Os dias seguintes foram uma mistura de rotina e provocação. Aurora chegava sempre quinze minutos antes do horário, ocupava a cadeira de apoio ao lado da mesa de Enzo — nunca de frente, como em outras empresas — e passava o dia lidando com planilhas, reuniões silenciosas e o peso constante de um olhar.
O olhar dele.
Ele raramente falava fora do necessário. Mas quando falava, cada palavra parecia escolhida para tirar o chão dela. Um elogio sussurrado, uma pergunta ambígua, um olhar que deslizava por seu pescoço quando ela achava que ninguém estava prestando atenção.
A tensão era constante.
A regra mais clara era não falar sobre o contrato. Nem nas mensagens, nem em voz alta. Era como se aquilo só existisse entre as quatro paredes da sala espelhada. Fora dali, eles eram apenas chefe e assistente.
— Senhorita Santini, preciso que me acompanhe esta noite — disse Enzo numa quinta-feira, no fim do expediente.
Aurora olhou para ele por cima do monitor, tentando esconder o frio na barriga.
— Algum compromisso oficial?
— Um coquetel beneficente. Muitos flashes. Muitos tubarões. Preciso de alguém com aparência impecável e capacidade de permanecer calada quando necessário.
— Parece uma descrição adorável para “namorada de aluguel”.
Enzo sorriu, sem desviar os olhos dos documentos.
— Chame como quiser. Você vai receber por isso, de qualquer forma.
— O senhor sempre mistura funções?
— Apenas com funcionárias com contrato completo.
Aurora suspirou, lutando para manter o tom neutro.
— Que horas?
— O carro estará na sua porta às dezenove horas. — Ele tirou uma caixa longa e retangular da gaveta. — Isso estará esperando por você ao chegar em casa.
Ela arqueou as sobrancelhas.
— O que é isso?
— Seu vestido. Escolhido por mim. Experimente. Se não servir, providenciarei outro.
Aurora cruzou os braços, desconfiada.
— Está escolhendo até minhas roupas agora?
— Só quando eu vou tirar elas depois.
O silêncio entre eles ficou espesso. Ela o encarou com uma mistura de raiva e... excitação. Enzo sequer piscou.
— Mais alguma exigência? — perguntou, a voz mais baixa do que pretendia.
— Cabelo preso. Maquiagem leve. Salto alto. E sem sutiã.
Ela não reagiu de imediato. Parte dela queria dar as costas, jogar o contrato na cara dele e sair. Mas outra parte… a que ela estava tentando esconder desde o primeiro dia… queria obedecer. Queria ver até onde aquilo podia ir.
— Entendido, senhor Salvatore.
Aurora chegou em casa e encontrou a caixa sobre sua cama, exatamente como ele dissera. Sofia havia deixado um bilhete:
“Achei que era um sapato caro. Não abri. Mas quero detalhes depois. :)”
Ela sorriu e abriu a caixa com cuidado. Dentro, envolto em papel manteiga preto, havia um vestido de seda escura, com alças finíssimas e um corte que abraçava o corpo como uma segunda pele. O tecido era tão leve que parecia pecado.
Ela experimentou. E o espelho não mentiu: estava provocante. Mas elegante. Uma mistura exata entre o que ela achava que nunca poderia usar e o que sempre sonhou vestir.
Às 19h em ponto, o carro estava esperando.
O motorista abriu a porta para ela e, minutos depois, Aurora estava diante do luxuoso Grand Belvedere Hotel, iluminado por flashes e tapetes vermelhos.
Quando entrou no salão, Enzo já estava lá.
Um terno preto sob medida. Gravata de seda. Cabelos arrumados com precisão. Um deus moderno em meio a executivos, investidores e socialites vestidos para impressionar.
Os olhos dele a encontraram instantaneamente.
E ali, naquele segundo, Aurora soube que havia superado as expectativas.
Ele caminhou até ela com passos lentos, deixando o olhar deslizar por cada curva revelada pelo vestido.
— Perfeita — disse, com a voz baixa. — Quero todos olhando para você. E sabendo que não podem tocar.
Ela sentiu o corpo inteiro reagir.
— Isso faz parte das suas regras também?
— Essa parte... é puro prazer.
Ele estendeu o braço, e ela aceitou. Caminharam entre os convidados com a elegância de um casal entrosado — mesmo que, oficialmente, não fossem nada.
Durante o evento, Enzo falou pouco. Mas tocava sua cintura com frequência, orientava com pequenos gestos, e seus olhos escuros buscavam os dela sempre que alguém se aproximava demais.
Em um momento, enquanto ela se servia de uma taça de vinho branco, ele inclinou-se e sussurrou atrás dela:
— Quando esse vestido cair, quero ser eu o responsável.
Aurora fechou os olhos por um segundo, tentando manter a compostura.
Mas dentro dela, tudo queimava.
E o pior — ou melhor — é que ela não queria apagar esse fogo.