A escolhida do Don
A escolhida do Don
Por: Ivi Santiago
Prólogo

O peso da promesas: A noite caía sobre Velenza com o peso de uma maldição antiga.

O céu, sem estrelas, parecia cúmplice daquele silêncio espesso que envolvia a mansão Bellini. Nem os astros se atreviam a testemunhar o que estava prestes a acontecer entre aquelas paredes.

Dentro da casa, o ar tinha gosto de passado e perfume de flores mortas. Um pacto antigo, frio e cruel, seria selado com tinta, papel... e ausência de amor.

Scarllet Bellini, aos 17 anos, era a oferenda.

Prometida. Vendida. Silenciosamente sacrificada ao altar de uma aliança entre duas famílias: Bellini e Ferreti.

Seu corpo de porcelana, seus olhos de mar, seu coração devoto — tudo seria entregue a um homem que sequer estava ali para recebê-la.

No andar de cima, o som da caneta arranhando o papel quebrava o silêncio do quarto. Antonella Bellini, apenas 14 anos, escrevia em seu diário com fúria.

Suas palavras sangravam como uma ferida aberta.

"Ela não é uma noiva. É uma prisioneira de luxo."

Antonella não odiava o nome que carregava. Ser uma Bellini era, sim, um símbolo de poder.

Mas o que valia esse poder, se tudo o que ele oferecia era uma gaiola?

Scarllet nunca conhecera outro homem. Desde menina, sonhava com Giovani Ferreti — o herdeiro distante, o príncipe ausente. Um amor silencioso, casto, mas ainda assim real.

E mesmo ele... estava longe demais para saber. Ou se importar.

Aos olhos da irmã mais nova, Scarllet era um cordeiro conduzido ao abate.

Linda. Obediente. Submissa demais para lutar.

Antonella, ao contrário, sempre sonhou com liberdade. Com amor selvagem, com escolhas, com gritos.

Com mãos que a desejassem e olhos que a vissem.

O som da maçaneta girando trouxe-a de volta à realidade.

Elena Bellini entrou no quarto como uma deusa de inverno: vestida com elegância impecável, olhos azuis cortantes, voz doce como veneno.

Figlia mia, desça. Não nos faça esperar num momento tão… importante.

Antonella fechou o diário com os dedos trêmulos.

— Já vou… — murmurou, sem olhar para ela.

Elena a observou por um instante. Sabia. Pressentia o fogo que crescia dentro da filha — e temia que um dia ele consumisse tudo.

No salão principal, a cena era uma pintura renascentista de horror.

Irina Ferreti ocupava o centro do sofá como uma rainha não coroada.

Seu vestido verde-oliva abraçava o corpo com firmeza, e as esmeraldas cintilavam em sua pele como serpentes adormecidas.

Ao seu redor, os homens tratavam da alma de Scarllet como quem negocia propriedades.

Dom Giussepe falava pouco. Mas cada palavra era uma sentença. Pablo Bellini, inquieto, apertava os dedos como se ainda tivesse escolha.

Mas não tinha.

Scarllet, sentada à beira do divã, parecia uma boneca de vitrine.

Seu vestido rosa era delicado demais para a tensão que crispava seus ombros.

Seus olhos, perdidos, buscavam uma saída que não existia.

Giovani…

Ah, Giovani.

Seu nome era um eco. Um fantasma. Um fio de esperança em um vazio que ninguém preenchia.

Do alto da escada, Elena observava em silêncio.

Sabia que aquele contrato era mais que um acordo: era uma sentença.

E tinha certeza de quem era a verdadeira mente por trás de tudo — Irina Ferreti.

A mulher sempre desejou moldar Scarllet. Domá-la. Possuí-la.

Enquanto os homens discutiam cláusulas e dotes, o advogado da Cosa Nostra digitava velozmente, dando forma jurídica à tragédia.

Então, a sala silenciou.

Antonella apareceu.

Vestia um macacão azul, cabelos soltos, pés descalços.

Crua. Livre. Perigosa, não havia se arrumado para aquele evento, porque se arrumaria? Era contra, sempre foi. Não compreendia a aceitação da sua irmã sobre tudo aquilo, afinal era a sua vida sendo traçada naquela noite, naquela sala, em pedaços de papéis. 

Buona sera a tutti! — saudou com firmeza, sem baixar os olhos.

Irina a mirou com desdém.

Dom Giussepe… sorriu.

Vieni qui, piccola… a tuo zio. — A voz dele era melosa. Os olhos, predatórios.

Antonella obedeceu, o estômago revirando.

Como vai, tio? — perguntou, com um sorriso educado que mal escondia o desconforto.

Ele beijou-lhe a bochecha. Um gesto inocente, não fosse o arrepio gelado que percorreu a espinha da menina.

Irina percebeu. Sentiu.

E odiou.

Licenza… vou ajudar mia madre na cozinha. — murmurou, recuando.

Vai, tesouro mio. — disse Dom Giussepe, saboreando a presença dela com olhos perigosos.

Ela saiu. Sabia que não pertencia àquele salão.

Sabia, também, que seu tempo de ser espectadora estava acabando.

Scarllet permaneceu imóvel.

A boneca.

A oferenda.

A mulher de Giovani Ferreti — ainda que ele não soubesse.

Longe dali, Giovani acendia um cigarro na varanda de um hotel em Florença.

O som da cidade noturna era abafado pelo rugido das lembranças.

Ele não sabia do acordo.

Não se lembrava da menina que o amava.

Não sonhava com promessas feitas em seu nome.

Ele não foi embora.

Ele foi exilado.

E agora, o destino o chamava de volta.

Não apenas para tomar o trono de seu pai.

Mas para descobrir que seu nome já estava gravado no destino de uma mulher que jamais escolheu…

E que talvez, algum dia, escolheria ele.

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