Os dias estavam passando devagar, arrastados. Hoje era dia de baile funk, e ele se preparava como se fosse entrar num tapete vermelho. Eu estava deitada na cama, de camisola, o corpo cansado e a alma em pedaços, assistindo ele colocar a corrente de ouro, ajeitar o cabelo na frente do espelho e passar o perfume forte que sempre me deixava tonta, agora me deixava enjoada.
Aquela cena me corroía.
Ele ali, todo bonito, se arrumando para a noite, enquanto eu... grávida, descabelada, enjoada, com os seios doendo e a cabeça a mil.
— Você vai mesmo? Vai ficar a noite inteira lá? — perguntei com a voz engasgada.
Ele nem olhou para mim. Só ajeitou a gola da camisa com calma.
— Claro que sim. Baile é sempre no fim de semana. Você sabe como é.
"Como é", repeti mentalmente, sentindo um gosto amargo na boca. Eu sabia. Eu sabia que "como é" significava bebida, mulher rebolando em cima, droga rolando, olhares, tentação, e ele fingindo que eu não existia por algumas horas.
— Vai com calma, né?