a vida simples de Rosemary

2024, Central do Brasil, 13:48 da tarde

Rosemary

Eu não tinha para onde ir quando minha mãe me expulsou de casa por causa daquele traste e nem dinheiro para alugar um quarto de pensão.

Contudo, Deus me mandou um anjo: Dona Fátima, proprietária de uma grande pensão no subúrbio. Eu estava dormindo na calçada de uma padaria, e ela se sentou do meu lado e perguntou a minha história.

Ao contar sobre a escolha cruel da minha genitora, Dona Fátima não pensou duas vezes em me oferecer moradia. Como não tinha um tostão, a ajudei com as tarefas domésticas da pensão. Ela me fez um empréstimo, e eu voltei a vender meus lanches. Após oito meses de trabalho duro, consegui comprar um carrinho de lanches usado, mas em bom estado. Eu só precisei limpar e pintar; ficou quase novo.

— Faça dois cachorros-quentes por R$10. Promoção do dia! Não percam!

Digo em tom alto para chamar a atenção das pessoas. Outros ambulantes também oferecem seus produtos para todos que passam.

Observo estudantes, mães com crianças e trabalhadores comuns, todos com o mesmo objetivo: ganhar a vida. O trem ou o metrô iriam levar essa gente que sonha com um futuro melhor para seu destino. Me emociono ao ver mulheres acordarem cedo para não perder o metrô ou o trem. Vejo nos olhares delas que o motivo do esforço é a família.

É inevitável não pensar em minha mãe. Ela nunca me deu uma gota de amor! Será que eu não mereço ser amada?

— Olha só quem eu encontrei: minha ex-fracassada.

Reviro os olhos ao reconhecer a voz que acreditei amar.

— Emílio, você sabe muito bem que eu trabalho aqui. Veio me humilhar de novo! — Falo, terminando de fritar uma coxinha.

— O mundo não gira ao seu redor, meu bem. Estava passando e resolvi te dar um oi.

Sorrio sem humor.

— Está me atrapalhando. Some da minha vista.

O imbecil solta uma gargalhada alta e escandalosa. Parece um pavão engasgado.

— Rosemary, você não é importante! O meu pai tem Victor Montenegro como sócio, um dos homens mais poderosos e influentes da cidade. Graças a essa sociedade, a empresa da minha família está lucrando muito!

— Eu não perguntei.

— Eu sou milionário agora. Me respeite. Você não passa de uma vendedora de porcarias imundas. — Fala esnobe, olhando o meu carrinho com repulsa.

Desgraçado! A minha carência não me deixou enxergar o verdadeiro caráter desse crápula.

— Emílio, eu me sustento sozinha. Acordo cedo para preparar meus lanches. Eu sou tão importante quanto você! — O encaro de cabeça erguida.

Ele ri.

— Esse terno custa muito mais que esse carrinho sujo.

— Agora já chega! Paciência tem limites. Me deixe em paz, imbecil. — Digo, pego a espátula e aponto para ele.

— Eca! Nem pense em encostar essa coisa gordurosa em mim, porca!

— Amor, por que marcou comigo nesse local fedorento? — A voz é melosa e irritante. Uma mulher vestida de forma extravagante se aproxima e me lança um olhar de reprovação.

— Então, essa é a sua ex-pobre?

Que maravilha, meu ex-namorado babaca convidou a atual namorada para me humilhar.

— Sim, Brittany, essa é Rosemary, uma mulher nojenta que vende fritura por alguns trocados.

— Que nojo! Como permitem que ela venda essas porcarias nojentas? Aposto que nem lava a mão. Porca imunda.

Lágrimas ameaçam descer pelo meu rosto, mas não deixo. Pego mostarda e jogo neles.

— Vadia desgraçada! Esse vestido custa uma fortuna! — Diz a tal da Brittany.

— Isso não vai ficar assim, vagabunda! Tenho poder para transformar sua vida no Rio de Janeiro em um inferno na Terra! — Emílio fala, tirando o paletó sujo de mostarda.

— Vão embora e não voltem mais, ratos miseráveis!

Respiro aliviada quando me livro da presença deles. Consigo vender quase todos os meus lanches. Às 4:35 da tarde, vou para a casa.

Assim que chego, sinto um cheiro bom de bolo de laranja com café. Fátima está servindo os hóspedes.

— Como foi o trabalho, minha menina?

— Foi bom, Fafá. Vendi quase todos os lanches.

Ela me encara com desconfiança.

— Eu te conheço muito bem, Rose. O que aconteceu para te deixar com essa carinha triste?

— O Emílio voltou a me perturbar.

— O que aquele mauricinho de merda fez? — Diz, se aproximando e tocando meu rosto com a preocupação de uma mãe estampada em seu olhar.

— O que ele mais gosta de fazer: me humilhar. Dessa vez, ele levou a namorada, uma mulher ridícula que se acha melhor que os outros. Foi horrível, Fafá. Eu tento ser forte, mas estou muito cansada de ser desprezada por pessoas que deveriam me amar. Confiei em Emílio, e ele quebrou meu coração.

Liberto todas as lágrimas que tanto segurei.

— Não fique assim, Rose. Aquele idiota não é o seu verdadeiro amor. Você ainda vai ser muito amada, acredita em mim.

— Obrigada por me acolher e cuidar de mim, Fafá. Não sei o que seria de mim sem você. — Digo com os olhos fechados, aproveitando o cafuné que ela faz em meus cabelos ruivos, que estão presos em um coque.

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