? — Zombei e ele revirou os olhos ao me ouvir.

Minha mãe suspirou, mas havia um sorriso em seus olhos. Eu me levantei e fui até ele, alisando sua gola e beijando sua testa.

— Estão no depósito de selas. Eu mesma vi você largando-as lá ontem, fingindo que não era sua responsabilidade guardar. — Completei e ele ergueu uma das sobrancelhas.

— Você me espiona?

— Eu sou sua irmã mais velha. Espionar você é minha obrigação moral, imagine só se eu te deixo a solta por aí? O estrago que não vai fazer.

Ele sorriu.

— Vou fingir que eu não ouvi isso.

Foi tudo o que disse antes de me dar um beijo na bochecha e fazer o mesmo com nossa mãe.

— Agora eu tenho que ir. Amo vocês.

Eu me virei de volta para minha mãe, que agora observava o jardim com uma expressão mais suave, Jaspes havia saído correndo e eu sabia que o foco voltava pra mim.

— Jasper e você, são o nosso maior presente — ela disse, — e é esse tipo de presente que eu espero que você possa ter em seu futuro, querida.

Assenti. 

— Eu sei. Amo o meu irmão. Eu faria qualquer coisa por ele, — sussurrei, — e sei que irei amar meus filhos no futuro, tanto quanto vocês amam a mim e a Jasper.

— Sim, você vai.

Antes que eu pudesse perguntar o que ela queria dizer com isso, ouvimos o som de um carro estacionado no pátio principal. Minha mãe se levantou imediatamente, organizando mentalmente os próximos passos, como se fosse uma rainha prestes a receber visitas diplomáticas.

— Venha. Vamos receber seu pai.

Eu assenti, mas a essa altura, já sabia que meu pai não havia voltado sozinho para casa. Nós descemos juntas as escadas principais, nossos passos ecoando pelos corredores altos. O aroma de lavanda e madeira encerada preenchia o ar. Quando chegamos ao saguão, as portas já estavam abertas e dois homens entravam: meu pai, Cameron Donovan, com seu usual terno azul-marinho impecável, e ao lado dele... Richard.

O tempo pareceu desacelerar. Richard estava especialmente elegante, trajando um paletó cinza claro e uma gravata bordô. Seus cabelos loiros estavam perfeitamente penteados, e aquele sorriso... Ele sempre soube sorrir como se o mundo estivesse em paz.

— Lucy — ele disse, vindo em minha direção com passos firmes. Ele pegou minha mão e beijou meus dedos, um gesto antiquado que, vindo dele, parecia natural.

Esse era realmente o homem certo, não era? O homem perfeito para me casar.

Eu senti o calor subir ao meu rosto, mas antes que pudesse dizer qualquer coisa, ele se ajoelhou.

O salão inteiro ficou em silêncio e eu pisquei, um pouco surpresa.

— Lucy Donovan — começou ele, tirando uma caixinha de veludo do bolso interno do paletó. — Desde que nos conhecemos, tenho visto em você tudo o que admiro em uma mulher: elegância, força, compaixão... e beleza. Seria uma honra compartilhar minha vida com você e depois de receber a permissão de seu pai essa manhã, eu mal pude esperar para te perguntar isso. Lucy, meu amor, você aceita se casar comigo?

Minha respiração travou. Eu olhei para minha mãe, que mantinha um sorriso tranquilo. Meu pai, ao lado dela, apenas assentiu com orgulho.

E então, eu disse o que, até então, me parecia natural:

— Sim.

Richard se levantou e colocou o anel no meu dedo — uma joia delicada, com uma pedra de safira envolta por pequenos diamantes. Tudo nele era perfeito.

Como ele.

Naquele momento, eu me senti completa. Como se estivesse exatamente onde devia estar. Como se o mundo finalmente tivesse se alinhado para me oferecer tudo o que sempre me foi prometido.

Um casamento perfeito. Um marido perfeito. Uma vida perfeita.

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