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Capítulo 2: A proposta

As lágrimas caíam silenciosas sobre a capa do livro, embaçando o título e manchando. Carolina estava encolhida em um canto remoto da biblioteca da faculdade, tentando abafar os soluços que insistiam em escapar. As palavras da tia Célia ecoavam em sua mente, cortantes e precisas: "Um fardo. Ingrata. Assim como seus pais irresponsáveis."

— Carol? Carol, querida, o que foi?

A voz de Marcela veio carregada de preocupação. Junto dela, Caio apareceu, sua expressão animada usual substituída por uma careta de verdadeira preocupação ao ver o estado da amiga.

— Puta que pariu, quem eu tenho que matar? — Caio disse, se ajoelhando rapidamente ao lado dela. — Foi aquela bruxa da sua tia de novo, não foi? Fala que foi que eu vou lá e encaro ela!

— Caio, para de ser dramático — Marcela interveio, sentando-se do outro lado e passando um braço protetor sobre os ombros de Carolina. — Ignora ele, Carol. Mas fala pra gente. O que essa vaca fez agora?

A compaixão deles foi a gota d'água. Carolina deixou escapar a história entrecortada por soluços — a dívida, a ameaça de perder a casa, os insultos constantes, a sensação de ser um peso morto para o tio Ricardo.

Caio ouviu, quieto pela primeira vez desde que ela o conhecia. Quando ela terminou, ele pegou a mão dela. —Olha pra mim, Cortez. — Ele raramente usava o sobrenome dela, e a seriedade na sua voz fez com que ela erguesse o olhar. — Você é a pessoa mais forte que eu conheço. Inteligente, resiliente... caramba, você é a única que me entende de verdade. Você não é um fardo. Você é uma guerreira fodona que tá numa batalha difícil. E a gente tá aqui no seu time.

Marcela apertou seu ombro. —Ele tá certo, mesmo sendo um idiota. Você não tá sozinha. E sabe o que uma guerreira precisa ás vezes? — Marcela piscou, puxando três cartões pretos e prateados de sua bolsa. — Uma noite de trégua. E de caos controlado.

Caio pegou um dos convites, seus olhos arregalando. —Nossa, essa festa? No apartamento duplex dos Andrade? Como caralhos você conseguiu três convites pra isso, Marce?

— Uma mulher não revela seus segredos, meu caro — Marcela retrucou com um sorriso misterioso e orgulhoso. — O importante é que temos. E nós três vamos.

Carolina balançou a cabeça, limpando o rosto. —Obrigada, gente, de verdade. Mas... não tô a fim. Não tô com cabeça pra festa. Vou ser uma âncora.

— Tá maluca? — Caio pulou de volta, cheio de energia. — Âncora é o caralho. Você vai é ser nossa estrategista. Precisamos de você pra decifrar a fauna e a flora da alta sociedade. Sem você, a gente tá perdido!

— Ele tá certo de novo — Marcela insistiu. — É só uma noite. Pra esquecer, pra respirar, pra se sentir viva de novo. Por favor.

— Eu nem tenho roupa pra esse tipo de lugar... — Carolina tentou, num último argumento fraco.

Marcela soltou um riso. —Tá brincando? Meu armário é seu armário. Você pode pegar o que quiser, quando quiser. É pra isso que serve amiga, idiota. Vamos. Me deixa te arrasar.

Derrotada pelo apoio insistente — e por um pequeno surto de esperança que teimava em nascer no seu peito — Carolina finalmente assentiu. —Tá bom… tá bom, vamos.

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Na noite da festa, Caio chegou com seu traje esporte fino despojado impecável. uma roupa inteiramente preta, desde a blazer slim até a calça, contrastando com um tênis branco de edição limitada. Uma corrente prateada fina brilhava discretamente em seu pescoço, completando o visual. Seus olhos scanneavam o salão. não atrás de celebridades, mas de "formas de vida interessantes" — sua musa inspiradora da vez era uma mulher de cabelos ruivos fogo, olhos verdes esmeralda e altura impressionante. Ele já se dirigia a ela, confiante, pronto para travar uma batalha de criatividade.

Marcela era um espetáculo à parte. Seu vestido vermelho cintilante grudava perfeitamente em seu corpo, refletindo a luz a cada movimento como se ela estivesse em chamas. Brincos dourados enormes e saltos altíssimos completavam o visual de quem estava lá para ser notada, e ela mergulhou na pista de dança assim que chegou, um redemoinho de energia e confiança.

Carolina, por sua vez, escolheu no armário de Marcela o oposto de chamar a atenção; um elegante vestido midi azul-marinho, de mangas compridas e recortes discretos nas costas. Era sutil, sofisticado e a fazia se sentir um pouco mais invisível, um pouco mais protegida. Ainda assim, o caimento perfeito do tecido e a cor que contrastava com seus olhos e cabelos escuros a tornavam, sem que ela percebesse, misteriosamente bela.

— Vem dançar! — Marcela gritou para ela, já suando e rindo no meio da multidão.

— Depois! — Carolina gritou de volta, forçando um sorriso. — Vou pegar uma bebida primeiro!

Ela se dirigiu até o bar e pediu um gin tônica. Foi quando, ao se virar com o copo na mão, seus olhos encontraram os de Melissa Moretti. A mulher estava sentada sozinha em um canto...

Pouco depois, quando foi até a mesa de bebidas pedir outra dose, a voz da mulher soou ao seu lado, suave como veludo, mas com uma firmeza de aço.

