Mundo de ficçãoIniciar sessãoAnalu
De volta ao Rio, a vida parecia querer me enfiar de novo no molde perfeito que meus pais construíram. O fim de semana em Angra tinha sido... diferente. Intenso. Bagunçado. Eu voltei com o coração acelerado, a cabeça cheia de pensamentos que eu não deveria ter. O Cayo. Aquele motoqueiro com cheiro de gasolina e cigarro, com aquele olhar que parecia me desmontar peça por peça. O beijo no quiosque ainda queimava nos meus lábios, mesmo dias depois. Eu tentava apagar, fingir que não tinha acontecido, que era só um momento de fraqueza. Mas quem eu tava enganando? Toda vez que fechava os olhos, via ele. A cicatriz na sobrancelha, o sorriso torto, a mão firme no meu rosto. E, droga, eu queria mais. Era sábado à noite, e eu precisava me distrair. Precisava voltar pro meu mundo, pras coisas que faziam sentido. Nada de motoqueiros, nada de confusão. Só a vida que eu conhecia: luxo, risadas, aparências. Combinei com as meninas de sempre — Mari, Bia e Lú — de ir pra uma balada chique no Leblon, uma dessas que só entram os "certinhos" com nome na lista e carteira recheada. O lugar era o tipo de rolê que minha mãe aprovaria: luzes neon suaves, sofás de couro branco, drinks com nomes em inglês e garçons que pareciam modelos. Eu me arrumei com cuidado: vestido preto justo, daqueles que abraçam o corpo sem gritar demais, salto alto dourado, cabelo solto e maquiagem impecável. Perfeita, como sempre. Mas, no fundo, eu tava inquieta. Como se algo dentro de mim não quisesse mais se encaixar nesse papel. Chegamos na boate por volta das onze. O lugar tava lotado, com aquela vibe de quem quer ser visto. A Mari já tava no modo "rainha da noite", pedindo uma garrafa de champanhe pra nossa mesa. A Bia tava tirando selfies, e a Lú, ainda empolgada com o Vitinho de Angra, não parava de falar dele. Eu sorria, fingindo que tava no clima, mas minha cabeça vagava. Pro Cayo. Pro jeito que ele me olhou no quiosque, como se pudesse ver a Analu que eu escondo de todo mundo. Pro beijo que me fez flutuar e que, ao mesmo tempo, me assustava pra caramba. A gente dançava, ria, brindava. O DJ tocava um house chic, daqueles que fazem você balançar sem pensar muito. Eu tava começando a relaxar, sentindo o álcool do meu gin tônica subir um pouco, quando vi algo que fez meu estômago dar um nó. Ele. Cayo. Do outro lado da pista, encostado no bar, com uma cerveja na mão. Camiseta preta surrada, calça jeans rasgada, tênis velho e aquela jaqueta de couro que parecia grudada nele. Os amigos dele — Léo, Juninho e Vitinho — tavam por ali, rindo alto, chamando atenção com aquela energia crua, de quem não pertence ao Leblon, mas não tá nem aí. Nossos olhos se encontraram, e o mundo pareceu desacelerar. Ele ergueu a cerveja de leve, com aquele sorriso torto que me tirava do eixo, como se dissesse: — Olha só quem tá aqui, princesa. Eu desviei o olhar rápido, sentindo o calor subir pelo pescoço. Droga. O que ele tava fazendo aqui? Esse não era o lugar dele. Esse era o meu mundo, com luzes perfeitas e pessoas perfeitas. Ele era... sujo, perigoso, fora da curva. Mas, meu Deus, como ele parecia à vontade. Como se pudesse dominar qualquer lugar, mesmo uma boate cheia de playboys e patricinhas. — Analu, tá tudo bem? — perguntou a Bia, me cutucando. — Você tá com cara de quem viu um fantasma. — Tô de boa — menti, tomando um gole grande do meu drink. — Só... surpresa. Olha ali, os caras de Angra. As meninas viraram a cabeça na mesma hora, e a Lú deixou escapar um gritinho. — Meu Deus, é o Vitinho! Gente, eles tão aqui! — Ela já tava acenando, toda empolgada, e a Mari riu, puxando a Bia pra ir falar com eles. — Vem, Analu! — chamou a Mari, mas eu balancei a cabeça. — Vou ficar aqui. Divirtam-se. Elas não insistiram, já correndo pro bar onde os caras tavam. Eu fiquei na mesa, tentando me convencer que tava tudo bem, que eu não precisava ir lá, que o Cayo não importava. Mas ele importava. E quando olhei de novo, ele tava vindo na minha direção, cortando a pista com aquele jeito confiante, como se a boate fosse dele. Meu coração disparou. — Loirinha, você tá me evitando? — ele disse, parando na minha frente, com a voz rouca e aquele sotaque carioca que parecia acariciar as