Capítulo 5: O Nome Dela

Gabriel acordou antes do sol nascer, como sempre.

Mas naquela manhã, havia algo diferente no ar. Uma ansiedade que nem o café forte e amargo que preparou conseguiu acalmar.

Sentado no chão, com o rifle desmontado ao lado, ele folheou o caderno de anotações até a página da noite anterior. O nome estava ali, escrito em letras tortas, como se fosse perigoso demais até de pronunciar:

“Marina Vasconcelos.”

Ele repetiu o nome em voz baixa.

O primeiro elo entre ele e Lara.

Levantou com os músculos ainda doloridos de tanto ficar em posições desconfortáveis nas últimas noites. Pegou o celular e abriu o navegador. Digitou o nome completo. A internet respondeu rápido.

Marina tinha redes sociais públicas. Muitas fotos, muitas localizações marcadas, muitos check-ins em cafés e exposições de arte. Era o tipo de garota que gostava de mostrar que estava viva. Que fazia questão de deixar pegadas digitais por onde passava.

Gabriel analisou cada detalhe com olhos de predador.

Descobriu onde ela trabalhava: uma pequena galeria no centro, especializada em arte contemporânea. E mais importante… descobriu que ela e Lara costumavam se encontrar lá nas tardes de sexta-feira.

Ele olhou o calendário.

Sexta-feira.

Perfeito.

Desmontou o caderno, guardou tudo na mochila, pegou a pistola pequena que sempre levava escondida na cintura e saiu.

O prédio da galeria ficava a uns vinte minutos de caminhada, mas ele preferiu dar a volta, escolher rotas menos óbvias, observar o fluxo da vizinhança antes de se aproximar.

Quando chegou ao local, encostou-se num poste, comprou uma garrafa de água num ambulante e ficou ali, fingindo esperar alguém.

O movimento era discreto.

Poucos clientes.

Paredes de vidro, com uma exposição de quadros coloridos e esculturas abstratas.

Por trás do balcão, Marina estava lá.

Ria com outro funcionário enquanto organizava alguns folders.

Ela usava um vestido leve, com estampas geométricas e um coque bagunçado no topo da cabeça. Tinha o mesmo ar de energia vibrante que Gabriel já tinha percebido pela lente da Dragunov.

Ele observou o ritmo dela. Como atendia os clientes. Como brincava com o colega de trabalho. Como checava o celular a cada cinco minutos.

No meio da manhã, Marina pegou a bolsa e saiu.

Gabriel a seguiu.

Ela andou por algumas quadras até entrar numa papelaria. Saiu de lá com dois blocos de desenho e um conjunto novo de pincéis.

Depois, seguiu até um café que parecia ser ponto fixo dela. Pediu um frappé, sentou-se numa das mesas na calçada e começou a mexer no celular.

Gabriel ficou do outro lado da rua.

Pegou um jornal antigo que havia guardado só para ter algo nas mãos, fingindo ler enquanto a observava.

Foi ali, naquela mesa de rua, que a sorte virou a favor dele.

O celular de Marina tocou.

Ela atendeu com um sorriso largo.

— Oi, sua chata! — Gabriel conseguiu ler pelos lábios, mesmo de longe.

Lara.

Não precisava ouvir para saber.

Marina riu de algo, depois disse:

— Vem logo, tô te esperando na galeria.

Gabriel fechou o jornal com calma.

O coração acelerado.

Ela estava a caminho.

Ele largou o jornal no banco e seguiu andando, desta vez em direção oposta, mas com os olhos atentos a qualquer sinal de movimento. Quando chegou à esquina, parou.

E lá estava ela.

Lara.

Descendo apressada do metrô, com os cabelos soltos e os olhos protegidos por óculos escuros. Usava uma calça jeans, camiseta preta e um casaco amarrado na cintura.

Gabriel quase esqueceu de respirar por alguns segundos.

Ela estava… ali.

Tão perto.

Tão real.

Por instinto, virou o rosto e se encostou na parede de uma loja de conveniência. Deixou que ela passasse por ele como mais uma anônima no meio da multidão.