— Fugindo da festa? — perguntou a mulher, um sorriso quase imperceptível nos lábios.

Carolina se virou, surpresa. — Apenas… recarregando as energias.

— Sábio. Esses eventos podem ser mais exaustivos que úteis, não acha? — A mulher estendeu a mão. — Melissa.

— Carolina — ela respondeu, apertando a mão fina e firme.

— Então, Carolina, o que traz você aqui? — Melissa perguntou, seus olhos percorrendo o vestido emprestado, os sapatos modestos, mas parando em seu rosto, como se lesse cada microexpressão. — Você não parece ser do… círculo habitual.

A pergunta era direta, quase rude, mas feita com uma elegância que desarmava. Pressionada por aquele olhar, Carolina sentiu uma estranha necessidade de dizer a verdade. — Uma amiga me trouxe. Precisava… sair um pouco.

— Sair — Melissa repetiu, como se examinasse a palavra. — Dos problemas ou de si mesma?

O choque de ser tão bem compreendida por uma estranha quase fez Carolina recuar. Ela engoliu seco. — Um pouco dos dois, talvez.

Melissa assentiu, como se tivesse recebido a confirmação de uma teoria. — Eu entendo. Todos carregamos correntes, minha querida. A questão é saber quais valem a pena carregar e quais podemos… negociar.

Ela fez um gesto convidando Carolina para se sentar em duas poltronas afastadas da multidão. Antes que Carolina percebesse, estava contando uma versão editada de sua vida. a perda dos pais, a criação pelos tios, a pressão, o desespero silencioso para ajudar o tio Ricardo. Não mencionou Célia, mas a sombra da mulher pairou sobre cada palavra.

Melissa ouviu em silêncio, sem julgamento, apenas absorvendo. Quando Carolina terminou, sentindo-se estranhamente leve e vulnerável, a mulher sorriu, um gesto que não chegou aos olhos.

— Que história fascinante. Trágica, mas fascinante. Você é mais resiliente do que aparenta. — Ela inclinou-se para frente, baixando a voz. — E se eu disser que posso oferecer a você uma saída? Uma maneira de aliviar o fardo do seu tio e ganhar sua própria independência de uma vez por todas.

Carolina sentiu o coração acelerar. — Como assim?

— Tenho um… problema familiar. Meu filho, Christopher. — O nome saiu como um suspiro carregado de frustração. — Christopher Moretti. Ele é rebelde, desconfiado, e está determinado a destruir tudo que construímos por pura teimosia. Ele precisa de uma influência nova. Alguém fora do nosso círculo. Alguém como você.

— Como eu? — Carolina riu, sem humor. — Eu não sou ninguém.

— Exatamente! — os olhos de Melissa brilharam. — Para ele, você seria genuína. Uma jovem estudante, inteligente, bonita… não mais uma herdeira que minha sogra vive apresentando a ele e forçando um casamento. Eu estou buscando para ele o oposto do que ela quer. Estou buscando o melhor para o meu filho. Você se aproximaria dele. Deixaria que se apaixonasse por você.

Carolina sentiu o estômago embrulhar. — O quê? Não… não posso fazer isso. Isso é…

— Imoral? — Melissa Moretti completou, levantando uma sobrancelha perfeitamente delineada. — Ou prático? Eu pagaria todas as suas dívidas. Seu curso. Seu aluguel. Seu tio Ricardo teria um novo começo. E você, minha querida, teria uma quantia suficiente para nunca mais precisar depender da… caridade de ninguém.

O valor que ela sussurrou fez o ar sair dos pulmões de Carolina. Era mais dinheiro do que seu tio ganharia em uma década.

— E… e se ele descobrir?

— Ele não descobrirá. Você será inteligente. E eu serei discreta. — Melissa pegou uma taça de champanhe de uma bandeja que passava e a entregou a Carolina, que a pegou com as mãos trêmulas. — Pense nisso não como uma traição, mas como um… contrato social mutuamente benéfico. Eu resolvo seu problema financeiro. Você resolve o meu problema familiar.

Ela bateu suavemente sua taça na de Carolina.

— Às novas oportunidades.

Carolina não bebeu. Ficou olhando para as bolhas subindo em sua taça, como suas esperanças se dissolvendo no ar. O barulho da festa pareceu se transformar em um zumbido abafado. A imagem do tio Ricardo, exausto e derrotado, surgiu em sua mente. Depois, a de Célia, triunfante se eles perdessem a casa.

Era loucura. Era errado.

Mas era uma saída.

— Preciso pensar — ela sussurrou, a voz quase sumindo na música.

— Claro — Melissa assentiu, como se já soubesse a resposta. — Não precisa decidir agora. Mas não demore muito. Oportunidades como esta… evaporam-se.

Ela deslizou um cartão de visita branco e simples na mão de Carolina. Havia apenas um nome: Melissa Moretti, e um número de telefone.

— Me liga quando estiver pronta.

E com isso, Melissa se levantou e se misturou à multidão, deixando Carolina sozinha com o peso de uma proposta impossível e o sabor amargo do champanhe que não ousara beber.

Do outro lado da sala, Caio conversava animadamente com a ruiva, gesticulando com confiança. Carolina quase o invejou por sua simplicidade. Sua própria noite havia tomado um rumo muito mais sombrio e complexo e diferente do que ela imagianava.

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