palavras. O cheiro dele — gasolina, cigarro e algo que era só ele — me acertou em cheio. Eu cruzei os braços, tentando manter a pose. — Evitando? Não, eu só não achei que você frequentasse lugares assim. Não é muito... seu estilo, né? Ele riu, baixo e provocativo, se aproximando um passo. — Meu estilo é onde eu quiser, princesa. E você? Tá aqui fingindo que é feliz nesse mundo de playboy, mas eu sei que você tá pensando em mim. No beijo que eu te dei em Angra. Minha respiração travou. Ele era direto. Descarado. E, droga, ele tava certo. Eu endireitei a postura, tentando recuperar o controle. — Beijo? Foi só um momento, Cayo. Não significa nada. Eu tava entediada, você tava lá. Só isso. — Só isso? — Ele ergueu uma sobrancelha, o sorriso crescendo. — Então por que você tá corada agora? Por que não consegue parar de olhar pra mim? Eu abri a boca pra responder, mas não saiu nada. Ele tava tão perto, os olhos castanhos fixos nos meus, como se pudesse ler cada pedaço de mim. A música mudou, o DJ jogou um som mais dançante, e ele estendeu a mão. — Vem, dança comigo. Ou tá com medo de se divertir de verdade? — Medo? — retruquei, com um tom de desafio. — Eu não tenho medo de você. Só não quero perder meu tempo. Mas ele não desistiu. Pegou minha mão, firme, e me puxou pra pista. Eu podia ter resistido, mas não resisti. O calor da mão áspera dele na minha era como fogo, e a pista tava cheia, corpos se movendo, luzes piscando. Ele me puxou pra perto, e começamos a dançar. O contraste era gritante: eu com meu vestido de grife, ele com a camiseta surrada. Eu com meu salto alto, ele com o tênis sujo. Eu com meu mundo perfeito, ele com aquela vibe roqueira, perigosa, que me atraía como um imã. — Tá vendo? — ele disse no meu ouvido, a voz abafada pela música. — Você pode fingir que é de outro planeta, mas tá gostando disso. De estar aqui comigo. — Você é convencido, hein? — respondi, tentando manter o tom de superioridade, mas minha voz tremia. — Só tô dançando pra te mostrar que não tenho medo de você. Ele riu, e o som da risada dele, rouca e verdadeira, fez algo dentro de mim se mexer. A música mudou de novo, agora uma batida mais lenta, sensual, dessas que fazem os corpos colarem. Ele não hesitou: passou as mãos pela minha cintura, me puxando mais pra ele. Nossos corpos se encaixaram, e eu senti o calor dele, o coração dele batendo rápido contra o meu. A química era absurda, elétrica, como se o ar ao nosso redor estivesse carregado. — Relaxa, princesa — ele sussurrou, os lábios roçando minha orelha. — Só deixa rolar. Eu não respondi. Não conseguia. E então ele me beijou. De novo. Os lábios dele nos meus, firmes, urgentes, como se ele tivesse esperado por isso a noite toda. E, meu Deus, esse beijo foi ainda melhor que o primeiro. Mais intenso, mais profundo. Eu me perdi, minhas mãos subindo pros ombros dele, sentindo a força sob a camiseta. Ele desceu uma mão, apertando minha bunda com aquela pegada de malandro, confiante, sem pedir permissão. Eu ri, surpresa, contra os lábios dele, e ele aproveitou pra largar minha boca e descer os beijos pro meu pescoço. Cada toque dos lábios dele era como uma descarga elétrica, me enlouquecendo. Minha pele arrepiava, meu corpo parecia não me obedecer mais. — Cayo... — murmurei, sem saber se era pra ele parar ou continuar. Ele parou só por um segundo, me olhando nos olhos, o rosto tão perto que eu sentia a respiração dele. — Fala, princesa. Quer que eu pare? Eu não respondi. Não podia. Porque, no fundo, eu não queria que ele parasse. Mas também sabia que isso era loucura. Ele era tudo que eu não deveria querer. Perigoso, errado, de um mundo que meus pais nunca aceitariam. Mas ali, no escuro da boate, com as luzes piscando e a música nos envolvendo, eu não conseguia resistir. A música terminou, e a gente se afastou, ofegantes. Ele sorriu, aquele sorriso torto que me matava. — Tô te ganhando, Analu. Pode negar o quanto quiser. — ele disse num tom provocador. Eu ri, tentando recuperar a compostura. — Você sonha alto, motoqueiro. Mas enquanto voltava pras meninas, com o coração disparado e o pescoço ainda quente dos beijos dele, eu sabia que ele tava certo. Ele tava me ganhando. E isso me assustava mais do que qualquer coisa.