Mas o cheiro dela…

Doce. Suave. Misturado com o aroma de tinta que parecia impregnado nas roupas dela.

Ele esperou até ela dobrar a esquina em direção ao café onde Marina ainda estava.

Depois, com calma, seguiu alguns metros atrás.

Ficou numa distância segura, mas o suficiente para observar quando as duas se encontraram. Lara abraçou Marina com força, sentou-se ao lado dela e logo as duas estavam rindo e conversando como se o mundo ao redor não existisse.

Gabriel permaneceu na sombra de uma árvore próxima, como um espectador invisível de uma peça da qual nunca faria parte.

Mas, naquele momento, ele soube de uma coisa:

O tempo de só observar estava acabando.

A linha que separava o caçador da presa… estava ficando mais fina a cada dia.

Logo… ele atravessaria.

E quando isso acontecesse… nada mais voltaria a ser como antes.

Gabriel ficou ali por quase uma hora, observando. A cada minuto, lutava contra o impulso de atravessar a rua. De se aproximar. De ouvir de perto a voz dela. De escutar como Lara falava quando estava feliz, quando ria de verdade, sem as paredes da mansão por perto.

O problema era que ele não sabia mais se estava ali como profissional… ou como um idiota apaixonado.

O sol começou a descer no horizonte, jogando uma luz alaranjada sobre a calçada. O movimento na rua aumentava. Gente saindo do trabalho, mães com crianças pequenas, casais que pareciam felizes demais pra uma sexta-feira.

Gabriel recuou meio passo, indo para trás de um ponto de ônibus. Pegou o celular e abriu o aplicativo de mensagens.

Havia três notificações não lidas do número desconhecido.

Todas com o mesmo tom de ameaça velada:

“Prazo expirando.”

“Onde está o relatório?”

“Você sabe o que acontece com contratados que desaparecem.”

Ele bloqueou o número.

Guardou o celular no bolso.

— Que se dane — murmurou.

Quando levantou os olhos, viu Marina se despedindo de Lara com um abraço. As duas riram mais uma vez, e cada uma seguiu por um lado.

Lara começou a andar sozinha, com passos calmos, os fones de ouvido finalmente nos ouvidos, mexendo no celular.

Era agora.

Gabriel ajeitou a gola da jaqueta, atravessou a rua e começou a segui-la de perto.

Não tão perto a ponto de assustá-la.

Mas perto o suficiente pra ouvir o som baixo da música que escapava dos fones quando ela parava no sinal de pedestres.

Perto o bastante pra sentir que, de alguma forma, fazia parte da rotina dela.

Passaram por três quarteirões assim.

Ela entrou numa loja de materiais de arte. Gabriel ficou do lado de fora, fingindo olhar a vitrine de uma livraria vizinha.

Quando ela saiu, ele continuou atrás.

E então, no final da rua… aconteceu.

Lara deixou o estojo de lápis cair no chão.

Por reflexo, Gabriel se abaixou rápido, pegou o estojo antes que alguém pisasse e estendeu a mão pra ela.

Por um segundo… os olhos dos dois se encontraram.

Verdes.

Luminosos.

Lara sorriu de leve.

— Obrigada… — ela disse, meio distraída, enquanto pegava o estojo.

Gabriel não respondeu. Apenas assentiu com a cabeça, manteve o rosto meio escondido sob o boné e seguiu andando, como se fosse só mais um desconhecido.

Mas por dentro… o peito dele parecia prestes a explodir.

Aquele pequeno instante… aquele contato mínimo… foi suficiente pra virar tudo de cabeça pra baixo.

Ele continuou andando até dobrar a próxima esquina.

Encostou na parede de um prédio qualquer… e soltou o ar que estava prendendo.

Seu coração estava fora de controle.

A respiração descompassada.

“Primeiro contato de verdade”, pensou.

A partir dali… ele sabia… não tinha mais volta.

Ele iria se aproximar dela.

E ninguém… nem mesmo ele próprio… ia impedir.

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