2- Raica

— Estava aqui pesando, o que você acha de duas argolas, Renan, uma em cada mamilo? — Aperto os seios um no outro, como se quisesse beijar os bicos, e os coitados por pouco não saltam para fora do corpete, ousada é o meu codinome esta noite.

Meu irmão pisca duas vezes, expressão de quem mentalmente analisa meus peitos e as tais argolas presas aos bicos.

— Acho sexy.

— Só isso?

— Deve doer, não acha?

— Será? — Pego o drink e bebo, não curto muito o lance da dor. Apesar de ter um piercing no umbigo que não doeu nada quando furei. Mamilos devem ser mais sensíveis, então deve doer. — Vou pensar no caso.

— Minha irmã colocaria.

— Eu sou sua irmã.

— Por isso, digo que uma dor por maior que seja não vai te impedir de fazer o que quer.

Eu amo esse garoto. Pisco para ele.

— Cadê o Théo? — pergunto me dando conta que meu cunhado sumiu há um tempão.

— Trabalhando, mana.

Renan afunda o ombro, desanimado.

Théo é o promoter da boate e braço direto dos chefes, meu cunhado é um cara foda, esforçado, ambicioso, sabe aonde quer chegar e luta com todas as armas possíveis por suas conquistas. Renan sempre esteve certo por apostar no seu relacionamento mesmo que essa aposta tenha se tornado um martírio em nossas vidas. Meu pai, ex-militar, bronco, ignorante, irracional, preconceituoso, se houver mais algum adjetivo ruim pode incluir, pois o desgraçado merece por nos obrigar num ato covarde a viver sob sua ditadura cruel e machista. Eu tenho tantas lembranças, tantas… que inevitavelmente estragaria minha maquiagem se citasse agora. Foi uma infância difícil, dentro e fora de casa, se tem uma coisa que me irrita é falar sobre racismo sem ter sofrido na carne essa diferença, mas eu sofri. Racismo, preconceito, homofobia, ou qualquer outra praga que te faça acreditar que você não merece um lugar ao sol. Aprendi a me defender, porque não tinha outra escolha.

Renan saiu do armário aos dezesseis anos, eu sempre soube que ele é gay, não sei dizer, eu sentia e temia. Já se tinha uma não aceitação dentro de casa, uma repressão do meu pai que sufocava, piadinhas maldosas, perversas, cruéis, pensava em como seria fora dali, no mundão, na vida real. Bem, aqui estamos nós, na vida real, no mundo dos adultos, e nesse momento na boate UP, era para ter sido uma noite de balada e boa conversa, só que o acaso e a tragédia se misturaram, assim como minhas premonições e medos.

— Raica, acorda! — Meu irmão me sacode querendo minha atenção. Saio do transe.

— Quê?

— Estava falando do Théo. — Autorizo que continue com um abano de mão. — Hoje, além de a casa estar lotada, o capeta está aí. Segundo o Théo ele é bem exigente.

Ele se refere ao filho mais novo da família do terror, Nicholas Queen, alguém que evitamos esbarrar por dois motivos simples. O primeiro: ele fodeu com a vida da minha melhor amiga Aurora. Segundo: porque o cara se acha o rei do universo, mas é um tremendo arrogante. Théo que suporta a peça, trabalha para ele.

Eu, meus caros, não preciso pagar simpatia. Não topo com ele desde o esbarro na ilha e não escondo o quanto o acho insuportável.

— Ah, é.

— Você está bem? Senti um baixo astral de repente.

Remexo os ombros, expulsando o espírito de cadela frágil e resolvo dançar.

— Quer saber, vou dançar. Você vem?

Ele checa a hora no relógio preso ao seu pulso e nega:

— Não, vou esperar meu love.

— Eu vou dançar, adiós...

— Bailar mucha.

Corro para a pista, não tinha intenção de ficar a noite toda presa naquele camarote com meu irmão esperando o namorado preso aos seus afazeres do trabalho, preciso suar, requebrar, beijar na boca e se valer a pena, otras cositas más. Hoje é a noite mais caliente da UP, dia da salsa, ritmo que eu adoro e domino muito bem. Dou um pequeno giro na pista analisando quem esquenta o lugar, muitos latinos e dançarinos natos do ritmo, os reconheço. Ciente que tenho um minuto ou menos para me preparar, chacoalho meus cachos e uma mão pousa na minha cintura.

— Me concede essa dança, bella dama?

Olho com charme para o cavaleiro ao meu lado, cabelos presos num coque no topo da cabeça, olhos negros penetrantes, camisa estampada com alguns botões abertos exibindo os contornos do peitoral malhado. Um pecado de homem.

— Sí.

Ele segura minha mão e gira meu corpo fazendo minha saia elevar. Salsa é um ritmo sensual e se bem bailado é puro sexo traduzido por passadas de pernas, giros rápidos, encaixes de quadris, além da troca de olhar que te leva ao inferno de tão quente. Geralmente, as quintas depois da facul participo de uma batalha de salsa em um clube no centro, chamado Fuergo, Renan às vezes é meu parceiro, mas quem domina meu ritmo mesmo é Pietro, parceiro e amigo de campeonato. Dançar me relaxa, alivia minha mente sempre a mil. Não me entendam mal, mas se entro na pista, não saio sem antes fisgar cada olhar para o centro, sendo assim, o cara que me conduz entende logo que damos os primeiros passos que terá trabalho comigo.

Um, “uhuuuuu” explode, assim que o cara me solta como se puxasse a corda de um pião e o deixasse rodopiar livre e solto, governado por voltas e voltas. O cavalheiro novamente cola meu corpo ao dele, e só não me põe de ponta cabeça porque o espaço não permite. Suor escorre entre meus seios, minha nuca, o balanço sexy provando nossa carne, a pista ferve, o DJ mostra seu talento.

— Uau! — digo quando a música acaba. — Você é bom!

— E você é incrível, já a vi dançar na Fuergo, sou um grande admirador do seu swing. — As palavras saem fervendo dos lábios carnudos. Uh… deu calor. — Posso te pagar um drink, bella dama?

— Pode, claro! Me espera no bar, vou ao banheiro, gatinho, você me fez suar. — Pisco para ele e saio movimentando o quadril ciente de que seus olhos acompanham cada requebrado intencional.

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